quinta-feira, 31 de outubro de 2013

As varizes

Conheço-a há mais de dez anos. Talvez, nessa altura, fosse uma mulher vistosa, mas a esta distância, lembro-me mais das suas análises e das dificuldades no tratamento, que do seu aspecto físico.  Embora habitualmente venha arrumada, topo-lhe na pele e nos modos nuances que me fazem lembrar o dia em que veio à consulta com a voz entaramelada pelo vinho. Tem ainda muito caminho a percorrer, e a esperança de ir a tempo de encarrilar a vida.
É mãe solteira de uma gravidez diagnosticada aos seis meses, quando se queixou de “uma cobra a rabiar-lhe na barriga”. Depois surgiram os “ai meu deus!” com as suas doenças agravadas pelas do companheiro, também ele um desgraçado às voltas com dúzias de comprimidos.
A irmã, que usualmente a acompanha, faz de mãe e lamenta-lhe a falta de regra. É mais nova e mais forte de carnes. Brilha-lhe o ouro no pescoço e nos pulsos, principalmente quando projecta a voz pela sala, contando-lhe as misérias. –“Não tem juízo, esta minha irmã! Olhe Dra.! Eu pago-lhe a mercearia, para ela andar bem alimentada. E a conta cada vez é maior, por causa do vinho! Tem jeito?”, questiona-me, enquanto a fixa de olhos no chão. Às vezes, vem só ela para levantar os medicamentos. -“A minha irmã está com vómitos, Sra. Dra.! Voltou a beber! Anda perturbada por ter de voltar à escola, para lhe darem o rendimento mínimo.”

Mas hoje vem a acompanhar um homem de 72 anos à primeira consulta, porque “ele não conhece as voltas do Hospital”.
Está toda "produzida". Salto alto, casaco de couro azul cobalto, pulseira de ouro a deslizar até à mão, um traço forte a rasgar o olho e com um despacho que eu nunca lhe conheci. Sentam-se.
O computador informa: ...teste HIV positivo, pedido porque … “o senhor anda com uma mulher de maus comportamentos!”.
Peço para ela aguardar lá fora, para dar lhe privacidade e pergunto por doenças sexualmente transmissíveis, e mais especificamente por infecção pelos vírus da SIDA.
Fica atrapalhado. Fala da disponibilidade dela para o arranjo da casa, já antes da mulher lhe morrer, e de o terem avisado que ela não era de confiança. Mas nunca teve doença “nas partes”. Lembra-se de um "esquentamento" em Lisboa, causado por uma ida descalço a uma sanita, ... há muitos anos.
Esclarecida, continuo. Dou as orientações e despeço-me.
Mal a porta se fecha, logo se abre para ela entrar de lágrima no olho, preocupada por se sentir culpada por aquela doença.
-“Sabe senhora. Dra.! Aqui há uns tempos, quando ele foi operado às varizes, eu fui lá a casa fazer-lhe os pensos e, com certeza, passei-lhe a minha doença ao sangue!”
- “Só pode ter sido, Judite! Só pode!”, respondi.

sábado, 26 de outubro de 2013

Bidentes do Minho


- Dr. Fernando! Ontem internei, no serviço, outro bidente!
- Engraçado, Dra. Edite! Dois numa semana! ... E esse de que fala, também tem loja aberta na cidade, ou é um vulgar bruxo de aldeia?
- Não Dr.! Este é bidente, ... porque só tem os dois incisivos inferiores!
- Ahhhh! ... Um berdadeiro bidente!

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Testes de Stress


É notícia de 23-10-2013:
O Banco Central Europeu (BCE) anunciou que quatro bancos portugueses vão ser sujeitos a testes de stress: BPI, BCP, CGD e Grupo Espírito Santo.
A análise, a estes e outros bancos europeus, vai durar um ano e pretende avaliar a qualidade dos activos e a transparência dos balanços dos bancos «como preparação para assumir em pleno a responsabilidade pela supervisão, no âmbito do mecanismo único de supervisão».
Em comunicado, o BCE, que prepara a supervisão única europeia, indica quase 130 entidades financeiras de grande dimensão de vários países da Zona Euro vão ser examinadas. Os testes começam já em Novembro.


