Qualquer modo de ver a realidade é necessariamente limitado. Estas são algumas das histórias que definem o meu olhar.
quarta-feira, 27 de dezembro de 2017
Esquizofrenia 2
Sente-se “decaído!”, cansado e com a boca queimada - "Foi ao comer a sopa!". Diz ter sido burlado! Venderam-lhe um telemóvel desactualizado e não dormiu com medo de não acordar a horas da consulta.
Anda na vida de médico há muitos anos! Desde que está nos psiquiatras, está em sofrimento… A cabeça não anda sossegada!”... Quando era jovem, olhou para uma mulher e sentiu o cérebro a cair desde o céu. Nunca mais teve descanso! Esteve na Guerra Colonial. Foi ele que causou, com o pensamento, o golpe de estado em Moçambique. Diz ter duas cruzes uma à frente e outra nas costas, que já conseguiu falar pelas costas e que consegue transportar-se para uma quarta dimensão. Acha que as pessoas podem ouvir o que pensa e que os americanos e os russos lutam por controlá-lo. Foi por isso que a avó, um dia, lhe bateu!
Não quer ficar internado. Está irritado por ter recebido uma carta do tribunal para tratamento ambulatório compulsivo.
Hoje não abriu a porta à equipa de entrega domiciliária de refeições e os vizinhos, que há mais de um dia o não viam, alertaram a GNR. Foi encontrado caído no chão com fezes e urina em redor. No transporte para a Urgência teve uma crise convulsiva.
quarta-feira, 20 de dezembro de 2017
Um "raminho"!
Sr. Dr..! O meu pai sempre foi muito ansioso! Há uns anos,
quando ainda estava bem, levava todas as noites para a cabeceira da cama um
copo de água açucarada, com medo das hipoglicemias! Ele ainda não tomava insulina, mas precavido como era, queria ter a solução à mão!
Um dia acordou a meio da noite com um formigueiro no braço. Com medo que aquilo fosse um sinal, deitou a mão ao copo, bebeu dois
goles e voltou a deitar-se. Só que, em vez de melhorar, piorou. O formigueiro
que inicialmente só sentia no braço, estendeu-se a toda a face e à língua.
Muito assustado, sentou-se na cama, acendeu a luz e chamou
pela minha mãe, dizendo-lhe que estava a ter um “raminho”. Ela, assarapantada,
deu a volta à cama para ver o que se passava. Foi quando viu o copo cheio de
formigas e muitas espalhadas por aquele lado da cama!
segunda-feira, 18 de dezembro de 2017
Carta aberta o Pai Natal
Tenho-te escrito com alguma regularidade nesta época em que toda a gente com acesso aos meios de comunicação social, disponibiliza uns minutos aos "dispensáveis" desta sociedade universal do comércio, que enriquece uma minoria e faz parecer a democracia um jogo dos poderosos.
Na tua época, os monges alegavam ser a pobreza “a primeira das bem-aventuranças” e tu, agora, fazes despudoradamente o jogo do consumismo! Como é?! Até pareces acreditar que são os empresários que se movimentam de negócio em negócio nos mercados livres, que garantem o crescimento económico e a prosperidade mundial e que tudo o que os governos devem fazer é sair-lhes da frente, sem considerarem factores de constrangimento como o espaço geográfico, os recursos naturais e os ecossistemas frágeis que frequentemente, estão na génese da pobreza.
Pela primeira vez na História, todos os povos da Terra têm um presente comum e sentem o choque dos acontecimentos que ocorrem no outro lado do mundo, amplificados pela imprensa e pelas redes sociais. A variedade está a desaparecer. Todos os povos se copiam e em todos os cantos do mundo se encontra a mesma maneira de agir, de pensar e de sentir.
Estimula-se a ambição, não tanto por uma necessidade real, mas pelo desejo de ultrapassar os outros, num “mimetismo apropriador” que faz desejar objectos, porque os desejos dos outros nos dizem que esses objectos se devem desejar, e muitas das grandes palavras da justiça, da lei, da ajuda aos fracos, da filosofia e do progresso da razão, são iscos inventados por políticos inteligentes para se imporem aos simples.
Ora é essa onda que tu surfas, entretido com vendas de inutilidades, em vez de te preocupares com uma alternativa ecológica que não nos desgrace o futuro.
Devias ter percebido que a tecnologia vai criar um número crescente de desadaptados que, mesmo que lhes seja dado dinheiro para “comprar”, se sentirão insatisfeitos por lhes faltar o reconhecimento social. A Inteligência Artificial e a Robótica (se o estar mundial se não modificar), deverão causar uma alteração brutal no mercado de trabalho, pois só haverá necessidade de empregar 20% da população para que as suas necessidades sejam satisfeitas. O conhecimento exigido para ser um membro produtivo já está a mudar e o sucesso do ensino não se irá medir pelo número de licenciados, mas pelo número de graduados relevantes no mercado de trabalho.
A maioria dos humanos incapazes de entrar nesta corrida poderá revoltar-se e, se dirigidos por homens frustrados, poder-nos-ão levar ao anarquismo ou a nacionalismos fundamentalistas de má memória.
Eu sei que não se vêm alternativas plausíveis ao actual “credo” que diz que as classes médias criadas pelo capitalismo industrial originarão governos representativos, estáveis, responsáveis e capazes de prestarem contas, que a religião cederá o seu lugar ao laicismo e que as forças do irracionalismo serão derrotadas.
É por isso que te escrevo a pedir que uses o teu reconhecimento público (nas sondagens vais muito à frente do menino Jesus) e abraces uma causa que não nos desenraíze da Natureza e nos tire do limite de termos de rogar a Deus muita saúde para o carro, para ele não avariar.
É por isso que te escrevo a pedir que uses o teu reconhecimento público (nas sondagens vais muito à frente do menino Jesus) e abraces uma causa que não nos desenraíze da Natureza e nos tire do limite de termos de rogar a Deus muita saúde para o carro, para ele não avariar.
Mas não me perguntes como fazer, que eu, quanto mais leio, mais me confundo. Por um lado, acho que a ciência é o caminho para a nossa salvação como espécie, ao nos fazer entender que na Terra há uma multidão de outras espécies que têm papel fundamental no seu equilíbrio e que este nos tem sido favorável e que, qualquer outro, pode levar a ajustes onde não consigamos igual vantagem. Por outro lado, também penso que, quanto mais competências se exigirem para se ser o tal "membro produtivo" da nova sociedade, mais "dispensáveis" se criarão e mais frustração grassará no mundo!
Tu, embora tenhas residência oficial no Pólo Norte, vais frequentes vezes ao Céu, e, de lá de cima, tens distância para analisar os futuros e avisar as elites arrogantes que há mais vida para além do capitalismo apátrida.
Procura o Maomé, o Buda, o Marx, o Adam Smith, a Nossa Senhora de Fátima, mais quem tu entenderes e vê se no dia 25 os sentas à mesma mesa com o tal "espírito de Natal", para impedir que os humanos se apropriem tudo o que há no Universo e dêem espaço às outras formas de vida!
É este o meu desejo!
Fico à espera!
Um abraço!
Oh! Oh! Oh!
Procura o Maomé, o Buda, o Marx, o Adam Smith, a Nossa Senhora de Fátima, mais quem tu entenderes e vê se no dia 25 os sentas à mesma mesa com o tal "espírito de Natal", para impedir que os humanos se apropriem tudo o que há no Universo e dêem espaço às outras formas de vida!
É este o meu desejo!
Fico à espera!
Um abraço!
Oh! Oh! Oh!
sábado, 9 de dezembro de 2017
Serviço de Urgência
- A senhora é a esposa do Sr. José?
- Sim! Sou!
- Eu sou o médico que está a tratar o seu marido.
- Ele vai ficar internado?
- Não! Estou a pensar em dar-lhe Alta. Não tem doença que justifique o internamento! O que ele tem, está relacionado com o consumo crónico de bebidas alcoólicas. Ele, ainda ontem, bebeu!!!!.... O tratamento, como sabe, é deixar de beber. E isso pode fazer em casa!
- Sim! Mas hoje de manhã ele estava esquisito! Parecia que lhe faltava o ar! Foi por isso que eu chamei o INEM!
- Mas ele agora está bem! Não tem febre, o coração e os pulmões estão calmos e as análises são o que se espera num doente com a sua situação!
- Mas o Sr. Dr. podia interná-lo, para ele descansar o fígado! Da última vez que esteve internado, aguentou quase dois meses!
O Sr. José, veio transferido de um Centro de Saúde e, há horas, que ocupa uma maca do corredor do Serviço de Urgência. Já dormiu, já comeu, já fez análises e uma ecografia, já lhe mediram várias vezes os sinais vitais, e tirando as alterações hepáticas decorrentes de uma cirrose que, de há seis anos, o traz repetidas vezes ao Serviço de Urgência, não se identificou situação que justifique mais um internamento.
- A senhora há-de convir que, um hospital, é demasiado caro para "descansar" o fígado.
- É que, se ele vai para casa, volta a beber!
- Mas ele não pode ficar a viver no Hospital e, ao que parece, quando volta para casa, a família permite-lhe o consumo e ele estraga tudo o que aqui possa ter ganho!
- O que é que eu posso fazer? Se eu não lho dou, ele vai buscá-lo à adega e, se eu lha fecho, ele até é capaz de arrombar a porta. Olhe que ele nunca levantou a mão para mim, mas se eu não lhe der o vinho, não sei do que ele seria capaz!
