sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Valter Hugo Mãe - A Desumanização


Tricotávamos a lã que sobrava e voltávamos aos livros, a ler tudo outra vez e só reparávamos nas palavras. Queríamos nada saber das histórias. Prestávamos atenção às palavras para sabermos como eram ditas as coisas. Porque alguns livros pareciam perfumar a linguagem, outros sujavam-na e outros ignoravam-na. Os livros podiam ser atentos ou desatentos ao modo como contavam. Nós, inspeccionando muito rigorosamente, achávamos melhores aqueles que falavam como se inventassem modos de falar. Para percebermos melhor o que, afinal, era reconhecido mas nunca fora dito antes. Os melhores livros inauguravam expressões. Diziam-nas pela primeira vez como se as nascessem. Ideias que nasciam para caberem nos lugares obscuros da nossa existência. Andávamos como pessoas com luzes acesas dentro. As palavras como lâmpadas na boca. Iluminando tudo no interior da cabeça.
… As palavras deixavam-nos mágicos.


Comecei a lê-lo sem fé. Acabei-o, com a sensação de ter lido um livro de referência, a reler, tantas são as pérolas, a dar razão a este pequeno trecho respigado da página 193.
A não perder!

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