Genesis 22:10-13: Resumo
Deus chamou Abraão e disse-lhe: “Pega no teu filho único Isaac e oferece-mo em sacrifício”.
Abraão, carregou o burro com lenha e partiu com o rapaz mais dois servos para o lugar ordenado. Ao 3º dia de viagem parou e disse aos servos: “Esperai aqui com o jumento, que nós vamos àquele monte fazer um sacrifício e vimos já!” Pôs a lenha às costas de Isaac, pegou no fogo e no cutelo e iniciou a subida. Isaac estranhou não levarem nenhum animal, mas Abraão tranquilizou-o, dizendo: “Deus deparará uma vítima para o seu holocausto!”, e continuaram.
Ao chegarem ao lugar, Abraão levantou um altar, pôs a lenha sobre ele, atou o filho e pô-lo por cima. De seguida foi buscar o cutelo, e quando lhe ia lhe dar o golpe fatal, apareceu um anjo que lhe segurou no braço, e lhe disse: “Passaste no teste de stress! Desamarra o rapaz que eu trouxe-te um carneiro!” e, como prémio concluiu: “Eu multiplicarei a tua estirpe e farei com que a tua descendência possua as portas dos seus inimigos!” ... e todas as mulheres do seu clã tiveram filhos e até a sua concubina Roma pariu quatro vezes.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

António Arnaut

In Jornal Médico de 27-09-2013

SNS à mercê de uma oligarquia financeira sem rosto que controla o Governo e a Lei

"Tenho de vos dizer, sem rodeios nem eufemismos: há em Portugal certa gente que, servindo certos interesses, quer destruir o Estado Social e fazer da Saúde um negócio, parasitando e degradando o SNS até o reduzir a um serviço de tipo assistencial para os mais pobres". A acusação é de António Arnaut e foi feita hoje em Lisboa, na sessão de abertura do 1º Congresso do Serviço Nacional de Saúde "SNS - Património de Todos", que contou, entre outras figuras-chave do sector, com a presença do Secretário de Estado da Saúde, Manuel Teixeira.
Ressalvando nada o mover contra o sector privado, que "deve desempenhar um papel importante na prestação de cuidados", Arnaut alerta para o que considera ser "o engodo da livre escolha" que está a ser utilizado para "obter um novo financiamento do Estado para salvar certas unidades em situação deficitária, que não têm procura para a capacidade instalada". Apoiando-se em números divulgados pelo nosso jornal, o antigo ministro dos assuntos sociais do segundo governo constitucional, avançou com dados concretos que no seu entender sustentam a acusação: "O sector privado já é hoje financiado em 30% pelo SNS, através do SIGIC, das convenções e dos subsistemas de saúde. Acresce que a ADSE lhe pagou, em 2011, conforme reconheceu a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, 492milhões de euros".
Segundo Arnaut, os ataques contra o SNS não são de hoje: surgiram logo que foi anunciada a sua criação"... Sem no entanto terem surtido efeito, dados os bons resultados alcançados, "à dedicação dos profissionais, ao apoio dos portugueses, das forças progressistas, e até da direita que preza a doutrina social da Igreja. Apoios que fizeram do SNS "o melhor serviço público português" que permitiu ao nosso país um "lugar cimeiro na efectivação e na qualidade dos cuidados de saúde, com uma despesa per capita das mais baixas da Europa".

A investida neoliberal

Se ao longo dos seus já 34 anos de existência o SNS sempre resistiu aos ataques de que foi sendo alvo, hoje enfrenta a investida de um inimigo com poderes reforçados, aponta o co-fundador do Partido Socialista: "a direita dos interesses, aproveitando os ventos neoliberais que sopram da Europa". Um inimigo que segundo o advogado "não desistiu do seu projecto de destruição do Estado Social de que o SNS é a trave-mestra", apontou, para logo acrescentar: "os privilegiados e o grande capital pensam que o mundo é a sua coutada e os trabalhadores e os pobres o seu rebanho.

