Quando me contaram que ela punha nomes de pessoa às galinhas e que depois as não conseguia matar, sorri, pois também eu não me imaginava a comer um ser com direito a nome próprio e a um histórico. Só lhe aproveitava os ovos e deixava-as morrer de velhas, incapaz de petiscar a Madalena, a Alice ou a Etelvina.
Mais tarde associei esta história a uma outra em que, nalgumas comunidades com grande mortalidade infantil, as crianças só recebem o nome com vários meses de vida, como se fosse ele a dar-lhes direito a cidadania e não o nascimento. Por fim, dei por mim a magicar em que se não conseguirmos nomear as coisas, sejam elas animadas ou inanimadas, não as respeitamos.
Se olharmos em volta e só virmos “pardais”, então, tudo é
“praga”, como aconteceu com Mao Zedong quando, em 1958, ordenou que se matassem
todos eles, por comerem "demasiados grãos", o que causou um dos maiores
desastres ecológicos da História. A população mobilizou-se, destrui ninhos e
fez barulho continuado para os assustar e os impedir de pousar, até morrerem de exaustão. Nos três anos seguintes morreram 45 milhões de
chineses de fome, devido aos erros económicos, ao desastre ambiental e ao estado
de terror. É que passarinhos há muitos. Os que comem grãos, os que comem
insectos e os que nos livram do que por aí morre, impedindo que as verdadeiras pragas
se estabeleçam. A “inteligência” da nomenclatura comunista chinesa ao “cortar a
direito” esqueceu-se que é na diversidade que se encontram soluções e não na
monotonia do “faz como te digo e dá ao diabo o que pensas!”
Mas para ter opinião válida é preciso estudar. Não chega o que se aprende
na “Universidade da Vida”. Se o berço for bom, talvez nos faça gente educada e
respeitadora de valores, mas instrução (conhecimento, ciência, erudição, …), há
que ir buscá-la onde houver o “saber”: às escolas, aos
livros, às palestras, na Net, porque não?, mas nada como ter um bom professor
que nos oriente e nos abra os olhos para o que está à nossa frente e não conseguimos
ver, porque não o conseguimos nomear.
Amén
O QI médio da população mundial (que sempre aumentou desde o
ResponderEliminarpós II Guerra até o final dos anos 90) diminuiu nos últimos vinte anos.
É a inversão do efeito Flynn.
Parece que o nível de inteligência medido pelos testes diminui nos países mais desenvolvidos.
Pode haver muitas causas para esse fenómeno e um deles pode ser o empobrecimento da linguagem.
Na verdade, vários estudos mostram a diminuição do conhecimento lexical e o empobrecimento da linguagem: não é apenas a redução do vocabulário utilizado, mas também as subtilezas linguísticas que permitem elaborar e formular pensamentos complexos.
O desaparecimento gradual dos tempos (subjuntivo, imperfeito, formas compostas do futuro, particípio passado) dá origem a um pensamento quase sempre no presente, limitado ao momento: incapaz de projeções no tempo.
A simplificação dos tutoriais, o desaparecimento das letras maiúsculas e da pontuação são exemplos de "golpes mortais" na precisão e variedade de expressão.
Apenas um exemplo: eliminar a palavra "senhorinha" (agora obsoleta) não significa apenas abrir mão da estética de uma palavra, mas também promover involuntariamente a ideia de que entre uma menina e uma mulher não existem fases intermediárias.
Menos palavras e menos verbos conjugados significam menos capacidade de expressar emoções e menos capacidade de processar um pensamento. Estudos têm mostrado que parte da violência nas esferas pública e privada decorre diretamente da incapacidade de descrever as emoções em palavras.
Sem palavras para construir um argumento, o pensamento complexo torna-se impossível. Quanto mais pobre a linguagem, mais o pensamento desaparece.
A história está cheia de exemplos e muitos livros (Georges Orwell - "1984"; Ray Bradbury - "Fahrenheit 451") contam como todos os regimes totalitários sempre atrapalharam o pensamento, reduzindo o número e o significado das palavras.
Se não houver pensamentos, não há pensamentos críticos. E não há pensamento sem palavras.
Como construir um pensamento hipotético-dedutivo sem o condicional?
Como pensar o futuro sem uma conjugação com o futuro?
Como é possível captar uma temporalidade, uma sucessão de elementos no tempo, passado ou futuro, e sua duração relativa, sem uma linguagem que distinga entre o que poderia ter sido, o que foi, o que é, o que poderia ser, e o que será depois do que pode ter acontecido, realmente aconteceu?
Caros pais e professores: Façamos com que nossos filhos, nossos alunos falem, leiam e escrevam. Ensinar e praticar o idioma em suas mais diversas formas. Mesmo que pareça complicado. Principalmente se for complicado. Porque nesse esforço existe liberdade.
Aqueles que afirmam a necessidade de simplificar a grafia, descartar a linguagem de seus "defeitos", abolir géneros, tempos, nuances, tudo que cria complexidade, são os verdadeiros arquitetos do empobrecimento da mente humana.
Não há liberdade sem necessidade. Não há beleza sem o pensamento da beleza.
Autor: Christophe Clavé