-"Calma Marina! Não aumente ainda mais o problema!”, dizia, a tentar controlar a auxiliar, que alternava as mãos entre a cabeça e os joelhos, numa aflição irreprimível, depois de ter visto o doente saltar pela janela.
-"Ele partiu o vidro com aquele vaso de flores, e depois enfiou-se pelo buraco e desapareceu!", repetia, apontando para o negro do telhado do 4º andar através da janela partida. –“Estava descalço e só tinha as calças do pijama vestidas. Ele é tão grande! Ninguém o conseguia segurar. Aiiiiii! Sr. Dr.! ... O homem matou-se!", e não parava de andar de um lado para o outro.
-“Marina, deixe lá o choro, que não adianta, e só perturba! Veja se fica calada, para a gente poder pensar. Enfermeiro Ruiz, conte lá o que se passou!"
-"É o doente da cama 5. Entrou ontem com uma cirrose hepática e deve estar com delírio alcoólico. Esteve bem durante a tarde. À meia-noite, recusou a medicação e começou a ficar agitado, dizendo que eu o queria matar com as injecções. Passei-o à frente e continuei a dar a medicação aos outros. Quando voltei a ele, deviam ser umas duas horas, começou o sarilho. Ficou muito perturbado com a minha presença e, quando eu me tentei aproximar, fugiu para o átrio dos elevadores e, … atirou-se pela janela!"
-Ok! Você consegue vê-lo ali em baixo, no meio deste escuro?"
-"Não se vê nada! Ele também de branco pouco tem, embora volume não lhe falte. Pesa bem mais que 100Kg! Nem sei como é que ele passou pelo buraco do vidro. Deve estar todo cortado!" E depois de uns longos segundos a esticar-se pela janela, identifica-o a andar pelo telhado, uns cinquenta metros para lá do local da queda.
-“Está ali! Vai na direcção da janela iluminada do Serviço de Obstetrícia, no outro módulo do Hospital! ... Está aos gritos ao telefone a pedir para o virem buscar, que o querem matar!”
-“Pelo menos está vivo! Avisem os Porteiros, as Oficinas e a Polícia para ver se lhe deitamos a mão antes que ele caia dali abaixo. Como é que se chega onde ele está?”, e, enquanto uns lhe tentam adivinhar os movimentos, outros saem em direcção ao possíveis locais de fuga.
-“Esperem! Ele desapareceu! Deve-se ter atirado do telhado abaixo!”
São três horas da manhã, quando se inicia a “caça ao homem”.
-“Você vai por ali! Eu por acolá e você Marina, fica aqui com o enfermeiro Ruiz a tomar conta dos outros doentes. Se alguém o encontrar, telefona para o Serviço de Urgência!”
Dou uma volta pelo exterior do edifício e pelo local da possível queda, sem ver vivalma, e entro pelo Serviço de Urgência. Foi a Polícia que o encontrou. Estava na primeira rotunda, bem fora da cerca do Hospital.
Está agora na Sala de Pequena Cirurgia, sentado num banco, de tronco nu, descalço e com múltiplas feridas cortantes dispersas pelo tronco, mãos, pernas e pés. À volta destes o sangue faz desenhos no chão de mármore. É um homem gordo, escuro e tem o ar assustado de um urso acossado, sempre atento à porta de entrada, como que a prever o reaparecimento do enfermeiro do serviço, enquanto a enfermeira o punciona e lhe diz com voz estrelada:
- “Tenha calma! Nós somos amigos! Aqui ninguém lhe faz mal! Deite-se ai na marquesa, para lhe limparmos as feridas que tem debaixo dos pés!”, e, como por milagre as pálpebras descem-lhe sobre o amarelo dos olhos e a cai na maca, leve como uma criança, no colo da mãe.
- “Sr. Manuel! Sr. Manuel!”, e depois, olhando para o ao lado: “Já o sedaram!? Que rápidos! Eu nem notei! ... Está lá fora a mulher! Deixem-na ficar com ele, para que, ao acordar, não voltemos ao mesmo! ... Até amanhã!”
