A Julinha, chefe da Secretaria no Hospital Velho, era uma
"disciplinadora". Tinha um gosto particular em alimentar com papéis
os inúmeros dossiers por que era responsável, como se cada um fosse um ser vivo
a necessitar de novas folhas para crescer. Criara uma teia burocrática tão
eficiente que, até os mais avisados, contribuíam para elevar as suas
endorfinas. Estava ali para aplicar as soluções já definidas e sentia que tinha
por missão educar os funcionários.
Na altura, a Secretaria era uma sala
rectangular, dividida por um balcão em L, com dois guichets contíguos no canto,
para o Atendimento. Em cima deles dois letreiros de grandes letras informavam,
num “Tesouraria” e no outro “Secretaria”. O horário era ESCRUPOLOSAMENTE
cumprido. -"Sr. Dr.! Abrimos às onze e fechamos ao meio-dia!", e,
quem chegasse fora desta hora, ou se entretinha a observar o ponteiro dos
segundos a sobrepor-se ao dos minutos até às onze ou teria de vir no dia
seguinte, se não fosse sexta-feira.
Um dia, o Dr. Coelho Cansado, foi à
Secretaria para regularizar um esquecimento de assinar o Livro de Ponto. Não
havia ninguém a aguardar. A Julinha debruçava-se sobre uma resma de papéis no
guichet "Tesouraria". Cumprimentou-a:
- "Dona Júlia, eu vinha aqui porque
não assinei o Ponto!", disse então, na esperança de uma fácil solução, por
ignorar a importância que pode ser atribuída a um sarrabisco colocado a tempo e
horas numa folha de papel, e aguardou o seu olhar por cima dos óculos.
- "Sr. Dr.! Trata-se então de um problema de presença!”, confirmou
com ar de poucos amigos, decidida a não deixar qualquer i sem o respectivo
ponto.
De seguida levantou-se, disse “Um momento!”, contornou a esquina
que a separava do outro guichet, onde estava escrito “Secretaria”, abriu o
vidro, voltou a sentar-se e continuou:
"-Sr. Dr.! ... Agora ... Faz favor de
dizer!"
O Dr. Cansado, que já era torcido,
aprendeu o que lhe faltava. Desde então, não se envolve em nada. Anda pelos
mínimos e cumpre religiosamente o registo da assiduidade. Se sai às cinco, às
cinco menos vinte, começa os preparativos. Se está com um doente, informa-o: -
"A sua consulta acabou, porque eu tenho de ir despir a bata e demoro cinco
minutos a descer as escadas até ao lugar onde tenho de pôr o dedo!"
2 comentários:
Quando era pequenino, tinha a mania de andar aos ninhos...acontece que um dia vi um buraco na parede e pareceu-me que era um ninho de carriça, vai daí que lá meti o dedo e de seguida sofri uma mordedura de um sardão...andei 15 dias com uma bruta infecção no dedo, sofri até não mais...e desde então, não consigo meter o dedo, seja em que buraco for!!!! Como faço para ser dispensado de meter o dedo na dita máquina?????Isto está a deixar-me muito ansioso!!!!!
Dada a gravidade do seu problema que roça o patológico, sugiro que lute o mais que puder para responsabilizar as chefias pela qualidade e volume de trabalho do grupo que dirigem.
Nos locais onde trabalhei, sempre me apercebi de quem cumpre e de quem não cumpre, sem necessitar de qualquer controle biométrico.
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