Esta é a fase em que a conversa pode tomar vários rumos.
Estou num Serviço de Urgência, a horas em que não tenho apoio de Psiquiatria, nem do Serviço Social e em vésperas de um fim de semana prolongado.
O doente teve já sete internamentos em Medicina por complicações relacionadas com a "doença", foi já orientado para a Consulta Externa de Medicina Interna e de Psiquiatria e abandonou-as.
É fácil chamar ao alcoolismo, síndrome de dependência do álcool, catalogá-lo de doença, e atirá-lo para um Serviço de Urgência, ao mesmo tempo que nas comunidades se passa para o outro lado da rua quando se tropeça num bêbado e se alegam liberdades para que cada um faça da sua vida o que quiser. O Islão não é de intrigas. O álcool é uma abominação de Satanás. Proíbe-o e condena os seus prosélitos ao Tártaro (Alcorão 35:6). Não dá lugar para
um indivíduo fazer o que quer, se prejudica os outros. E os amigos, a família e os vizinhos são responsabilizados se não interferem quando uma pessoa se destrói ou prejudica a sua família.
Aqui tudo cai, desde o desgraçado que faz uma inscrição só para ter acesso a uma refeição, ao doente crónico que prefere este espaço "cosmopolita" ao de uma consulta regular no Centro de Saúde.
Quem tem de se dispersar entre situações críticas e casos sociais, desespera quando estes últimos o distraem das suas primeiras funções.
Este tem sete internamentos. Sete oportunidades deitadas ao lixo nos seis últimos anos. Vindas à Urgência, vinte e três.
Entretanto a idade não perdoa e outras maleitas já se lhe juntaram, deixando os médicos na indecisão de uma outra estar a dar sinal, pelo que lhe vão fazendo análises a tudo e mais alguma coisa, sempre que aqui entra.
Forço-me a justificar a Alta à pobre da mulher que não sabe lidar com a situação e se agarra ao que vê à mão. Sugiro-lhe que recorra ao Serviço Social da sua área de residência, falo-lhe dos "Alcoólicos Anónimos", dos filhos que estão emigrados, até do padre da freguesia. Entra-lhe por um ouvido e sai-lhe pelo outro. Ainda penso em contemporizar, mas é dinheiro do Estado deitado fora. Ter este poder de dar o que não é nosso, dá mais responsabilidade. Caridade com o que é dos outros, qualquer um faz. Mas Caridade não é dar o osso ao cão. Caridade é partilhar o osso com o cão, e eu não estou aqui para substituir a Santa Casa.
- Minha senhora! O seu marido tem Alta. Leva medicação e uma carta para o médico de família!, afirmo, na tentativa de me ver livre deste problema que me retém, muito para além do desejável.
- O Sr. Dr. é que sabe! Mas se ele amanhã não estiver melhor, eu trago-o outra vez, que ele precisa de descansar o fígado!
...
E, nem de propósito, quando chego à maca onde o Sr. José aguarda a decisão, ele inicia uma crise convulsiva.
- Ai Jesus! Sr. Dr.! Ai que ele morre! Valha-me Nossa Senhora de Fátima! ....
Agora são dois em vez de um. Ela com uma crise histeriforme, ele a espumar no caminho para a Sala de Emergência.
...
- Dr.! A esposa do Sr. José está muito sentida consigo!, avisa-me a enfermeira.
- Deixe-a estar! Por favor, diga-lhe que o Sr. José, agora vai ficar cá na Sala de Observações, pelo menos até amanhã! E que pode ir embora! Veja se me poupa a mais um debate argumentativo, que eu já gastei o latim que trazia para hoje. Ela não vai entender que o tempo que demoraram todos os exames, mais o tempo que esteve na SUB que o referenciou, é suficiente para desencadear um síndrome de abstinência, no caso um "rum fit"
quinta-feira, 23 de novembro de 2017
segunda-feira, 20 de novembro de 2017
As palavras que não disse
Fui educado no respeito pelo outro e num ambiente em que se devem procurar as explicações para todos os fenómenos com que a natureza nos surpreende. Cedo desvalorizei a importância do Deus que me foi presente nos primeiros anos de escola, talvez por não ter sido assombrado com as situações dramáticas que afligiam (e afligem) grande parte da população de Portugal e do Mundo. Custa-me, pois, aceitar “orações” e “mortificações” a solicitar a intervenção divina em nosso favor e as práticas de um clero que, frequentes vezes, ao longo da História, tudo fez para manter o poder dos poderosos, por temer que a “heterodoxia” pusesse um fim à “ordem” que assumiam como única possível.
Até ao meu meio século de vida, sempre acreditei que o Homem é “bom por natureza” e toda a maldade que é capaz, tem origem nas circunstâncias em que é colocado e, nesse sentido, tendi a classificar-me como um “Humanista pouco convicto”, pois sempre recusei a pô-lo no centro de toda a vida neste planeta.
As novas religiões (que se apelidam a si próprias de Ideologias) – o Liberalismo, o Comunismo, o Capitalismo, os Nacionalismos e o Nazismo, apesar dos esforços missionários sem paralelo e das guerras mais sangrentas da História, também não me conseguiram converter, deixando-me sem sentido de pertença.
Quem viveu em sociedades fortemente marcadas pela adversidade, e não sentiu soluções para as provações que o acaso lhes pôs no caminho, optou, quase obrigatoriamente, por um Deus e por intermediários humanos, para agradecer as vitórias mais significativas da vida e para ter a quem recorrer nas aflições.
O Humanismo, a religião a que todos agora querem pertencer (mesmo que professem outras), quer que seja o Panteão (familiar ou colectivo) a dar as directivas à sociedade, mas, quando toda a população tem smartphones, já poucos perguntam orientações aos deuses ou à memória dos antepassados. As dúvidas são colocadas ao Mr. Google e os pedidos de ajuda ao Facebook. O relacionamento é feito “on line” e são raros aqueles que se reconhecem pelo cheiro da pele.
Os mais velhos lembram as “velhas glórias” enquanto os jovens viajam no mundo virtual dos novos deuses “made in” Silicon Valley, seguindo-lhes os gostos e objectivos que os fazem acreditar no Dataísmo, que mais não é que um Fé cega nos dados que o Mr. Google e as redes sociais fornecem, e que já constitui a nova religião do século XXI.
Até ao meu meio século de vida, sempre acreditei que o Homem é “bom por natureza” e toda a maldade que é capaz, tem origem nas circunstâncias em que é colocado e, nesse sentido, tendi a classificar-me como um “Humanista pouco convicto”, pois sempre recusei a pô-lo no centro de toda a vida neste planeta.
As novas religiões (que se apelidam a si próprias de Ideologias) – o Liberalismo, o Comunismo, o Capitalismo, os Nacionalismos e o Nazismo, apesar dos esforços missionários sem paralelo e das guerras mais sangrentas da História, também não me conseguiram converter, deixando-me sem sentido de pertença.
Quem viveu em sociedades fortemente marcadas pela adversidade, e não sentiu soluções para as provações que o acaso lhes pôs no caminho, optou, quase obrigatoriamente, por um Deus e por intermediários humanos, para agradecer as vitórias mais significativas da vida e para ter a quem recorrer nas aflições.
O Humanismo, a religião a que todos agora querem pertencer (mesmo que professem outras), quer que seja o Panteão (familiar ou colectivo) a dar as directivas à sociedade, mas, quando toda a população tem smartphones, já poucos perguntam orientações aos deuses ou à memória dos antepassados. As dúvidas são colocadas ao Mr. Google e os pedidos de ajuda ao Facebook. O relacionamento é feito “on line” e são raros aqueles que se reconhecem pelo cheiro da pele.
Os mais velhos lembram as “velhas glórias” enquanto os jovens viajam no mundo virtual dos novos deuses “made in” Silicon Valley, seguindo-lhes os gostos e objectivos que os fazem acreditar no Dataísmo, que mais não é que um Fé cega nos dados que o Mr. Google e as redes sociais fornecem, e que já constitui a nova religião do século XXI.
segunda-feira, 13 de novembro de 2017
Tomara Que Chova
Tomara que chova,
Três dias sem parar,
Tomara que chova,
Três dias sem parar.
A minha grande mágoa,
É lá em casa
Não ter água,
Eu preciso me lavar.
De promessa eu ando cheio,
Quando eu conto,
A minha vida,
Ninguém quer acreditar,
Trabalho não me cansa,
O que cansa é pensar,
Que lá em casa não tem água,
Nem pra cozinhar.
sexta-feira, 10 de novembro de 2017
domingo, 5 de novembro de 2017
Workshop
A sala está composta. O público fora convidado com a devida antecedência e pressionado a comparecer. À hora marcada a plateia impacienta-se para ouvir os truques e malabarismos da modernidade de uma luminária que vem da capital.
Lisboa é longe e os caminhos da periferia são demasiado sinuosos para quem está habituado a grandes avenidas. Passa uma hora quando chegam as eminências, seguidas pelo mágico e suas “partenaires”. Uma é loira, outra é morena, como os dois amores do Marco Paulo.
Feitas as apresentações e respetivas vénias, dá-se início ao espectáculo.
É a vez do artista. Rapaz novo, gaba-se do que fez e do que quer fazer. Dois passos para a esquerda e um à direita e ... Zás – à primeira pernada para trás, quem estava em cima passa para baixo e os da esquerda vêm-se agora no centro ou à direita. Pim! Já está!