Luta de classes... Pelo Estado Social
Para Arnaut, a luta de classes continua a existir, sendo o objecto que divide os beligerantes, a vontade da maioria de construir um Estado Social de Direito. Para Arnaut, o Estado Social "é a democracia vivida na sua tripla dimensão política, económica e social, que faz do indivíduo uma pessoa, da pessoa um cidadão livre e do cidadão um elo activo da mesma comunidade fraterna.
Para o antigo responsável da pasta da saúde do segundo governo de Mário Soares, "a luta de classes continua a existir, já não entre senhores e servos, aristocratas e plebeus, patrões e operários, mas entre as duas classes a que o capitalismo selvagem reduziu a nossa sociedade: os magnatas da alta finança e seus serventuários, e a generalidade dos cidadãos que vive do seu trabalho ou da sua reforma". Segundo Arnaut, o que existe hoje é um "interclassismo nivelador, com a progressiva extinção da classe média, a precarização do trabalho, a redução das prestações sociais e o empobrecimento geral, face a uma oligarquia financeira sem rosto nem rasto, que criou paraísos fiscais e outros caminhos de fraude". Uma criação só possível, afirma o advogado, através do controlo dos governos e da produção legislativa. "Há, como sabemos, um sistema de vasos comunicantes, entre os governos e os grandes empórios que, além de lesiva para o bem-comum, se tornou obscena e mesmo insultuosa, porque parece, às vezes, que são todos da mesma família", acusa.
Na pirâmide de culpados pela investida contra o Estado Social e assim contra o SNS, António Arnaut encontra, no vértice, a União Europeia, à qual acusa de ser a cúpula do neoliberalismo desbragado "reduzindo os cidadãos a meros consumidores, mercantilizando a vida e capturando a soberania dos estados com as suas directivas encomendadas pelos grandes grupos económico-financeiros".
Sem papas na língua, o antigo governante acusa: "Portugal está a ser vendida a retalho às multinacionais e a gente sem escrúpulos, por vezes mesmo, aos especuladores que causaram a crise e agora se locupelam com o património dos países em dificuldade, sem compaixão nem vergonha". Para Arnaut, "são estes especuladores que querem destruir a escola pública, a segurança social e o próprio SNS, privatizando os direitos sociais."

Taxas moderadoras... Imorais
Referindo-se às taxas moderadoras, António Arnaut considera que estas alcançaram um valor que dificulta e impede o acesso universal dos cidadãos aos cuidados de saúde. E depois, aponta, a sua aplicação conduz a violações grosseiras dos princípios humanistas que orientam o SNS. Em Lisboa, Arnaut apresentou dois exemplos dos efeitos negativos do valor excessivo das taxas moderadoras: "Uma urgência num hospital central paga 20 euros de taxa, podendo alcançar os 50 no caso de exames auxiliares de diagnóstico. Sei de hospitais privados que fixaram em 40 euros o preço de uma urgência, incluindo uma radiografia ou equivalente. Este facto, conjugado com a subida generalizada de todas as taxas moderadoras e a criação de novas taxas, provocou uma significativa redução da procura das unidades do SNS e fez aumentar a procura do sector privado em números preocupantes".
O segundo exemplo apresentado pelo fundador do SNA é, segundo o mesmo, ainda mais chocante: "diz-me pessoalmente respeito, mas é claro que não a refiro por mim, mas por causa daqueles que não têm voz e me pedem que denuncie esta grave injustiça. Até à publicação do DL 113/2011, os doentes oncológicos beneficiavam de isenção geral de taxas moderadoras, mas agora só estão isentos nos tratamentos de quimio e radioterapia. Quando fazem outros tratamentos ou vão a consultas específicas da própria doença pagam a respectiva taxa, salvo se estiverem isentos por carência económica ou solicitarem ao centro de saúde uma junta médica que lhes atribua uma incapacidade igual ou superior a 60%".
Para Arnaut, para além de chocante, esta situação "revela uma incompreensível desumanidade e rompe com o conceito de taxa moderadora".

A desumanização alastra...
Na Aula Magna, em Lisboa, António Arnaut apontou também exemplos do que diz ser a desumanização que vai alastrando, como doença crónica, no SNS. "há hospitais onde os doentes se amontoam nos corredores, outros que não administram certos medicamentos e há terapias para o cancro recusadas no SNS que são pagas na ADSE em hospitais privados.

