sábado, 17 de abril de 2010

Um desafio


Custava-me aquele gelo que persistia há mais de seis meses e que deixara de ser um assunto que o tempo resolveria, para ser um dedo apontado à minha incapacidade de me sintonizar com aquela cabeça de sete anos.
Entrava mudo e saía calado. -Tiveste falta de ar?, - Não!, respondia a mãe depois de uma longa espera pela resposta. - Dr.! Não ligue, que ele é assim! Não fala com quem não conhece bem. Lá em casa brinca normalmente com o irmão, joga no computador e vê os canais História, Odisseia e o da National Geographic, mas na escola só se relaciona com a professora e uns três amigos. É de poucas falas, mas fora isso, é um miúdo normal.
Mas eu não desisti. Nestas coisas de crianças a criatividade costuma dar resultados. Queres ver um truque? E fazia a cena do dedo partido. Viste? És capaz?, e ele nada. - Se falares comigo eu dou-te um coelho!, e desenho um coelho, aquele que aprendi com o meu médico de infância e que me ficou na mão à custa de o repetir, depois um cavalo, um elefante e até um golfinho, com ele sempre atento, a dar-me coragem para num gesto de destemor, o desafiar: - Diz um animal qualquer que eu desenho-o!
Aí, ele olhou para mim como a medir-me e, com um quê de maldade, disse: - Quero um Ganso Ibérico! … e arrumou comigo.

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