Quem não se moveu espanta-se!.
Apronta-se de seguida para o segundo número, directamente dirigido ao coração da audiência. Fala sobre a ansiedade de querer e não saber por onde anda a família. Ligar para o telemóvel e não obter resposta! ... Três passos para a frente e uma para o lado e Zás! ... !! O público, baralhado, a tentar sintonizá-lo. Mais um passo em frente e ... Trás, Catrapaz!, e a estrela aponta o dedo a um paisano: - “- Você!”, depois a outro “- E você!?”, há que ouvir sentimentos e frustrações e prometer soluções! …. PUM!
Feitas as apresentações e respetivas vénias, dá-se início ao espectáculo.
É a vez do artista. Rapaz novo, gaba-se do que fez e do que quer fazer. Dois passos para a esquerda e um à direita e ... Zás – à primeira pernada para trás, quem estava em cima passa para baixo e os da esquerda vêm-se agora no centro ou à direita. Pim! Já está!
Quem não se moveu espanta-se!.
Apronta-se de seguida para o segundo número, directamente dirigido ao coração da audiência. Fala sobre a ansiedade de querer e não saber por onde anda a família. Ligar para o telemóvel e não obter resposta! ... Três passos para a frente e uma para o lado e Zás! ... !! O público, baralhado, a tentar sintonizá-lo. Mais um passo em frente e ... Trás, Catrapaz!, e a estrela aponta o dedo a um paisano: - “- Você!”, depois a outro “- E você!?”, há que ouvir sentimentos e frustrações e prometer soluções! …. PUM!
Tanta eloquência faz pasmar o mais pintado! É uma sumidade! Um mestre da comunicação! Pena o auditório só ter umas dezenas de lugares, e não um púlpito como o das Nações Unidas, porque ele … traz "UMA SOLUÇÃO À PROCURA DE UM PROBLEMA!"
Agora, depois de ter criado "O PROBLEMA", inicia novo passe de mágica e pede às partenaires que se levantem. A assistência hesita em bater palmas. São lindas e sorridentes, embora constrangidas, talvez por não se terem preparado para aquele número.
Finalmente o artista aproxima-se do "PROBLEMA" como quem salta para uma corda suspensa bem acima do estrado e bamboleia num equilíbrio, cada vez mais difícil.
Fala de “PopUps”, de PEM, do triângulo doente – farmacêutico – médico. De uma lei que já está promulgada e que a todos espanta. Por fim vacila quando um pequeno burburinho se levanta e se apercebe que há gente a sair “à formiga”. É salvo pelo intervalo.
Não houve apoteose, mas pouco lhe importa, que o cachet está garantido!.
Racionalizará: “-Esta gente da aldeia não entende os “Big Data”, nem as novas tecnologias!” e continuará convencido que caminha “para frente!”, porque em frente é sempre para onde estiver voltado, se não sentir oposição de quem gere o dinheiro dos impostos!
sábado, 4 de novembro de 2017
Kickboxing
Quando o conheci, já estava entrado na vida. Era irmão de um companheiro de trabalho e abrira recentemente um Ginásio, que era assim que, na altura, se denominava um "Fitness Center". Basicamente, ele tinha alugado uma garagem e dispusera, ao longo das paredes, uma meia dúzia de máquinas e halteres.
- Dr.! Tem de lá ir! Aquilo está cinco estrelas! Tem tudo! E, ainda por cima, fica a dois passos de sua casa! Insistia o colega, inconformado com as minhas repetidas recusas.
A curiosidade matou o gato e, também, para o não ter que o ouvir mais outras tantas vezes, dei por mim a justificar umas idas com a vida sedentária e, durante não mais de um mês, fui levantar pesos, puxar cordas e correr numa bicicleta estática.
Os clientes, àquela hora tardia, eram poucos. O habitual era eu só ter de partilhar os suores com o dono do Ginásio, que levava a vantagem de um dia inteiro a dar forma ao corpo, uma vez que era esse o primeiro objectivo daquele espaço, com poucas intenções a ganha-pão.
Eu entrava pelas 19:00h, quando o seu treino, era marcado por períodos de grande intensidade, a preceder o ciclo final de relaxamento.
Era um homem alto, de farto cabelo encaracolado mas, ao contrário do que seria de esperar, escasso de carnes. O Ginásio era o seu investimento para uma tão desejada alteração do aspecto físico. Fazia os exercícios em frente a um grande espelho, onde se media, na esperança de ver um músculo que lhe lembrasse um Rambo, um Schwarzenegger ou, no mínimo, um Mickey Rourke. O rosto afogueado e a camisola empapada assinalavam o empenho que punha na obra.
De vez em quando, a esposa, solidária, animava o espaço com música, enquanto corria no tapete, ou dava ordem ao material, para o dia seguinte. Era uma rapariga pouco faladora, pequena, bonita e de sorriso agradável. Vestia um fato de treino justo que lhe acentuava o corpo musculado e facilitava a agilidade felina com que discretamente se movia. Era uma luz no escuro daquela garagem a interrogar os porquês de uma garça se unir a um escadote cabeludo com pretensões a urso da floresta.
Da última vez que lá fui, ele treinava “kickboxing”, saltando em redor do saco de boxe pendurado do tecto, desferindo-lhe murros, pontapés e joelhadas. O cabelo desgrenhado escorria suor, a T-shirt vermelha totalmente colada ao corpo, criava um riacho que lhe descia pela costura mediana dos calções.
Entrei sorrateiro, e dei as Boas-noites! O atleta deu mais uma série de socos, como a mostrar todo o potencial daqueles ossos mal forrados, e respondeu:
- Boa noite! Dr.! Bem-vindo! Já não estava a contar consigo. Comece ali pela bicicleta, para aquecer! Dez minutos! Enquanto eu acabo o meu treino de hoje!
- Esteja à vontade! Que eu faço o programa do dia anterior e não vou necessitar de ajuda!
Tirou as mitenes das mãos, cumprimentou-me e voltou ao saco para mais umas dúzias de enérgicos socos e pontapés. Minutos depois, já com a toalha ao pescoço e garrafa de água na mão, olhou para as minhas dificuldades e decidiu-se por uns conselhos.
- Dr.! Tenho ali umas latas de produto que fazem maravilhas! Têm a força da proteína. O Dr. também devia tomar! Eu agora tomo-as para ganhar volume mas, daqui a três meses, vou ter de começar com outras para obter definição!
Parei de levantar os pesos.
- Obrigado! Eu não pretendo entrar em concursos! A ideia é compensar o muito tempo à secretária. Com um jogo de futebol de cinco, à sexta e uma hora aqui à terça, se fugir às jantaradas, talvez chegue aos oitenta a tomar conta de mim! respondi, a evitar um discurso técnico, que se oporia radicalmente ao seu objectivo, e que não teria qualquer eficácia naquele ambiente.
Retomei os halteres para mais uma série de braços, cumprindo o plano colado numa das paredes, e o meu “personal trainer” voltou ao kickboxing, para um final apoteótico de sopapos e pernadas, no meio de gritos, impropérios e Uuuhhhs, em crescendo, até, em plena exaustão física e num climax exaltado, gritar na direcção do seu reflexo no espelho:
- Eu quero ficar um BOOOOOIIIIIIIIIIiiiiiiiiiiiiiiii !!!!!!!!!!! … Eu quero ficar um BOOOOOIIIIIIIIIIiiiiiiiiiiiiiiii !!!!!!!!!!!
…
Creio que Deus o não ouviu e eu, talvez com medo do contágio, pus fim à minha experiência de culturista amador!
sábado, 28 de outubro de 2017
Acrocianose ?
Tem 34 anos. Está grávida de vinte e quatro semanas e há dois dias que nota as unhas e as pontas dos dedos azuis, com agravamento nocturno.
Veio ao Serviço de Urgência e, na Triagem de Manchester, é referenciada, com cor Amarela, para Obstetrícia. Tem sinais vitais normais e está tudo bem com o bebé. Exame ginecológico normal. Ecografia normal. Cardiotocografia normal. É pedida observação por Medicina Interna.
Está consciente e colaborante. Nega conhecimento de qualquer doença crónica. Tem as unhas das mãos e extremidade distal dos dedos com tom azulado, sem sinais de hipoperfusão sanguínea. Nega agravamento com o frio. Tem as unhas e a extremidade distal dos dedos dos pés com coloração normal.
- Minha senhora! A senhora não pintou as unhas de azul?
- Não! Pintei-as há uma semana, e usei um verniz branco!
- Vamos ter de limpar uma unha, para ver o que acontece! Mas vai ter de esperar uma hora, porque não há acetona no Serviço de Urgência e o Armazém só abre às 14:00h!
Está acompanhada por uma filha adolescente, que já mostra sinais de impaciência. Sai, inconformada, enquanto eu faço os registos no computador.
Nem cinco minutos depois, bate à porta do consultório.
-Dá licença!?
- Faz favor! Então que há de novo?
- A Dra. deixou-me a pensar e, de facto, anteontem à tarde, estive a lavar um édredon azul e foi só à noite que a minha filha notou que eu tinha as unhas azuis. No dia seguinte de manhã, elas estavam mais clarinhas. Mas o édredon não ficou bem lavado e voltei a lavá-lo! Agora, como me disse que ia esperar tanto tempo pela acetona, pedi à enfermeira um pouco de gaze e lavei os dedos com álcool, água quente e sabão e raspei uma unha. Desapareceu tudo! …. Posso ir embora?
sábado, 14 de outubro de 2017
Carta aberta ao Diabo
Caro Diabo:
Há tempos que te aguardava, mas confesso que te esperava sob a forma de uma crise económica e não pela mão de um processo judicial.