O défice não é culpa do Estado Social
Citando a obra "Quem paga o Estado Social em Portugal", coordenada pela historiadora Raquel Varela (Bertrand, 2012), António Arnaut afirma: "os défices dos Estado não podem ser imputados aos gastos sociais e na maioria dos anos há mesmo um excedente, porque os trabalhadores entregam mais ao Estado do que recebem dele". Para o antigo ministro, os défices devem ser procurados "na corrupção, no desperdício, nos negócios ruinosos como as PPP e os SWAPS, nas isenções fiscais privilegiadas, como os fundos de investimento imobiliário, na fuga à tributação para paraísos fiscais e até para a Holanda e Luxemburgo, países membros da União Europeia, de cerca de 30 mil milhões de euros por ano".

Estimular os profissionais
Estando convencido de que a sustentabilidade do SNS é, não um problema financeiro, mas, isso sim, político, António Arnaut deixou em Lisboa alguns conselhos: "Se a carreira dos profissionais de saúde for garantida, mediante boas condições de trabalho, estabilidade, formação permanente remuneração condigna, talvez se consiga, sem aumento de despesa, trazer gradualmente para o regime de exclusividade a maior parte dos trabalhadores do SNS, melhorando a qualidade e a produtividade, sobretudo se forem concedidos, além dos justos incentivos materiais, o reconhecimento moral pela relevante função que desempenham". E que forma poderia assumir esse reconhecimento? Arnaut deixa uma ideia: um profissional que se tenha dedicado 20 ou 30 anos ao SNS, com assiduidade, competência e devoção, devia ver publicamente reconhecido o seu mérito e a gratidão do Estado. Um diploma de honra poderia constituir uma forte motivação moral".

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Promessas


Isaac chamou o seu filho Jacob e disse-lhe: Vai a casa do teu tio Labão, irmão da tua mãe, que vive em Haran, na Síria, e desposa uma das suas filhas.
Jacob foi buscar as mulheres que já tinha e meteu-se ao caminho (885km). Numa noite, teve um sonho em que Deus lhe disse “eu te darei a ti e à tua descendência a terra em que dormes” (estaria no Monte Moriá - Jerusalém, e foi a 3ª vez que Deus prometeu essa terra aos Judeus. A primeira foi a Abraão, a 2ª a Isaac). Com a pedra que lhe servia de almofada, Jacob fez um altar e confiante voltou ao caminho, até encontrar  um poço onde pastores davam de beber aos rebanhos. Com um deles chegava a linda Raquel, filha mais nova de Labão. Foi amor à primeira vista. Jacob apresentou-se, e ela foi anunciá-lo ao pai que ficou feliz ao saber ao que ele ia. Fechou-se o negócio: uma filha a troco de sete anos de trabalho na sua casa. Jacob pensava em Raquel, mas no dia do casamento Labão meteu-lhe na câmara a sua filha mais velha – a remelosa Lia, argumentando que o costume era casar primeiro a mais velha, mas que, se ele quisesse muito a Raquel, com outros sete anos, também a podia levar.

Jacob dispôs-se então a trabalhar para Labão catorze anos, mas assim que tomou Raquel como esposa, começou a desprezar a Lia. Vai daí Deus, fez com que Raquel fosse estéril e deu 4 filhos à Lia.
Raquel, cheia de inveja, para resolver a sua infertilidade, chamou a sua criada Bala, pô-la ao jeito de Jacob, e fez com que ela parisse sobre os seus joelhos, para assim ter filhos dela. E por este processo teve 2 filhos. Lia apercebendo-se desta nova técnica, resolveu a falta de assiduidade de Jacob, chamou a sua escrava Zelfa e submeteu-a ao mesmo tratamento, o que lhe deu mais 2 filhos.

