Todos têm nome de guerra. Juntam-se ao fim do dia naquela esquina tornada passagem pelo fecho abrupto das lojas. Perto um supermercado vende-lhes o vinho a 60 cêntimos o tetrapak. Uns deitam-se no lajedo frio do passeio. A outros ainda sobra energia para desequilíbrios de trapezista. O Mudo não faz mal a ninguém mas assusta pelos guinchos. O Teixeira é campeão em idas ao Serviço de Urgência. Tem um telemóvel. A Mulher do Mudo, raramente engrossa o magote.
Se há festa, dispersam-se e desaparecem, levados pelos movimentos caóticos dos arraiais, para se encontrarem dormentes ou feridos, caídos mais que prováveis, na soleira de uma porta, num banco de jardim, de borco num boeiro.
Este chamou a atenção, esparramado, o cão a rondá-lo, ganindo. Está morto!? Chamem o 112! conclui o povaréu que entretanto se junta.
Chega a ambulância e a VMER. Correm enfermeiros, médico e socorristas com macas, desfibriladores e malas de primeiros socorros. Abre-se uma clareira na gente que se afasta.
- É o Mickael Jackson!
Viram-no de lado. Tosse e mais um vómito. -Estás bem?! abanam-no. Esboça um gesto. Tem pulso, respira. Dá vontade o deixar ali, e ir embora, mas o público está atento e, à mínima indecisão do artista, disposto a patear. Colocam-no na maca. O cão aproxima-se e ele abre um olho e agarra-o.
-Oh Mickael! Larga o cão que o bicho não pode ir na ambulância!
-O cão vai comigo! Senão eu não vou!, afirma.
Uns sorriem, outros não entendem a demora em partir. Do grupo, uma mulher confronta a enfermeira da VMER: -Bocês que bão para o Hospital, é que lhe podiam lebar o coum! Carago!
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