Tu és mesmo maligno! Está a gente a olhar para um lado e tu apareces do outro! A realidade atraiçoa-nos sempre!, e só podes ser tu a dar voltas ao Destino para que tal aconteça. Eu, que sou ateu, tinha rezado aos deuses de todas as religiões para que o José Sócrates fosse culpado e que a nossa Justiça não fosse tão má que incriminasse um primeiro ministro (repetidamente reeleito secretário-geral do PS com maiorias a rondar os 90% dos votos), sem uma base extremamente sólida mas, agora com as notícias recentes que o envolvem com a Portugal Telecom e o BES, fico sem jeito a pensar que gastei todas as Salvé-Rainhas e Pai-Nossos no lado errado. É que, a ser verdade, há muito mais gente envolvida que os “cabeças de série” indiciados. Não se faz uma trafulhice destas, que lesa o principal Banco privado nacional e faz vender ao desbarato uma das maiores empresas portuguesas, obrigando os contribuintes a pagar balúrdios, sem a colaboração e a passividade de muita gente!
Cá para mim, quiseste dar a volta ao Passos Coelho. Induziste uns radicais a dar uns tiros, em nome de Maomé, nas zonas turísticas do norte de África, para que tivéssemos um “boom” no turismo e em algumas indústrias e, em vez de vires em 2016, vieste agora com as achas bem acesas.
O que nos vale é que já se fala em dez anos para digerir as 4.000 páginas da acusação, o que dá tempo para chamar bombeiros, máquinas de arrasto, aviões, helicópteros, pôr o SIRESP a funcionar e até dar passos significativos na Lei n.º 76/2017 que altera o Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios.
Esta coisa de comprar o poder político mesmo no topo da hierarquia só podia vir de ti! Dar uns trocos ao Presidente da Junta para calcetar uma rua ou facilitar um pequeno negócio, é mau. Mas dar 24 milhões de Euros a um primeiro ministro, é inclassificável. Está para lá das estrelas! Deves ter envolvido muitos mafarricos na empresa e creio que até passaste umas noites sem dormir. Felizmente que te não lembraste da AutoEuropa. Aí é que era o desastre completo!
És um demónio! Agora que não andas entretido em Grandes Guerras, viraste-te para o crime económico. Já te vejo a entrar pelo ciberespaço a tentar dar cabo de dados de hospitais, grandes empresas e até a interferir com a actividade do vulgar cidadão, por puro gozo malévolo, antes que os novos deuses, “made in” Silicon Valley, ocupem os tronos e nos protejam, desde que lhes paguemos as devidas décimas.
Vê se te conténs! Há mais mundos! Deixa isto aqui acalmar e não fomentes abusos nem greves com reivindicações impossíveis. Tu até tens acesso a outros planetas para as tuas diabruras. Dá espaço para que, aqui na Terra, tentemos um novo estar que poupe o que construímos.
Vai de Retro Satanás! Ou se não quiseres ir de retro, vai noutro meio de transporte, mas vai, que já fizeste estrago que chegue neste país que se diz … Europeu!
Até nunca!
Fernando
domingo, 1 de outubro de 2017
sexta-feira, 29 de setembro de 2017
Manipulação genética em humanos
Eu já esperava uma notícia deste teor.
Era uma questão de tempo, para que se iniciasse a manipulação genética no ser humano. O princípio do que virá a ser uma das principais áreas de negócio do futuro.
Começa-se por tratar um defeito genético ainda no ovo ou até no óvulo ou no espermatozoide, e vai-se por aí afora.
Amanhã, quem tiver recursos económicos, não vai querer que seja o acaso a definir qual espermatozóide irá fecundar qual óvulo. Vai querer ter a certeza que os gametas têm qualidade e que não transportam qualquer gene que possa comprometer o futuro do novo ser e, se possível, que tenha todos os que entendemos como benéficos para o sucesso social – ser alto, louro, ter olhos verdes e, uma especial apetência para as ciências abstratas, pois é nelas que se irão centrar os novos investidores.
Foi na China que se deu este primeiro passo e não nos USA., por ali não haver a mesma pressão ética e por o seu Concelho de Estado ter elegido a investigação genómica como um pilar das suas ambições industriais para o século XXI. As suas empresas habitam uma zona cinzenta entre o sector público e o privado e são abençoadas pelo Banco de Desenvolvimento da China com “milhões” que, a par com o baixo custo de mão de obra, os irá pôr na linha da frente.
Começa-se por tratar um defeito genético ainda no ovo ou até no óvulo ou no espermatozoide, e vai-se por aí afora.
Amanhã, quem tiver recursos económicos, não vai querer que seja o acaso a definir qual espermatozóide irá fecundar qual óvulo. Vai querer ter a certeza que os gametas têm qualidade e que não transportam qualquer gene que possa comprometer o futuro do novo ser e, se possível, que tenha todos os que entendemos como benéficos para o sucesso social – ser alto, louro, ter olhos verdes e, uma especial apetência para as ciências abstratas, pois é nelas que se irão centrar os novos investidores.
Foi na China que se deu este primeiro passo e não nos USA., por ali não haver a mesma pressão ética e por o seu Concelho de Estado ter elegido a investigação genómica como um pilar das suas ambições industriais para o século XXI. As suas empresas habitam uma zona cinzenta entre o sector público e o privado e são abençoadas pelo Banco de Desenvolvimento da China com “milhões” que, a par com o baixo custo de mão de obra, os irá pôr na linha da frente.
A Notícia é de 28/09/2017
Pesquisadores chineses afirmam ter realizado pela primeira vez no mundo uma "cirurgia química" em embriões humanos para extrair uma doença.
A equipe da Universidade de Sun Yat-sen usou uma técnica chamada "edição de base" para corrigir um único erro entre as três biliões de "letras" do nosso código genético.
Eles alteraram embriões feitos em laboratório para extrair a doença talassemia beta. A equipe disse que a experiência pode levar, algum dia, ao tratamento de uma série de doenças herdadas geneticamente.
A técnica altera a construção base do DNA.
A talassemia beta é uma doença do sangue que causa anemia e pode levar à morte. É provocada por uma mudança numa única base no código genético - conhecida como mutação pontual.
Os pesquisadores chineses "editaram” o DNA e trocaram o G (guanina) por um A (alanina) corrigindo o problema.
"Somos os primeiros a demonstrar a viabilidade de curar doenças genéticas em embriões humanos a partir de um sistema de edição de base", disse à BBC Junjiu Huang, um dos cientistas do grupo, e continuou: "o estudo abre novas portas para tratar pacientes e prevenir bebés de nascerem com a talassemia beta, e até mesmo outras doenças hereditárias".
As experiências foram efectuadas com tecidos de um paciente com a doença e através de embriões humanos criados a partir da clonagem.
Revolução genética
A edição de base é um avanço em relação a outra forma de editar genes, a técnica conhecida como Crispr, que já está a revolucionar a ciência.
A Crispr quebra o DNA. Quando a célula tenta consertar a quebra, desactiva uma série de instruções genéticas, e cria a oportunidade de inserir novas informações genéticas.
A edição de base faz com que as próprias bases de DNA se transformem umas nas outras.
O professor David Liu, pioneiro da edição de base na Universidade de Harvard, descreveu o método como "cirurgia química".
Afirma que a técnica é mais eficiente e tem menos efeitos colaterais indesejados do que a Crispr.
"Cerca de dois terços das variantes genéticas humanas associadas a doenças são mutações pontuais. Portanto, a edição de base tem o potencial de corrigir directamente, ou reproduzir para fins de pesquisa, muitas mutações patogénicas".
O grupo de cientistas da Universidade de Sun Yat-sen em Guangzhou (China) foi manchete quando foram os primeiros a usar a técnica Crispr em embriões humanos.
O professor Robin Lovell-Badge, do Instituto Francis Crick em Londres, disse que determinados trechos desse último estudo são "engenhosos", mas também questionou por que não fizeram mais pesquisas com animais antes de irem directamente aos embriões humanos e afirmou que as regras sobre pesquisas com embriões noutros países teriam sido "mais rigorosas".
O estudo, publicado na revista científica Protein and Cell, é o mais recente exemplo da rapidez na evolução da habilidade dos cientistas de manipular o DNA humano, o que está a provocar um debate profundo de ética na sociedade, sobre o que é e o que não é aceitável nos esforços para prevenir doenças.
O professor Lovell-Badge disse que esses métodos dificilmente serão usados clinicamente em breve:
"Serão necessários muito mais debates sobre ética e sobre como esses métodos serão regulados. E, em muitos países, incluindo a China, é necessário ter mecanismos mais robustos para regulação, fiscalização e acompanhamento a longo prazo."
E eu que já ando neste mundo há uns bons pares de décadas, contraponho:
- Se uma coisa pode ser feita, ela irá ser feita. Aqui, ali, às claras ou às escuras!
terça-feira, 19 de setembro de 2017
Pensamentos do Dia
“The whole problem with the world is that fools and fanatics are always so certain of themselves, and wise people so full of doubts.”
Bertrand Russell
Não é preciso acreditar em deuses ou mitos, desde que se saiba que as certezas são temporárias e não absolutas. O único conceito absoluto é que nada é absoluto!