A coisa tomou foros de competição. Um dia em que um filho de Lia levou para casa da mãe um molho de mandrágoras, Raquel pediu-lhe uma manadita. Como Jacob não se ia a ela havia tempo, Lia propôs-lhe um pequeno negócio: Deixa-o passar esta noite comigo e eu dou-tas! Dito e feito. Lia não só engravida, como o entende como uma paga de Deus, por ter dado a escrava ao marido para que ele a engravidasse. Jacob deve ter ficado alerta com a facilidade com que Lia engravidava e numa nova volta, surgiu um sexto filho. Lia ficou a ganhar a Raquel por 8-2.
Então Deus lembrou-se de Raquel e fê-la fecunda e deu-lhe um filho. Resultado final: 8-3.
Depois Jacob disse ao sogro: “Deixa que vá para a minha terra. Dá-me as minhas mulheres e os meus filhos, pelos quais te tenho servido, para ir daqui!”.
E depois de umas estranhas partilhas, voltou Jacob sobremaneira rico, como muitos rebanhos e um grande número de escravos e escravas.
Génesis 28, 29, 30
...
Resumi a história, que aparentemente pouco tem a ver com a actualidade, mas ela é fundamento do conflito israelo-árabe, onde Israel reclama os territórios que Deus lhes prometeu.

domingo, 20 de outubro de 2013

sábado, 19 de outubro de 2013

Tântalo


Tântalo, rei da Frígia, filho de Zeus e da princesa Plota, era um semideus, como Aquiles, Hércules e muitos outros da mitologia grega, pois Zeus estava constantemente a apaixonar-se, mulher após mulher, recorrendo a toda a espécie de subterfúgios para as ludibriar ou coagir, para desespero da sua esposa Hera.
Tântalo, embora mortal, convivia com os deuses e, apercebendo-se das suas fragilidades, movido por uma paixão/ódio, decidiu pôr à prova a sua omnisciência. Sacrificou o seu filho Pélope, mandou cozinhá-lo e servi-lo aos deuses que honravam um banquete no seu palácio.
Descoberto, puniram-no exemplarmente, para que mais nenhum humano os desafiasse. Foi colocado num poço, no Hades, condenado a não poder saciar nem sede nem fome. Atormentado, sempre que se inclinava para beber, via a água infiltrar-se no chão, para reaparecer quando se levantava, e quando esticava a mão para apanhar os frutos que pendiam sobre o poço, via os ramos serem levados para fora do seu alcance, pelo vento.
Quanto a Pélope, os deuses restituíram-lhe a vida, mas tiveram de lhe moldar um ombro em marfim, porque uma das deusas, Deméter, o teria comido inadvertidamente.
São histórias que, de um modo ou outro, nos moldam e nos fazem temer quem gravita na esfera celestial.

Job


Há um quê de irracional que me leva a acreditar que todo o crime tem castigo e a recusar o sofrimento dos inocentes e dos justos. Mas os deuses sempre jogaram aos dados com o mundo e, mesmo que nos dêem alguma capacidade de intervir, será deles a decisão final.
Job era íntegro e temente a Deus. Tinha sete filhos, três filhas, sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas de bois, quinhentas jumentas e muitos servos, e quando Satanás questionou a sua fidelidade a Deus, este permitiu que ele lhe matasse a família e os animais, que lhe destruísse os bens e o cobrisse de chagas, só para testar a constância da sua fé.
Pobre Job, joguete numa disputa de poderosos, sem plano B para conquistar o Céu.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

64


When I get older losing my hair,
Many years from now,
Will you still be sending me a valentine
Birthday greetings bottle of wine?

If I'd been out till quarter to three
Would you lock the door,
Will you still need me, will you still feed me,
When I'm sixty-four?

oo oo oo oo oo oo oo oooo
You'll be older too, (ah ah ah ah ah)
And if you say the word,
I could stay with you.

I could be handy mending a fuse
When your lights have gone.
You can knit a sweater by the fireside
Sunday mornings go for a ride.

Doing the garden, digging the weeds,
Who could ask for more?
Will you still need me, will you still feed me,
When I'm sixty-four?

Every summer we can rent a cottage
In the Isle of Wight, if it's not too dear
We shall scrimp and save
Grandchildren on your knee
Vera, Chuck, and Dave

Send me a postcard, drop me a line,
Stating point of view.
Indicate precisely what you mean to say
Yours sincerely, Wasting Away.

