Carla, ou Crisálida, como queiras:
Sinto na tua carta, o fel que me fez fugir, uma mágoa pelo tanto que te quis, nesses três anos em que pensei que o amor tudo podia e que o tempo estava todo ao nosso lado.
Seduziste-me, fingindo-te perdida num requebro de menina, quando o acaso nos cruzou. Vi-te, adolescente, à espera de uma revelação e, vaidoso, julguei-me eleito para tão delicada tarefa. Dei-te o que tinha de melhor - atenções, amor, livros, espaços, eventos, para acalmar o torvelinho que julgava ser a tua graça e lhe dar o sentido do meu sentir, mas só tarde te vi narcísica e egocêntrica, incapaz de ouvir o bater de um coração.
Dizes que te encandeaste no meu cabelo e na barba por fazer, mas não falas do calor das minhas mãos, nos silêncios que te dei, nem nas frases para ti inventadas, que eram pontes, barcos e naves por onde podíamos ter voado eternamente. O mais que conseguiste foi sentires-te segura da desimportância do meu gostar, até me levares às margens da exaustão.
Aquelas luzes fátuas que viste no caminho, quando te apercebeste da minha decisão a aguardar gesto, não eram alucinações, eram fragmentos da tristeza que eu deixava no meu rasto. E tu não as apanhaste para lhes dar remédio. Deixaste-as apagar sem um sopro que as atiçasse.
À perplexidade do teu fim, segue-se agora a notícia de que me pediste perdão do muito que te ajudei a teres a graça do céu por entre nós. A morte pode ser um alívio e talvez aí consigas a paz que a tua passagem por aqui negou. Encheste os olhos de quem te viu, mas deixaste feridas impossíveis de sarar.
Por favor, não me guardes lugar na tua nuvem
Adeus!
Até Nunca!
Fernando