O problema surge quando, carregados de dúvidas, ficamos paralisados e não vamos a lado nenhum.
Não é necessário, nem suficiente, nem indispensável, ser fanático para se ter uma certeza suficiente para resolver os problemas que se nos deparam.
António Gomes
segunda-feira, 11 de setembro de 2017
Querer
Razão tinha o Eusébio. Não basta querer. É preciso querer Querer! ... Acreditar! Ter Fé! ... Na vitória de um jogo, no sucesso de uma empreitada, no futuro da Humanidade ou na Vida Eterna, ... Amén!, Mesmo quando nos bombardeiam com histórias mal contadas ou com soluções inviáveis, é preciso ter Fé, pois são os Deuses, os Mitos e as Crenças, que dão oportunidade ao Acaso e tornam o Incerto possível .
...
Mal de quem tem dúvidas, onde a maioria tem certezas infundadas!
segunda-feira, 4 de setembro de 2017
quarta-feira, 23 de agosto de 2017
Dores
Há a dor física, a dor moral e a dor de antever uma grande dor.
Há quem se previna e quem a aguarde.
Há quem viva dela e para ela.
E há quem a tente ignorar.
Há os médicos, os deuses, os santos e os psicólogos.
E há ... o Marcelo para as dores de Telejornal.
Uns curam ou ajudam. Outros ... agravam!
São tantas as dores e tantos os graus com que se sentem,
que não há remédio, que a todos alivie!
…
Triste de quem der um “ai” sem achar eco em ninguém!
domingo, 13 de agosto de 2017
Cruela DeVil
Abriu a porta, levantou a cabeça e mediu o palco. Hoje, qual Glenn Close, encarnava Cruela DeVil.
- Dr.! Não pode ser! A sua decisão fez adiar uma reunião im-por-tan-tí-ssi-ma! Veio gente de fora, que teve de ir embora! Não pode ser!
O visado, sentiu o gelo daquela voz de aranha arrepiar-lhe a pele e, qual dálmata encurralado numa viscosa teia, titubeou, a medo, uma desculpa, que rápido despertou um sorriso nos grossos lábios da malévola.
Era uma artista que se perdera naquela profissão. Tinha a “dramatização” nas veias e, se identificava ineficiências, não desperdiçava a oportunidade para se agigantar, na procura da importância que não tinha. O seu papel preferido era o de Iago, por salas e corredores, chilreando historietas confabuladas, na ilusão de, um dia, o mundo girar em seu redor.
Roger Dearly repetiu desculpas e o escasso público suspendeu a respiração ao sentir que a catarse daquela "Cruela de mão na anca", salpicava de fel as paredes da pequena sala.
Temeu-se que o drama terminasse em tragédia. Mas seguiu-se um silêncio e, do nada, cresceu uma música, e a maior vilã do mundo animado, não encontrando nem Jasper nem Horácio disponíveis, levantou o mento, meteu na boca a cigarrilha, virou costas e desapareceu no corredor, numa nuvem dardejante de coriscos!.
Uffff!!!!!!
Uffff!!!!!!
Cruella Devil, Cruella Devil,
A coisa mais rara é vê-la gentil,
Ao vê-la sinto logo um arrepio
Cruella, Cruella Devil
Ao vê-la você pensa que é o diabo
O diabo disfarçado de mulher
Você vai confirmar, pois ela vai mostrar
Que ataca como um animal qualquer
É uma vampira querendo sugar
Deviam prendê-la e nunca soltar
O mundo era bonito até que viu
Cruella... Cruella Devil
quarta-feira, 2 de agosto de 2017
domingo, 23 de julho de 2017
Fake News
"Você tem razão, mas não a tem toda, e a pouca que tem não lhe serve para nada", é uma frase que li, há décadas, no "Filomeno" de Gonzalo Torrente Ballester, e que me persegue desde então.
A verdade absoluta não existe.
Mesmo que consigamos uma aproximação significativa a um facto, se formos obrigados a descrever as suas causas próximas e remotas, seremos traídos pela nossa experiência que nos orienta a atenção e nos faz ignorar fenómenos que outros considerariam prioritários.
Quem luta a todo o transe por defender o seu "status quo", vai considerar todos os diferentes olhares, como "fake news", quer elas o sejam ou não, chame-se ele Trump, Erdogan ou Maduro, personagens caracterizados por uma brutal falta de plasticidade.
Nos Tribunais, a "Verdade" é ditada por um Júri ou por um Juiz, mas o que fica na História é ditado pelos vencedores, numa mistura de "fake news" com "true news", associadas a um agressivo apagão dos registos dos vencidos, para que a "sua verdade" ganhe os contornos de absoluta.
Sempre assim foi e, só nos últimos anos, com o aumento da literacia das populações e o advento da tecnologia digital, é possível reescrever muita da História, analisar as consequências das opções dos vencedores e teorizar sobre a importância das soluções dos "galileus" derrotados.
Talvez assim, possamos evitar os erros dos que consideram o Homem o centro de toda a Vida e a nossa "Cultura" a única passível de dar felicidade aos vindouros.
A ver vamos! "Como diz o cego"!
quarta-feira, 19 de julho de 2017
A pagela
- Sr. Manuel! A doença parece estar a ser debelada. A febre alta passou e você já se sente melhor!
- Então, vou ter alta hoje?
- Talvez amanhã, que ainda faltam as análises que confirmam o diagnóstico, pois são elas que irão definir o tempo de tratamento, para que não haja recidivas! … Você agora até está de férias!
- Antes fossem férias! Eu ainda sonho em voltar à Venezuela!
- Tem saudades do Nicolás Maduro?
- Nem me fale nesse tipo! Não passa de um condutor de autocarro a mando do Diosdado Cabello. Esse é que tem os cordelinhos na mão! Vivi lá 37 anos. Decidi vir embora porque o negócio ia de mal a pior e a insegurança crescia todos os dias. No último ano, roubaram-me um camião de transporte e tive de pagar, pelo de resgate, metade do seu valor. Assaltaram-me em casa, amarraram-me, juntamente com a mulher e as minhas filhas e roubaram-me o que puderam. Só em dinheiro foram mais de 10.000 Euros. Foi então que vendi a padaria. Mas ainda lá tenho um restaurante e a casa, à espera de melhores dias.
- Vai ser difícil aguentar aquela política! O homem está cada vez mais isolado! É uma questão de tempo!
- Ouça-o Deus!
- Sr. Manuel! Você invoca o divino para as coisas da política, mas para a saúde, parece confiar mais na intervenção do Dr. José Gregorio Hernández!
- É verdade! Tenho muita fé nele e sempre que chego à Venezuela, vou a Guacara agradecer, junto a sua estátua, tudo o que ele me tem ajudado na saúde. Ele lá é conhecido como o médico dos pobres. Até lhes pagava os medicamentos do seu próprio bolso! O Dr. conhece-o!?
- Não!
- Tem uma história de vida muito parecida com a do Dr. José Gregório e também tem uma estátua em Lisboa, rodeada por ex-votos dos que lhe atribuem curas milagrosas. Só que este não pode ser santificado por se ter suicidado. O Dr. José Gregório, dentro do azar (foi atropelado pelo primeiro automóvel que apareceu em Caracas), teve mais sorte, e está a caminho da beatificação.
Concordo consigo! Homens como estes que puseram a ciência ao serviço das comunidades mais desfavorecidas, merecem veneração! Mas duvido da sua capacidade de intervenção nas doenças actuais. Até porque, no tempo deles, não se conheciam a maior parte das soluções que agora dispomos. Olhe que a Penicilina só ficou disponível, como fármaco, em 1941!
...
domingo, 16 de julho de 2017
Elvirinha
- Os tempos eram outros! Havia os bailes para a gente casadoira se encontrar, mas nem todos tinham essa possibilidade ou dotes que o fizessem valer.
O meu pai era caixeiro viajante, quando se apaixonou pela minha mãe.
Impedido de lhe chegar ao coração pela presença física, decidiu enviar-lhe diariamente, das terras por onde ia passando, um postal ilustrado. Hoje Penafiel, amanhã Marco de Canaveses, Felgueiras, Fafe e por aí fora. Todos os dias, semanas seguidas. No fim, assinava: - Manuel!
Um dia, em que se assegurou que ela estava em casa, sem os pais, tocou à campainha e apresentou-se: "Sou o Manuel!"
Depois, casaram, tomaram conta da empresa, tiveram oito filhos e foram muito felizes!
O meu pai era caixeiro viajante, quando se apaixonou pela minha mãe.
Impedido de lhe chegar ao coração pela presença física, decidiu enviar-lhe diariamente, das terras por onde ia passando, um postal ilustrado. Hoje Penafiel, amanhã Marco de Canaveses, Felgueiras, Fafe e por aí fora. Todos os dias, semanas seguidas. No fim, assinava: - Manuel!
Um dia, em que se assegurou que ela estava em casa, sem os pais, tocou à campainha e apresentou-se: "Sou o Manuel!"
Depois, casaram, tomaram conta da empresa, tiveram oito filhos e foram muito felizes!
quinta-feira, 13 de julho de 2017
Nossa Senhora de Fátima
- Sr. Dr.! Os meus pais iam à igreja ao domingo e cumpriam os
rituais nos dias santos. Trabalhavam de sol a sol para tratarem dos campos e
dos animais e para juntar algum para o caso de surgir uma desgraça. Não eram pobres,
mas estavam longe de poder dizer que viviam desafogados.