Give me your answer, fill in a form
Mine for evermore
Will you still need me, will you still feed me,
When I'm sixty-four?

domingo, 13 de outubro de 2013

Carta aberta a Maria


Bom dia! Maria!
Há anos que ando para te escrever, mas com tanto para te dizer, inibo-me. Hoje, como enches o audiovisual nacional, senti um pequeno impulso e vim para este teclado dar-te notícia dos meus tormentos.
Primeiro quero dizer-te que gosto das tuas imagens e da beleza calma com que os santeiros, ao longo dos anos, te têm representado. Também gosto do conceito de mulher/mãe, preocupada com a paz da sua família, que te está associado, pois esse conceito é fundamental para a organização de qualquer sociedade, o que, só por si, faz de ti um ícone.
Mas, queria-te dizer que, embora nesse aspecto, mantenhas plena actualidade, devias ter forçado o clero a dar-te outros atributos que te tornassem mais socialmente interventiva ... no “seu” mundo de homens. Esse teu ar recatado, de quem espera em vez de fazer acontecer, não está muito de acordo com a vida no ocidente, onde a pílula já não confina as mulheres à esfera da família. .
Também essa “eterna juventude”, com que sistematicamente te representam, desde que o Miguel Ângelo te esculpiu na Piéta, onde os teus quase cinquenta anos foram retratados como se estivesses ainda na adolescência, não ajuda ... sempre. Não se estranha, pois a mitologia cristã, à semelhança da mitologia greco-romana, manteve as deusas representadas como jovens capazes de provocar êxtases a frades votados à clausura, e os santos e deuses como homens bem para lá dos quarenta anos.
Mas adiante. Agora, como o turismo religioso é fonte de rendimento para o país e para o clero, meia dúzia de idólatras, transformou-te num “bezerro de ouro”, alvo de culto, à revelia do primeiro mandamento.
Os tempos que correm exigem mais de ti. Primeiro que abandones o epíteto de “Virgem”, porque no ocidente desenvolvido já poucos ligam a esses malabarismos de ter partos eutócicos e ficar tudo na mesma. Depois que se deixe de falar da tua "ascenção", porque também ninguém percebe porque é que havias de levar o corpo para o Céu, onde só te traria preocupação. Por fim, devias recriar a tua imagem, apresentando-te também de manga arregaçada a defender publicamente uma carta de direitos das mulheres. Isso é que era uma boa jogada! Agora só te disponibilizares para ouvir “Avés” e as tretas de um clero intencionalmente disposto a distrair os aflitos das suas aflições, parece-me muito pouco.
O “Culto Mariano” devia dar bases para a qualidade da maternidade, da luta contra a violência doméstica e para o enquadramento da mulher no mercado de trabalho, de modo a que o emprego considerasse o seu imprescindível papel de mãe. Mas no Clero há muitos que só lutam pelo seu próprio bem-estar e, sob a pele de cordeiros, associam-se ao poder, enredando os mais frágeis (onde as mulheres frequentemente se encontram) em historietas e falsas esperanças, inviabilizando os movimentos que conflituam com os interesses dos poderosos.
Queres um conselho, Maria? Associa-te a este Papa. Ele já começou a mexer na Cúria e no Clero e a preocupar-se mais com o que se passa com quem o ouve.
Não te envaideças com as praças cheias em Fátima, nem com o lucro dos garrafões de água e das velas em Lourdes, que isso pode ser sol de pouca dura, se te mantiverem neste registo, pois já deve haver outros ícones prontos para competir contigo, uns “Made in China”, outros, “in South Chorea” e, se não lutares por este nicho de mercado, entras rapidamente em falência.
Agora adeus, que eu tenho que calçar as botas e tratar da horta, que o Borda d’Água manda, e eu tenho de ir plantar a tronchuda para o Natal e semear cenouras e nabiças.

Até sempre, Maria!


