Era sábado e o acaso levou-me ao restaurante “Tiro no Prato”, em S. Paio de Antas, e a um curto passeio pela frontaria da Quinta de Belinho e às histórias que se contam da gente importante que por ali andou no século passado.
Família pujante quando o poder se apoiava na posse da terra e na força das armas, que participou em guerras e batalhas aquém e além-mar, e que viu a revolução industrial derrubar-lhe o poderio, por séculos incontestado.
A última grande figura que aqui viveu foi o poeta bucólico e saudosista, António Correia de Oliveira (1879–1960), “eleito” de Salazar (1889-1970) e do Estado Novo, que pôs em verso a alma popular, do “doloroso e comovido saber do coração”.
O poeta, tinha origem humilde. Filho de lavradores pobres, nasceu em S. Pedro do Sul e, como Salazar, estudou no Seminário de Viseu, que fica a meia distância com Santa Comba Dão.
Não cursou estudos secundários ou universitários. Aos 19 anos, rumou para Lisboa para iniciar a carreira de funcionário público, como amanuense na Procuradoria-Geral da Coroa. Aí escreve em jornais e frequenta tertúlias nos Cafés e Salões da cidade, onde mostra as suas primícias literárias. Aos 33 anos (1912) surge-lhe a oportunidade de fugir à instabilidade política de Lisboa, provocada pela
implantação da República (1910) e arruma a vida, casando com a rica viúva Maria Adelaide da Cunha Sottomayor d’Abreu Gouveia, herdeira da Quinta de Belinho e de um coração boníssimo, de sensibilidade vibrátil e lhaneza de trato.
A soberba vista sobre o mar, desde a Apúlia a Vila Praia de Âncora, entre rosas, lilases e glicínias, avivam-lhe a verve e transformam-no num ” poeta-ermitão” de gosto popular, fervilhante de sentimentalismo, exaltação patriótica e de idealismo cristão.
Frequentes vezes, quando o procuram, os visitantes ouvem da boca dos criados: "O poeta não o pode atender. Está inspirado!"
Em Belinho, fundará um colégio que o fará Grande-Oficial da Ordem da Instrução Pública (1955), título que junta ao de Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (1934) por mérito literário. Foi o primeiro português a ser nomeado para um Prémio Nobel, mas o certo é que, apesar dos numerosos textos nos livros únicos do ensino primário e secundário, durante o Estado Novo, a sua bibliografia está actualmente esquecida. Ficou-lhe o nome em ruas (Coimbra, Viana do Castelo, Póvoa de Varzim, Baguim do Monte, S. Pedro do Sul, …), na Escola EB 2,3 de Esposende e nos papéis da venda ao Estado (1916) do antigo “Palácio dos Cunhas” - actual sede do Governo Civil de Viana do Castelo, que fora arrendado para Liceu da cidade, até 1911.
O seu corpo está na capela de Nossa Senhora do Rosário, fronteira ao portão principal da quinta, destinada aos membros da Casa de Belinho.
Se a história do poeta me surpreendeu, a do seu filho mais velho, José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira (1921-1976), foi-me reveladora dos meandros do poder.
Sem ter sido um aluno excelente, licenciou-se, aos 23 anos, em Ciências Jurídicas na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Aos 28 anos era Director do Gabinete de Estudos do Conselho Técnico Corporativo, passando a Vice-Presidente no ano seguinte. Depois foi Secretário de Estado do Orçamento (1955-1958), Secretário de Estado do Comércio (1958-1961), Ministro de Estado Adjunto do Presidente do Conselho (1961-1965) e Ministro da Economia (1965-1968).
A precocidade com que o poder lhe caiu nas mãos, são mais prova de fidelidade aos valores dos poderosos da época, que de grande competência. Privava com Salazar. Não casou, nem teve filhos.
Em 1967, a sua progressão política foi travada pelo escândalo Ballet Rose, ao saberem-no envolvido, juntamente com outros políticos das mais altas cúpulas do Estado Novo, em orgias com crianças entre os 8 e os 12 anos e em práticas de sado-masoquismo. Antes de abandonar Portugal, em 1975, foi presidente do Banco Burnay.
Suicidou-se em 31 de Dezembro de 1976, atirando-se do sétimo andar de um hotel de Paris.
A Quinta permanece sem a vida de outros tempos. O grande tanque da água está furado, mas a casa ainda é morada da viúva do segundo filho do poeta. Já foi palco para casamentos e baptizados, mas foi sol de pouca dura.
A crise não ajudou e os poetas não andam “inspirados”.
Em 1967, a sua progressão política foi travada pelo escândalo Ballet Rose, ao saberem-no envolvido, juntamente com outros políticos das mais altas cúpulas do Estado Novo, em orgias com crianças entre os 8 e os 12 anos e em práticas de sado-masoquismo. Antes de abandonar Portugal, em 1975, foi presidente do Banco Burnay.
Suicidou-se em 31 de Dezembro de 1976, atirando-se do sétimo andar de um hotel de Paris.
A Quinta permanece sem a vida de outros tempos. O grande tanque da água está furado, mas a casa ainda é morada da viúva do segundo filho do poeta. Já foi palco para casamentos e baptizados, mas foi sol de pouca dura.
A crise não ajudou e os poetas não andam “inspirados”.