O que poupavam, à boa maneira do Minho, era para comprar ouro
ou algum terreno a um vizinho, mais que para qualquer luxo na casa.
Um dia, a minha mãe adoeceu e, temendo morrer sem ver os filhos criados, apegou-se a Nossa Senhora de Fátima e
prometeu-lhe um dos cordões de ouro que já vinha de família.
Dias depois ficou boa e com aquela promessa para pagar. Mas a vida não lhe permitia folgas e uma ida a
Fátima, naquela altura, era uma dificuldade que não conseguia ultrapassar, por
causa da muita coisa que dependia deles. Então, um dia foi ao pároco da terra perguntar se ele lhe fazia o favor de entregar o cordão em Fátima, de uma vez que lá fosse.
O padre respondeu-lhe que tanto fazia coloca-lo
aos pés da imagem de Nossa Senhora que estava em Fátima, como aos pés da imagem
de Nossa Senhora que estava na igreja da freguesia, pois ela era a mesma, quer
aparecesse aqui ou ali.
Com o espírito prático que sempre lhe conheci, o meu pai foi a uma loja de artigos religiosos, comprou uma Nossa Senhora e, quando chegou a casa, disse à minha mãe: - Dá o cordão a esta Nossa Senhora e assim, se
um dia precisares, pede-lho, que, de certeza, ela to empresta!
quarta-feira, 12 de julho de 2017
Eucaliptos
Os eucaliptos são árvores de folha perene e de grande porte (podem atingir os 80 metros). São pouco exigentes no que respeita ao clima e à fertilidade do solo - toleram bem todos os tipos de solo, com excepção dos calcários. São resistentes a pragas e produzem madeira de alta qualidade.
Existem em todo o mundo cerca de 600 espécies diferentes. O Eucalyptus globulus, introduzido em Portugal em meados do século XIX, é a mais comum e economicamente importante. É originária da Tasmânia e Austrália, onde os bombeiros a apelidaram de árvore-gasolina
A sua principal utilização é na produção de madeira para pasta celulósica. As suas flores são procuradas pelas abelhas para produção de mel e as folhas possuem um óleo - cineol ou eucaliptol - a que se atribuem propriedades balsâmicas e antissépticas, pelo que muitos as usam em infusões, rebuçados, ou para inalação, contra bronquites e catarros.
Como a madeira tem múltiplos usos, durante o ciclo produtivo, podem ser feitos sucessivos cortes para diferentes propósitos. Com quatro ou cinco anos o insumo serve para produção de carvão, lenha e estacas. Entre oito e nove, para celulose e postes. Já ao final do desenvolvimento, dos 12 aos 15 anos, é indicado para serração e laminação.
O problema surge quando os proprietários de áreas vizinhas a florestas de eucaliptos se queixam dos prejuízos com os danos causados pelo sombreamento, queda de galhos e risco de incêndio e o direito de propriedade colide com os direitos de vizinhança, pois a propriedade deve ser usada de modo a permitir uma pacífica convivência social.
A lei prevê que os proprietários ou arrendatários cumpram distâncias mínimas e coimas até a solução da desconformidade.
O nº 2, do artigo 1366º do Código Civil, regula, de modo especial, a plantação ou sementeira de eucaliptos, acácias e outras árvores igualmente nocivas.
No artigo 1º do Decreto-lei nº 28039, de 14 de Setembro de 1937, afirma-se que é proibida a plantação ou sementeira das espécies arbóreas, acima referidas, a menos de 20 metros de terrenos cultivados e de 30 metros de nascentes, terras de cultura de regadio, muros e prédios urbanos.
O Decreto-Lei n.º 17/2009, de 14 de Janeiro, no nº 2 do Artigo 15º , refere:
“Os proprietários, arrendatários, usufrutuários ou entidades que, a qualquer título, detenham terrenos confinantes a edificações, designadamente habitações, estaleiros, armazéns, oficinas, fábricas ou outros equipamentos, são obrigados a proceder à gestão de combustível numa faixa de 50 metros à volta daquelas edificações ou instalações, medidos a partir da alvenaria exterior da edificação,....”
Se as medidas de gestão de combustível não forem cumpridas, tal facto deve ser comunicado à Câmara Municipal pelos interessados e “Em caso de incumprimento do disposto nos números anteriores, a Câmara Municipal notifica as entidades responsáveis pelos trabalhos.”
Os números seguintes do Artigo 15º explicitam os procedimentos a adoptar para que a gestão de combustível seja feita, mesmo que de forma coerciva.
Artigo 19.º Depósito de madeiras e de outros produtos inflamáveis. 1: - ... 2: - Durante o período crítico só é permitido empilhamento em carregadouro de produtos resultantes de corte ou extracção (estilha, rolaria, madeira, cortiça e resina) desde que seja salvaguardada uma área sem vegetação com 10 metros em redor e garantindo que nos restantes 40 metros a carga combustível é inferior ao estipulado no anexo do presente decreto-lei e que dele faz parte integrante.
Há estudos que permitem classificar a propensão para o incêndio nas florestas, de acordo com a seguinte ordem decrescente: florestas de pinheiros-bravos, florestas de eucaliptos, florestas de folha larga não especificada, florestas de coníferas não especificadas, montado de sobro, florestas de castanheiros, florestas de azinheiras e florestas de pinheiros-mansos;
O Vidoeiro ou Bétula (Betula pendula) é considerada a árvore-bombeiro! Quando o fogo entra no vidoal, normalmente arde por manchas e com chama muito curta, extinguindo-se.
A reforma florestal vai ser votada no próximo dia 19 de Julho.
terça-feira, 4 de julho de 2017
domingo, 2 de julho de 2017
Wishful thinking
Wishful thinking é uma expressão idiomática inglesa que significa tomar decisões ou seguir raciocínios baseados em desejos, em vez de em factos ou na racionalidade.
Basicamente é uma "fé" em que não hão-de surgir grandes problemas ou, se eles surgirem, havemos de desenrascar uma qualquer solução e tudo irá acabar bem.
Do mestre de obras ao Ministro, há sempre alguém disponível para liderar um projecto que nasce coxo e com fracas possibilidades de se acertar.
O resultado destas lideranças depende da sorte de não lhe surgirem problemas que revelem toda a fragilidade decorrente do incumprimento de normas elementares.
Ele são médicos que assumem chefia de Serviços sem garantirem os meios necessários para a correcção dos erros sistemáticos de que têm conhecimento prévio à sua tomada de posse, são Ministros que dizem assumir a responsabilidade política por erros de gestão gravíssimos de Instituições a quem é pedido a máxima competência, mas que só se mostram "agressivos" na sua correcção, quando a disfunção lhes bate à porta, etc...
Aqui, "Chico-esperto" com historial de corrupção concorre e ganha nas Eleições autárquicas, o amigo do Partido recebe a paga pelo envolvimento eleitoral, o filho do cacique entra nas Instituições por mãos travessas e quando chega o verão lamentam os incêndios e a falta de ordenamento do território e no Inverno o choro de quem vive nas linhas de água ou junto ao mar, atirando responsabilidades para a Natureza ou para as costas uns dos outros, por terem estado enredados com problemas comezinhos, sem qualquer visão de futuro.
Quando se lida com coisas de pouco valor, o "wishful thinking" até funciona, mas quando se trata com a vida das pessoas ou com património de grande utilidade, todo o cuidado é pouco, para não se ser obrigado a explicações "esfarrapadas" como aquelas que ultimamente temos ouvido sobre a catástrofe de Pedrógão Grande, sobre o roubo de armas de guerra do paiol de Tancos ou para desvalorizar a falta de monitorização das curvas de aprendizagem!
Pouca gente com mérito se disponibiliza para assumir responsabilidades quando lhe restringem, não só o orçamento, como o poder para alterar procedimentos, se uma Instituição necessita de modernização e racionalização de recursos.
É esse o espaço para os arrivistas do "wishful thinking" e do "fizemos tudo quanto era possível!"
quarta-feira, 28 de junho de 2017
terça-feira, 27 de junho de 2017
Doença mental
1:
29 anos. Refere problemas familiares de longa data. "Os pais querem-no expulsar de casa e insultam-no frequentemente, reclamando os cuidados e gastos que têm com ele!".
Não se sente acarinhado. Refere violência mútua e chamadas para a GNR. Pretende morar sozinho, mas não tem estabilidade económica para tal.
Afastou-se da família. Está descontente com o emprego, porque é muito exigente e os problemas em casa não o deixam concentrar. Terá recebido um alerta para possível despedimento. Descreve relação razoável com os colegas, assumindo algumas divergências como "questões de feitio".
Necessita de medicação para dormir, por causa do cão da vizinha, que faz barulho à noite. Pratica desporto no ginásio.
Diz-se "molestado, traumatizado e desesperançado" porque não o valorizam. Fala em arranjar um advogado para processar a família.
Está colaborante e orientado. Atenção e concentração mantidas. Humor deprimido, com labilidade emocional. Sinais de ansiedade e irritabilidade. Baixa auto-estima. Discurso lógico e coerente, pueril e em fluxo acelerado. Sem alterações do conteúdo do pensamento. Traços de personalidade impulsiva. Nega alterações perceptivas. Sem ideação suicida estruturada.
...
Após umas horas diz-se melhor. Acha que exagerou e que estava a ser injusto com a família.... Quer voltar de novo a trabalhar!