Fernando

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Exame de Geografia Política

- Menino Rochinha, por favor, diga-me o nome das cidades de Portugal na Idade Média?
- Braga, Porto, Viseu, Lamego, Guarda, Coimbra, Lisboa, Évora e Silves.
- Muito bem! E quantas havia em 1974, antes do 25 de Abril?
- Quarenta e três!
- Muito bem! E depois da lei nº 11/82, quantas vilas passaram a cidade?
- Cento e treze. Agora temos cento e cinquenta e seis cidades em Portugal!
- Já vi que tem os números decorados. Pode-me dizer então as  vantagens de uma vila passar a Cidade.
- Ser cidade influencia as transferências financeiras que o município recebe da administração central.
- E o que é preciso para ser considerado cidade?
- A lei nº 11/82 exige mais de oito mil eleitores, um aglomerado populacional urbanizado contínuo, e pelo menos metade dos seguintes equipamentos colectivos: Instalações hospitalares com serviço de permanência, farmácias, corporação de bombeiros, casa de espectáculos e centro cultural, museu e biblioteca, instalações de hotelaria, estabelecimento de ensino preparatório e secundário, estabelecimento de ensino pré-primário e infantários, transporte público (urbano e inter-urbano) e/ou parques ou jardins públicos.
- Muito bem! E o menino sabe o que esses equipamentos nos custam?
- Sim! Esses equipamentos têm custos de construção e de manutenção. Atendendo a que se permitiram cidades com menos eleitores que o previsto e que na maioria das vilas foi possível construir a metade daqueles equipamentos com gestão pouco eficiente, o resultado são os grandes encargos municipais que actualmente se reflectem em impostos directos e indirectos, e na progressiva diminuição do salário dos funcionários públicos e das reformas dos pensionistas.
-Oh Rochinha! Já tem um vinte! Mas antes de ir embora responda-me, por favor, a mais esta pergunta: Acha possível desqualificar cidades como Borba, Gandra, Mealhada, Mêda, Moura, Oliveira do Bairro, Oliveira do Hospital, Passos de Ferreira, Pinhel, Reguengos de Monsaraz, Sabugal ou Vila Nova de Foz Coa?
- Não Sr. Professor. Temos é de dar graças a Deus por Macinhata do Vouga não se ter candidatado.
- Estou satisfeito.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Quarta Idade


O meu tio Manuel está para lavar e durar. Anda todos os dias para cima de 5 Km, tem a cabeça escorreita e não se conhece uma artrose no seu metro e sessenta e cinco.
Quando fez 100 anos, a família fez-lhe uma grande festa e ele andou de mesa em mesa a oferecer fotografias suas autografadas.
No fim da refeição, quando já estava tudo mais calmo, para lhe fazer um carinho, disse-lhe: - “Oh tio! Daqui a dez anos, vamos estar cá outra vez para festejar!”
Aí, ele pôs um ar grave, como convém quando se fala com um médico, e respondeu-me: - “Não sei como vai ser a minha vida, Judite! A minha filha está velha. O meu genro, … velhíssimo! Um destes dias morrem! … E o que é que vai ser de um homem?”

Ele disse aquilo preocupado, sem um laivo de ironia. E olha que não está longe da verdade!

História de J.Q.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Elas

Talvez eu esteja enganado, mas está “na moda” pôr as mulheres a mandar.
Quando há necessidade em arrumar a casa, para que possamos dar novos passos em segurança, o “X” ajuda mais que o “y”.
De facto, as novidades da última metade do século foram tantas que, para que a população possa usufruir delas, sem a ajuda daqueles técnicos que resolvem um problema e criam dois, há que meter as mulheres ao barulho.
Claro que há homens com um “X” grandioso, arrumadinhos e disponíveis, mas na maioria deles, o “X” é pouco activo e o pequeno “y” anda eternamente a testar novos limites com pouca disponibilidade para esse recado.
O “y” tem os genes ocupados “a mostrar quem se é” – para os automóveis, para o futebol, para os relógios e roupa de "marca" e os que sobram, para “arrotar umas postas de pescada” em futurices desmedidas e  para uns arrancos directos à concupiscência e à procriação da espécie.
Os homens de X grandioso, são habitualmente homo ou metrossexuais, facilmente identificáveis pelos trejeitos. É a necessidade de adulação que os move e, como tal, são erráticos e com laivos maníaco-depressivos. São abundantes na política e nos círculos que lhe estão afectos. Gabam-se do jogo de cintura e estão sempre disponíveis para defender hoje uma causa e amanhã o seu contrário, desde que não os tirem do palco.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Bonecas



Desde a antiguidade mais remota que as bonecas nos servem, nos rituais magico-religiosos e como brinquedos.
Inspiram as meninas para a maternidade, ensinam-lhes um modo de estar, vivem-lhes as angústias, sofrem com elas e morrem esquecidas a um canto, quando perdem utilidade.