terça-feira, 1 de março de 2011

Doentes, Utentes e Clientes


Em Portugal, há uns cinquenta anos, ia-se ao médico quando se estava doente. Não havia consultas de desenvolvimento nem de Check-up e as campanhas de saúde pública eram ilhas no oceano das doenças. Havia doentes e médicos, e estes tratavam-nos como sabiam e podiam.
Há cerca de três décadas, surgiram as consultas de rotina e “para fazer umas análises, a tudo de preferência, que eu desconto e tenho os meus direitos”, e com elas os "utentes" e uma dor de cabeça para os médicos com os hipocondríacos e as “baixas” para resolver um qualquer problema da vida.
Cedo me reconheci incapaz de identificar eficazmente as simulações e com pouca paciência para os abusos, pelo que me refugiei na medicina hospitalar.

Com a chegada das EPEs, os "utentes" passaram a "clientes", e os gestores públicos começaram a jogar o jogo dos privados (com o Estado a pagar), como se o “negócio” se regesse por lógicas semelhantes, e os "clientes" foram induzidos ao consumo.
Neste contexto, lutar pelo rigor e pela eficiência de gastos, é um modo fácil de criar inimigos, e, se as chefias “gostam de brinquedos caros”, uma guerra perdida.

Talvez seja esta a razão porque me recuso a falar de utentes e de clientes nos Hospitais!

2 comentários:

  1. De facto, saudades do tempo em que os médicos tratavam os doentes...

    A medicalização da vida, como a justicialização, são preversões caras e perturbadoras da homeostase social.
    Faz parte do tal monstro que invadiu o domínio privado de cada um! E que é insasiável!

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