-"Ele partiu o vidro com aquele vaso de flores, e depois enfiou-se pelo buraco e desapareceu!", repetia, apontando para o negro do telhado do 4º andar através da janela partida. –“Estava descalço e só tinha as calças do pijama vestidas. Ele é tão grande! Ninguém o conseguia segurar. Aiiiiii! Sr. Dr.! ... O homem matou-se!", e não parava de andar de um lado para o outro.
-“Marina, deixe lá o choro, que não adianta, e só perturba! Veja se fica calada, para a gente poder pensar. Enfermeiro Ruiz, conte lá o que se passou!"
-"É o doente da cama 5. Entrou ontem com uma cirrose hepática e deve estar com delírio alcoólico. Esteve bem durante a tarde. À meia-noite, recusou a medicação e começou a ficar agitado, dizendo que eu o queria matar com as injecções. Passei-o à frente e continuei a dar a medicação aos outros. Quando voltei a ele, deviam ser umas duas horas, começou o sarilho. Ficou muito perturbado com a minha presença e, quando eu me tentei aproximar, fugiu para o átrio dos elevadores e, … atirou-se pela janela!"
-Ok! Você consegue vê-lo ali em baixo, no meio deste escuro?"
-"Não se vê nada! Ele também de branco pouco tem, embora volume não lhe falte. Pesa bem mais que 100Kg! Nem sei como é que ele passou pelo buraco do vidro. Deve estar todo cortado!" E depois de uns longos segundos a esticar-se pela janela, identifica-o a andar pelo telhado, uns cinquenta metros para lá do local da queda.
-“Está ali! Vai na direcção da janela iluminada do Serviço de Obstetrícia, no outro módulo do Hospital! ... Está aos gritos ao telefone a pedir para o virem buscar, que o querem matar!”
-“Pelo menos está vivo! Avisem os Porteiros, as Oficinas e a Polícia para ver se lhe deitamos a mão antes que ele caia dali abaixo. Como é que se chega onde ele está?”, e, enquanto uns lhe tentam adivinhar os movimentos, outros saem em direcção ao possíveis locais de fuga.
-“Esperem! Ele desapareceu! Deve-se ter atirado do telhado abaixo!”
São três horas da manhã, quando se inicia a “caça ao homem”.
-“Você vai por ali! Eu por acolá e você Marina, fica aqui com o enfermeiro Ruiz a tomar conta dos outros doentes. Se alguém o encontrar, telefona para o Serviço de Urgência!”
Dou uma volta pelo exterior do edifício e pelo local da possível queda, sem ver vivalma, e entro pelo Serviço de Urgência. Foi a Polícia que o encontrou. Estava na primeira rotunda, bem fora da cerca do Hospital.
Está agora na Sala de Pequena Cirurgia, sentado num banco, de tronco nu, descalço e com múltiplas feridas cortantes dispersas pelo tronco, mãos, pernas e pés. À volta destes o sangue faz desenhos no chão de mármore. É um homem gordo, escuro e tem o ar assustado de um urso acossado, sempre atento à porta de entrada, como que a prever o reaparecimento do enfermeiro do serviço, enquanto a enfermeira o punciona e lhe diz com voz estrelada:
- “Tenha calma! Nós somos amigos! Aqui ninguém lhe faz mal! Deite-se ai na marquesa, para lhe limparmos as feridas que tem debaixo dos pés!”, e, como por milagre as pálpebras descem-lhe sobre o amarelo dos olhos e a cai na maca, leve como uma criança, no colo da mãe.
- “Sr. Manuel! Sr. Manuel!”, e depois, olhando para o ao lado: “Já o sedaram!? Que rápidos! Eu nem notei! ... Está lá fora a mulher! Deixem-na ficar com ele, para que, ao acordar, não voltemos ao mesmo! ... Até amanhã!”
1 comentário:
Então agora temos post diário, sem direito ao descanso domonical! Muito bem: em breve das crónicas se passará a uma novela e lá chegará o romance. Estou feliz de te ver assim
Enviar um comentário