2:
45 anos, solteira. Vive com irmã e sobrinha. Desempregada. Iniciou pedido de reforma. Completou a 4ª classe aos 15 anos e tirou o 9º ano através das Novas Oportunidades.Tem diagnósticos de Oligofrenia leve/moderada e de Perturbação bipolar.
Há 15 dias que se sente "mais nervosa... a falar mais... e com toda a gente. A rir-se muito!...".
A acompanhante nota-a "acelerada e desinibida... com períodos de euforia". Não tem tomado a medicação.
Aspecto minimamente cuidado. Colaborante. Desinibida. Discurso espontâneo e coerente, pobre em conteúdos. Sem evidencia de actividade heteróloga.
3:
68 anos. Viúva. Sem filhos. Vive só. Doméstica. Concluiu a 3ª classe aos 12 anos.
Terá passado a noite a tomar banho e, durante o dia, esteve sempre a "tirar a roupa" e com discurso confuso ... "
A deambular sozinha pelo corredor. Prontamente acompanha-me ao gabinete. Está orientada sorridente e calma, mas facilmente irascível. Impaciente com a insistência das questões. Aspecto minimamente cuidado. Humor alternando rapidamente entre a eutimia e a irritabilidade.
Inicia o discurso em voz ciciada, que evolui para timbre normal.
Discurso tangencial, por momentos incoerente - "eu fui ontem visitar uma pessoa... fechei mal a garrafa... molhei os documentos... fiquei com estes... que meti na parede...".
Pergunto como se ocupa em casa e responde "faço essa camisola que tem vestida... essa bata também".
Reconhece estar no hospital. Assume que se despiu da cintura para baixo e que esteve a tomar banho a noite toda. ... Na minha casinha faço o que quero! ... Estava no jardim e chamei o INEM! ... Não!, ... Chamaram!...".
Por vezes o discurso tem conteúdo de prejuízo: "as minhas vizinhas chamam - ó vaca!, ... querem-me mal!", mas refere "estar sempre bem disposta!".
Sem ideação suicida. Sono irregular. Apetite diminuído com percepção de perda ponderal. Nega consumos etílicos ou tabágicos.
4:
58 anos. Casado. Dois filhos. A atravessar problemas pessoais com a esposa. Em "situação de despejo" da habitação onde reside.
Hoje de manhã terá feito tentativa de suicídio por enforcamento. Há dias que andava a pensar nesta solução para os seus infortúnios.
Apresenta-se com o colar cervical e com alguma dificuldade em falar. Choroso. Humor lábil. Sentimentos de angústia e de desesperança. Ideação suicida não estruturada. Foi já acompanhado por Psiquiatria.
Descreve angústia, irritabilidade, sono fragmentado e anedonia de há um mês. Apetite preservado.
Está colaborante e orientado. Aspecto suficientemente cuidado. Postura adequada. Emociona-se ao falar dos seus problemas actuais. Humor depressivo. Afectos congruentes. Crítica preservada para a situação. Mostra arrependimento perante o gesto realizado. "A minha ideia está fora de questão! ... Arrependido e de que maneira!...".
Nega hábitos etílicos ou tabágicos regulares. Nega toma de medicação regular.
5:
50 anos. Casada, em processo de separação. Tem duas filhas (uma a viver em França).
Trazida ao Serviço de Urgência por comportamentos parassuicidários. Segundo a própria "queria atirar-me aos carros para morrer, porque não tenho para onde ir! ..."
Refere história familiar/social complicada, fornecendo dados pouco consistentes. Diz que foi vitima de violência doméstica por parte do marido e que esteve numa casa abrigo até finais do ano. Nessa altura, e por sua livre vontade, regressou ao domicílio. Entretanto, por dívidas contraídas, a casa teve que ser hipotecada. O marido recusa recebê-la, razão pela qual verbaliza pensamentos de morte.
Está a ter acompanhamento por Psiquiatria, por Perturbação da Personalidade. Já teve dois internamentos psiquiátricos.
Está orientada e colaborante. Bom estado geral. Discurso fluente, lógico e coerente, pobre em conteúdos e muito inconsistente. Humor triste, congruente com a situação vivencial. Sem delírios ou alucinações. Sem ideação suicida estruturada. Juízo crítico preservado.
6:
26 anos. Casado. Vive com a esposa e os três filhos dela e mais a mãe. Tem o 9º ano de escolaridade.
Ontem à noite fez tentativa de suicídio por enforcamento.
Está acompanhado pela esposa. Ambos referem ambiente familiar difícil porque a mãe é muito invasiva e não dá espaço ao casal.
Foi já acompanhado em Psiquiatria por sintomas depressivos, mas faltou à consulta agendada. Ontem, após discussão familiar, foi encontrado pela esposa inconsciente, no monte, com uma corda a dar 3 voltas ao pescoço. Após algumas "compressões" recuperou a consciência e foi trazido ao SU, onde foram excluídas lesões orgânicas.
Segundo a esposa, esta não foi a primeira tentativa de suicídio. Há duas semanas fez alguns cortes nos pulsos com uma faca.
Está orientado e moderadamente colaborante. Postura reservada. Responde apenas quando solicitado, com discurso lógico e coerente, pobre em conteúdos. Sem actividade delirante ou alucinatória. Mantém ideação suicida estruturada.
7:
62 anos. Casada. Três filhos que residem em França.Vive com marido e o pai de quem é cuidadora. Tem a 4º classe.
Trazida ao SU após ingestão voluntária de medicamentos.
Sente-se saturada "de aturar o marido" que "está constantemente a queixar-se de dores de cabeça".
Ontem, após ter regressado da piscina, ingeriu 10 comprimidos, depois de o ouvir queixar outra vez "da cabeça". Diz não ter motivos para viver. Está longe dos filhos e não tem apoio do marido. Pertence ao grupo coral da igreja. Durante a entrevista, atende vários vezes o telemóvel (marido + padre ?).
Aspecto e vestuário muito cuidados e investidos, desapropriados para a sua faixa etária. Postura apelativa, teatral. Discurso coerente e fluente, mas muito circunstancial, focando os seus problemas no marido. Humor eutímico, malgrado referir não "ter motivo para viver". Ligeiramente ansiosa.
Sem actividade heteróloga. Apesar de verbalizar ideias de morte, não apresenta ideação suicida estruturada. Traços de personalidade histeriforme, com conflitos conjugais de longa data.
Está a ser medicada por psiquiatra privado.
Entra-se em contacto telefónico com o marido - Não tem disponibilidade para se dirigir ao hospital. Fica irritada ao sabê-lo. Será um amigo que virá.
8:
32 anos. Solteira. Vive com uma filha menor, após ruptura conjugal. Completou 9º ano, com 2 reprovações. Trabalha num restaurante.
Tem recorrido ao SU por crises ansiosas, com somatizações várias e está medicada com antidepressivos.
Há dois anos que anda mais depressiva, após a saída do companheiro de casa. Afinal está detido por assaltos.
A sua família nunca favoreceu esta relação. Anda receosa e tem medo de ser envolvida nos processos legais do ex-companheiro.
sexta-feira, 23 de junho de 2017
Tartaruga
- Tartaruga! Tartaruga! Tartaruga! Vem cá!
- Tchop!
- Ah! Estás aí! Vem até aqui, à borda do tanque! Então! Como passaste a noite?
- Tchop!
- Sabes uma coisa? No meu emprego andam à cata de quem queira mandar!
- Tchop?!?!
- Verdade! Espera! Não mergulhes já!
quinta-feira, 15 de junho de 2017
A motinha
- E como é que ele vai para casa, após a alta?
- Vai de mota!
- De mota?
- Sim! Quando ele veio para o Hospital trouxe a moto na ambulância e pediu para a gente a guardar na arrecadação do serviço! Há quase um mês que lá está! É uma scooter eléctrica para quem tem mobilidade reduzida. Ele leva-a para todo o lado! Se for preciso, de ambulância! Diz que tem autonomia para 70Km. Embora não possa andar na estrada, ele pôs-lhe uma matrícula e anda por todo o lado na aldeia onde mora.
- E não só! Este, está anos à frente do nosso Hospital, que obriga doentes e funcionários a grandes caminhadas, muitas vezes em situações nada fáceis!
sexta-feira, 9 de junho de 2017
Lembranças do Olimpo (29) - Jeová
Hipólito regressou a casa a matutar no sucesso da história de Jesus. Aquela profecia “maluca” da eminente vinda do Reino de Deus e que Ele iria impor a sua vontade “tanto na Terra como no Céu”, fora capaz de agregar as vontades que visavam igualizar os homens, numa altura em que Reis, Imperadores e Sacerdotes alegavam estreita familiaridade com os deuses, de quem emanava o seu poder. Era ainda esse movimento que, depois de 2.000 anos de voltas e cambalhotas, fundamentava o Humanismo actual. Até à revolução tecnológica do último século, a Igreja Católica estivera na crista da onda do conhecimento, mas desde então passara a andar a reboque, a reagir às novidades, em vez de ser ela a criá-las, sem nunca abraçar os movimentos de igualdade de género ou da defesa dos animais e só muito recentemente, com o Papa Bergoglio, é que parece ter acordado para os grandes problemas ecológicos do Mundo.
