quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

As leis da Fronteira

Prémio Literário Casino da Póvoa / Correntes d’Escritas 2016

É um livro de fácil leitura. Tem por base a delinquência juvenil nos finais dos anos 70 em Girona (Espanha). Mas o seu valor está no pormenor com que narra o que está por detrás das decisões dos diferentes intervenientes -  o modo como entendem a realidade e como tentam adivinhar o que condiciona os outros!

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Fora da caixa



- Ele veio de França, há-de haver um ano, sem qualquer informação sobre a doença, que estava diagnosticada desde 1984. É um compêndio de patologias com as respectivas complicações e, para piorar o cenário, ... vive só!  Logo que melhorou da anemia que o trouxe ao hospital, começou a falar na alta. Nem sei como o aguentámos dez dias internado!
- E porque é que não o deixaram ir?
- Ele tinha sangrado pelo tubo digestivo e não sabíamos exactamente onde. Ainda por cima estava hipocoagulado e tinha necessidade absoluta de continuar a estar!

Conversa de quem tem de lidar com quem vive "fora da norma" e obriga a atenções redobradas para que um "azar" o não atire para a primeira página de um jornal necessitado de empolar um facto para aumentar as vendas.

- Ontem, às dez e meia da noite, arrumou os poucos pertences e só não foi embora porque vim cá acima e me impus! Ele mora a mais de 100Km daqui, junto à fronteira! Mas foi difícil! Ele sabe os horários das camionetas e dos comboios e tinha um em vista. Ia como estava: pijama, roupão, chinelos e gorro na cabeça!
- E foi assim que, hoje, o encontraram no Shopping!?
- Foi! A empregada da "Seaside", depois de lhe ter vendido os sapatos, telefonou para o hospital! Os seguranças encontraram-no à entrada da "Mike Davis"!
- E ninguém o viu sair?
- Não! Quando lhe perguntei por onde tinha saído, disse que não dizia e eu fiquei com a ideia de ele ter utilizado uma das portas de serviço, aproveitando um tempo em que ninguém por lá andava.
- E hoje deste-lhe alta!?
- Escrevi a Nota de Alta a correr, porque ele estava a contar o tempo para a camioneta.
- E foi de roupão e gorro?
- E de sapatos novos! Talvez a pressa fosse para acabar as compras no Shopping, que dinheiro e despacho não lhe faltam!
- ... Pelo menos para a asneira!
-Sei lá! O certo é que se tem aguentado!

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Água

Então é assim: 
- Fui a Matosinhos, almoçar, com a família, ao "Dom Peixe", e, pouco depois de nos termos sentado, o empregado pôs esta garrafa de água na mesa.

Água Dom Peixe.


da torneira

Pura
Micro-filtrada 
que conserva e
realça as suas
propriedades

Local
Purificada 
engarrafada 
e consumida 
no momento

Sustentável
Garrafas de vidro 
reutilizáveis que 
respeitam o meio 
ambiente

Um exemplo para os restaurantes que "teimam" em vender água mineral (se possível) em garrafas de plástico!

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Futsal - Campeões Europeus




Cada estrela de oiro
Disse a quem a escute
Foi um anjo loiro
Que me deu um chute
A jogar com calma
Sem perder a fé
Teima e leva a palma
Jogador com alma
Rebentava o mundo
Se lhe desse um pontapé

Saia quem tem pança
Viva o sol em brasa
Quem tem massa vai a França
Quem não tem ficou em casa
A Maria Rita, hoje ressuscita
Hei-de a ver no desafio
Com um grãozinho na asa

Se a selecção trabalha
Como eu quero
Agora é que não falha
Nove a Zero





Heróica e lusitana gente, vamos em frente mas combictamente...

Va lá cambada infantes desportistas, homens de conquistas
Povo que és o meu
Bola redonda e onze jogadores em frente
Sem temores que as tácticas dou eu
Tragam as gaitas, as bandeiras e a pomada
Vamos dar-lhes uma abada, ensinar-lhes o que é bom
Vamos mostrar a esses escarafunchosos
Por momentos gloriosos
Quem é a nossa selecção

Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é futebol total
Deixem-se de tretas, força nas canetas que o maior é PORTUGAL
Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é futebol total
Deixem-se de tretas, força nas canetas que o maior é PORTUGAL

É atacar agora e defender para fora
Eles são toscos e nem dão para aquecer
Suar a camisola e até jogar sem bola
E disfarçar para o árbitro não ver
No intervalo, solteiros contra casados, fandangos, chulas e fados
Para aprenderem como é
Durante o jogo, qualquer caso lá surgido
Só pode ser resolvido à cabeçada e ao pontapé

Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é futebol total
Deixem-se de tretas, força nas canetas que o maior é PORTUGAL
Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é futebol total
Deixem-se de tretas, força nas canetas que o maior é PORTUGAL

Os portugueses já provaram muitas vezes
Saber ser uns bons fregueses das grandes ocasiões
Nesta jornada nem que seja à pantufada
Nós estaremos na bancada muito mais de dez milhões
Força Portugueses!

