terça-feira, 1 de junho de 2010

Carta à Ana



Ana:
Permite que te trate por tu que, de algum modo, somos pares.
Há anos que racionalizo as ineficências com a necessidade de ser comedido e não despertar reacções maiores que os possíveis benefícios, mas esse tempo está a passar, e já não consigo entender a tortuosidade dos caminhos.

O Correia de Campos, aparentemente, sabia o queria. Tu, parece que não sabes ao que andas. Falas da defesa do SNS, mas nem soletras medidas estruturais para racionalizar gastos, e pôes-te a falar em jarros de água, em escrever dos dois lados da folhas e em reduzir horas extra aos médicos. Quem te ouvir vai acreditar que tudo o resto está a rolar sobre esferas. Nem o porquê de tanto Omeprazole questionas!

Tu deves saber que a Saúde não pode ser gerida por quem olha para os números sem questionar a sua relação com a realidade que lhes está na origem, e que tem como objectivo encaixá-los na "contratualização". O partido pode ter necessidades, mas as Instituições do Estado já não comportam compadrios e incompetências.
Esses cinquenta ou cem milhões de Euros há muito que deveriam estar a ser poupados com uma política consistente, em que se responsabilizassem os CA das EPEs pelos erros cometidos. Talvez então dessem mais valor à competência que às pressões dos políticos de pacotilha.
Depois falas em «Guia de boas práticas», para poupar nas despesas correntes de cada serviço. Mas que é isso? Está tudo no mesmo grau de disfunção? Não há melhor nem pior?

Olha, sugiro-te que defendas as carreiras médicas, que lutes pela exclusividade dos profissionais do SNS, e que esqueças as horas extra. Vais ver que, se houver exemplo de cima (e não este clientalismo que tomou conta das Instituições), motivação não irá faltar e que os resultados irão aparecer NATURALMENTE.

Um abraço
Fernando

1 comentário:

  1. Gosto destas cartas abertas - os ministros são de facto pessoas como nós, geralmente a atravessar uma fase mais perdida e merecem ser tratados com essa boa fé, mas também exigência, que tu assumes. Lembro-me do Correia de Campos, personalidade que respeitava antes de ser ministro, mas que no meu entender naufragou (depois de ter vomitado muito) que pedia, também numa carta aberta antes de iniciar as funções ministeriais, que os amigos não se afastassem, que se mantivessem incómodos se fosse o caso mas que não o deixassem na solidão dos cortesãos que os cercam inevitávelmente, Vª Exa, Sr. Dr., Sr. Ministro como está, a afastarem-nos selectivamente da realidade. O barco está a abanar muito, o naufrágio é quase certo, mas o convés já está muito nauseabundo e escorregadio. Abraços

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