sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Os nossos Talibans


O meu avô paterno, que era um sábio, disse-me, quando eu acreditava na bondade “natural” do ser humano: Foge do homem de um só livro! Mais tarde, em 1974, ouvi Marcelo Caetano dizer que se rendia: “Para que o poder não caísse na rua!” e também não entendi o alcance da frase. Nessa altura, eu tinha por garantido que uma sociedade organizada não se esboroava em meia dúzia de meses.

O PREC (Processo Revolucionário Em Curso) foi a lição, com as milícias populares a fazer barreiras nas estradas, as Reuniões Gerais de Alunos a sanear bons professores, as reuniões de soldados para decidir se cumpriam as ordens dos generais, quando vi chamar fascista a tudo e mais alguma coisa e polícias, magistrados e professores desvalorizados pela turba acossada por uma meia dúzia de patetas que transportavam para a política as paixões clubistas. 
Quando o porta-aviões nuclear norte-americano "Nimitz" ancorou no Tejo  em Maio de 1978, para “descanso da tripulação”, eu entendi que fora Frank Carlucci (embaixador dos EUA em Portugal, entre Dezembro de 1974 e Fevereiro de 1978), que movera os cordelinhos para reorganizar o país fora da esfera da URSS.

Desde então para cá, olho para as manifestações de rua e para o que se escreve, nas redes sociais e na comunicação social, com reservas redobradas, por saber que o poder é hoje mais secreto e subterrâneo que nunca e que incentivar os “talibans” cronicamente descontentes, é coisa fácil. Basta que lhe deem um bode expiatório para despejar o seu ódio.

Quem já viveu mais de três décadas e esteve atento ao mundo, tem obrigação de saber que as más práticas e a corrupção grassam por todo o lado, quer no aparelho do Estado quer na vida civil, e que tudo é uma questão de “grau”, pelo que não se deve ter a vã esperança de algum dia ter estes problemas resolvidos. Há que estar atento e ir solucionando o que se identifica, com cuidado para não enfraquecer as Instituições e com a crença de que a maior parte das pessoas que trabalham (no Estado e na vida civil) não fazem o que querem, mas o que as condicionantes permitem.

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