Ora estava o médico nestas conjecturas, quando um clarão apareceu por entre as nuvens do fim do dia. Exactamente como vira na banda desenhada dos catecismos. Um céu de fim de dia, com um corredor de luz a espreitar pelas alvas nuvens, por onde um enorme bando de pombas brancas descia, precedendo uma alva figura humana cintilante, com um báculo na mão e uma mitra bordada a ouro, cravejada de esmeraldas. A sua barba branca dava continuidade ao longo cabelo esvoaçante. Ao vê-lo descer na sua direcção, Hipólito abriu as janelas e o deus instalou-se na poltrona do fundo da sala que, de imediato, se transformou num trono recoberto por um baldaquino, muito semelhante ao do Papa no Vaticano.
- Boa noite!, disse-lhe o médico. – Calculo que sejas Jeová! Sê bem-vindo a esta humilde casa!
- Boa noite!, respondeu o deus. – Era para ter vindo mais cedo, mas tenho tido tantos afazeres por esse Universo fora, que o tempo não me chega para nada. Já me arrependi de ter criado o Big-Bang! Quando estava tudo concentrado no mesmo ponto, era mais fácil, agora com o Universo em expansão, o ter de andar do mais infinito para o menos infinito, para lhe dar alguma ordem, é uma canseira das antigas.
- Calculo!, disse o médico. – Mas com tantos afazeres, o que é que te trás até este grão de areia do deserto?
- Nem sei! Ouvi a tua conversa com Jesus e não resisti a propor que me entrevistasses. Como deves calcular, eu tenho muito trabalho organizativo, mas, de vez em quando, gosto de fazer trabalho de campo e ouvir o que a criação a quem atribui livre arbítrio, pensa.
Hipólito embora pouco impressionado, com aquela entrada apoteótica, sentiu-se lisonjeado. Puxou uma cadeira, pediu autorização e sentou-se.
- Antes de mais, quero-Te dizer que é um privilégio receber a Tua visita. Mas era escusado teres investido tanto na encenação da tua entrada. As técnicas de multimédia actual conseguem uma realidade virtual multi-sensorial semelhante. Quanto ao baldaquino, espero que ele seja virtual e não como o da Basílica de S. Pedro, feito com os antigos bronzes do Panteão de Roma que o Papa Urbano VIII mandou derreter.
- Ok!. Disse Jeová. E de imediato toda aquela parafernália desapareceu, para dar lugar a um idoso, bem-humorado, com um cajado na mão, sentado no seu sofá. – Esta tipologia de aparição, está programada desde que entreguei as Tábuas do Dez Mandamentos a Moisés. Como tem funcionado, deixei de me preocupar com a sua actualização. Mas agora, que chamaste a atenção, acho que está na hora de um upgrade! Vou pensar nisso.
Mas vamos à entrevista, que é o que me traz cá. Podes fazer três perguntas, senão eu fico aqui uma eternidade e há coisas que ficam por fazer. Aqui na Terra, o que se não faz no dia de Santa Luzia, faz-se noutro dia, mas no Céu, não há a mesma relação com o tempo e é melhor não deixar para amanhã o que se pode fazer hoje.
Hipólito sorriu ao vê-lo citar, ironicamente, os ditados populares. Depois, endireitou-se na cadeira e fez a primeira pergunta:
- Já que te disponibilizas, gostava de saber a Tua opinião sobre a Cúria, sediada em Roma?
Jeová, deitou a mão à cabeça. – É um grande problema! Cada vez é mais difícil inspirá-los em soluções que lhes dêem credibilidade! Então agora com o Papa Francisco a querer aumentar a componente social da Igreja e o Bento XVI a minar-lhe, sorrateiramente, o projecto defendendo um forte poder central, baseado em abstracções teológicas que consigam unir cada vez mais os fiéis, a coisa está mais difícil.
- Mas Tu não consegues impor uma norma que os convença?
- Não posso, por imperativo organizacional. Decidi que na Terra, o Homem tem livre arbítrio e que Eu só trato dos ambientes, criando dificuldades ou facilidades para ele superar, mas, pelo caminho que estou a ver as coisas irem, ele vai mesmo dar cabo do planeta!.
- E Tu não te importas, tendo-o feito a Tua imagem e semelhança?
- Não! O Jorge Sampaio disse “Há mais vida para além do Orçamento!” e eu digo “Há mais vida para além da existente na Terra!”. Esta forma de vida aqui existente, com base no Carbono, é comum no Universo, embora menos frequente que aquela que tem por base o Silício.
- Já ouvi Zeus falar nessa! Diz que esses seres são mais dóceis e previsíveis que os da Terra. Até se transferiu para um desses planetas!
- Ah! O Zeus! Esteve cá?
- Sim! Desistiu dos projectos na Terra. Agora anda feliz num planeta da Galáxia Adrómeda. Só cá vem arejar o escritório e pouco mais. Mas voltemos aos teus Papas vivos. Apoias algum em especial?
Jeová corrigiu-o. – Não te esqueças que também sou Deus dos Judeus, dos Ortodoxos, dos Protestantes e de muitas outras seitas. Mas como tu estás mais interessado nos Católicos e no que se passa no Vaticano, informo-te que não apoio nenhum deles. Ambos têm razão. O Francisco é mais terra-a-terra, mas a ficção sempre foi mais importante que a realidade e o Ratzinger luta por uma narrativa motivadora, e isso pode ser mais decisivo que resolver pontualmente alguns dos problemas das comunidades onde o clero tem influência.
É esse equilíbrio entre a componente vertical e a horizontal das religiões que é necessário gerir.
- Queres dizer que uma pequena alteração na liturgia católica podia trazer mais benefícios para a Humanidade, que colaborar com os políticos na resolução dos problemas do dia-a-dia dos fiéis?
- Sim! Eu construí o Homem para viver na “Esperança” de … “um dia” as coisas irem melhorar, mesmo que esse dia seja depois da sua morte. E essa narrativa pode não ter nada a ver com a realidade. Só tem de ser motivadora, capaz de se replicar e de agregar as novas inovações tecnológicas. O Francisco quer ser exemplo de humanidade e preocupa-se em estabelecer pontes entre a heterogeneidade do pensar dos povos e das suas religiões, mas esse passo só tem eficácia duradoura se for apoiado numa boa história.
- Entendo! Respondeu Hipólito. – E Fátima? Estás a par com o que se passa?? Como é que o entendes?
- O culto de Nossa Senhora como elemento no movimento para a igualdade de género é muito positivo, mas esta vinda do Francisco a Fátima foi um sapo que ele teve de engolir para dinamizar o turismo religioso. Foi como a recepção ao Trump. Devia ter-se posto em cima dele, para não ficar com aquela cara de “looser” na fotografia. Também esta coisa de canonizar a torto e a direito, não lhe vai ser favorável. Então a dos pastorinhos, não lembra ao demónio.
- Tens de concordar que aquela Cúria, que ele herdou, não o ajuda. Interrompeu Hipólito, que tinha um fraco por Francisco.
- Aquela Cúria é um saco de gatos! Não ajuda nem um nem outro. O Banco do Vaticano também não! Um Banco faz o jogo do dinheiro e esse jogo nem sempre é limpo. Um Banco pode ir à falência por uma desatenção ou passar de uma situação de aperto para uma de desafogo por causa das tais “fake news”, de que fala o Trump. Lembras-te do Horta e Osório ter sido convidado, em Março de 2011, pelo governo inglês, para dirigir o Lloyds Bank, que fora apanhado dois anos antes, nas malhas da crise do “subprime”? Mal tinha assumido funções, meteu baixa por dois meses, por … “exaustão”!!!! Logo que a notícia se espalhou, os mercados “reagiram” e venderam-se muitas acções a baixo preço!
- Queres dizer que aquela notícia foi “fabricada”, com esse propósito?
- Não estou muito dentro dos factos que tornam os mercados “nervosos”, como dizem os vossos políticos de direita, mas são notícias destas que estimulam os especuladores e fazem alterar os preços. O Horta e Osório sabia-o bem e, nesse jogo do compra e vende, um Banco pode ganhar milhões!
- Já vi que te não queres comprometer! Achas então que a solução para a crise do Cristianismo, nas culturas mais avançadas, passa pela construção de uma história integradora da imensa variedade de descobertas tecnológicas, num sistema politico global que promova bem-estar?
- Sim! É essa história que é necessário inventar para dar Esperança, pois é ela que alimenta o cérebro humano. Depois, é bom que haja alguma protecção para o corpo, contra o tempo, as doenças e alguma comida. Haja a tal história e tudo se suporta! Os bens materiais podem esperar!
- Então vamos à última pergunta. Disse o médico. – Achas que os exegetas ainda conseguem extrair dos Evangelhos essa tal história que os torne, de novo, actuais?
Deus sorriu. Pousou o cajado no chão, levantou-se e depois de dar três passos pela sala, virou-se para a janela e respondeu. – Estou em crer que tal não é possível. Talvez nos livros apócrifos haja histórias virgens das milhares de interpretações a que os Evangelhos canónicos já foram submetidos e que dêem a possibilidade de uma leitura que altere os discursos teológicos. Se não houver, os profetas de Silicon Valley vão dominar a filosofia do mundo moderno e dar início a uma nova religião baseada em fluxogramas - o Dataísmo.
Deu meia volta e dirigiu-se ao médico que também se tinha levantado.
- Acabaram as perguntas! Vou ter que ir! Qualquer dia apareço-te, de novo. Fica prometida uma outra encenação.
E dito isto, saudou Hipólito e dissolveu-se no ar, deixando na sala um leve aroma a lírios do campo. O médico esfregou os olhos. Mal tinha almoçado e já sentia um rato no estômago.