quinta-feira, 14 de maio de 2009

Catecismo
























Salvé Rainha

Salve Rainha, mãe de misericórdia, vida doçura, esperança nossa, salvé
A vós bradamos, os degredados filhos de Eva,
A vós suspiramos, gemendo e chorando, neste vale de lágrimas.
Eia pois, advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei.
E depois deste desterro, nos mostrais Jesus,
O bendito fruto do vosso ventre
Ó clemente, ó piedosa, ó sempre doce virgem Maria,
Rogai por nós, santa mãe de Deus
Para que sejamos sempre dignos das promessas de Cristo, Amén


E eu sem perceber quem eram “os degredados filhos de Eva”, nem o porquê do “gemendo e chorando neste vale de lágrimas”. Não que eu tivesse tudo quanto queria, que nessa idade também há contrariedades, mas aos sete anos, sentia o carinho de muita gente.

Foi assim que me ensinaram o Catecismo. Em Banda Desenhada, cheio de chamas e crucificações.
- “Quantos são os pecados mortais?” E eu aflito a lembrá-los, como à tabuada, sem lhes saber o correcto significado. – “E os Veniais?” E mais um esforço e cantava-os: a omissão, a mentira, a vaidade, a arrogância, a calúnia, o roubo, o adultério, o orgulho e o ódio, para depois clarificar que estes podem ser limpos pela confissão ou pelas penas do purgatório, e que os outros nos atiram para as tormentas do Inferno.
E o padre António, para além do cortinado, a encher-me de terror:
- "Meu menino, confessa os teus pecados!" E eu a ter de dizer qualquer coisa, pois era para isso que supostamente ali estava.
“-Eu, senhor padre, disse muitos palavrões!”, e ele cheio de solenidade: - “E respeitaste pai e mãe?”, para de seguida, me dar o castigo de uns Pai-Nossos e umas Avés-Marias, e eu me afastar de mãos no peito e os lábios em bico, a copiar o ar que vira nos demais.
-“Amanhã há comunhão! Não te esqueças!”
E começava o martírio de me manter puro até ao dia seguinte, sem palavrões ou gestos bruscos. O que eu mais queria, era dormir até à hora da missa, e sair dali a correr directo para a hóstia, para não ter de lidar com as tentações.
Por fim a comunhão e a dúvida: - “Se tomares a hóstia com pecados, ela cola-se ao céu-da-boca e transforma-se em fogo”. E eu a arriscar. Um, dois e três, … abro a boca, fecho os olhos e aguardo uns segundos e … nada.
Uffff! Se calhar, pouco pesam os palavrões, as desobediências e as mentiras, que entretanto disse, ou terão sido as jaculatórias, a dar as indulgências necessárias para pagar esta conta?

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