Viva Portugal, Portugal, Portugal...
Viva Portugal, Portugal, Portugal...

Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é futebol total
Deixem-se de tretas, força nas canetas que o maior é PORTUGAL
Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é efectibamente
Futebol total
Temos de ter coragem, muita força
Pensem nos vossos antepassados có nada
Muito orgulho, muita vivacidade
E vai... e um, dois, e um, dois...
E vai lá... e cruza... e é golo, e é GOLOOOOOOOOOO

Bamos lá cambada, todos à molhada que isto é futebol total
Deixem-se de tretas, força nas canetas que o maior é PORTUGAL

Composição: Carlos Paião

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Lembranças do Olimpo (33)


Hipólito respondeu positivamente ao convite para Reunião Anual da Sociedade Universal dos Novos Feiticeiros. Recebera o programa e conseguira identificar cinco dos nomes que lá apareciam: o de Yuval Noah Harari, o de Henry Kissinger, o de Dwight Eisenhower, o de Anwar Sadat e o de Mikhail Gorbachev, os restantes nada lhe diziam.
Como destes, uns estavam vivos e outros mortos, previu que ali tudo poderia acontecer.
O tema da sua mesa era “O que os deuses antigos pensam do futuro do Homem na Terra”, mas o que o estimulava era poder assistir a sessões que já marcara no Programa como – “O futuro em 2050!”, ou “Quem decide os futuros possíveis!”
Recebeu pela Net o voucher para a viagem e Hotel e a indicação de que, à sua chegada ao aeroporto Aeroporto Internacional Ben Gurion, tudo o que necessitaria para a sua estadia, lhe seria entregue.

Há alturas na vida em que o tempo passa sem disso darmos conta e, num repente, Hipólito encontrava-se em Massada, meia hora antes da hora de início da sessão de abertura.

Estava um dia ameno. Uma brisa vinda do Mar Morto abanava as bandeiras colocadas num dos seus topos. O médico identificou rapidamente a de Israel, a dos EUA, a da China, a da India, a da União Europeia, a da Rússia e a do Irão. Todas as outras, por não estarem totalmente desfraldadas, não permitiam identificação. Nos terreiros, uma meia dúzia de congressistas dirigia-se para a zona das ruinas, onde uma única nuvem azulada, impedia a sua completa visualização. Junto às grades, a sul, estava instalado o que lhe pareceu ser um ponto de “catering” e foi para aí que se dirigiu, na esperança de um café.
No trajecto um segurança interceptou-o e sugeriu-lhe que se dirigisse rapidamente para o recinto da Reunião, pois não seriam cordiais atrasos nas entradas.

Hipólito acelerou o passo na direcção às ruínas, quando um som de dez trombetas alvoroçou a manhã. Do nada, irromperam seis anjos dourados, seguidos de uma quadriga triunfal de alvos cavalos transportando uma figura humana transparente vestido de T-shirt branca e jeans azuis, empunhando um tridente de aço cintilante, que penetraram na nuvem azulada. Hipólito pasmou ao ver um deus em indumentarias que mais lembravam um geek de meia idade.

Entrou na sala já cheia e rapidamente alguém lhe pegou no braço e levou para um lugar junto à coxia. Olhou para o lado e reconheceu o Harari. Hipólito, sentiu-se honrado como lugar. Já não era a primeira vez que se tinha sentado ao lado de alguém importante. Uma vez em Lisboa, no teatro, ficara ao lado do António Guterres e tinha-o cumprimentado com um sorriso aprovador. Agora não queria fazer por menos e estendeu-lhe a mão. O Harari levantou-se, meio espantado, e cumprimentou-o, enquanto o médico lhe dizia: - Eu devia ter lido os seus livros no início da minha vida adulta! Só que você, nessa altura, ainda não tinha nascido! O historiador sorriu, agradeceu e voltou a sentar-se.

A sala, não tinha mais de cem lugares, divididos em dois quartos de círculo. Naquele onde se sentou estavam pessoas como ele, umas com trajos tradicionais, a maioria vestindo desportivamente à ocidental. No outro quarto de círculo, as figuras humanas eram transparentes e de contornos mal definidos. Todos tinham diante uma pequena mesa de apoio, com um bloco de notas e um lápis.

Na presidência, o personagem que vira entrar, mantinha-se, de pé, à frente de um enorme écran que passava imagens de Galáxias, Buracos Negros, estrelas e satélites artificiais.

Soaram de novo as trombetas e o geek, depois de um curto agradecimento de boas-vindas, iniciou o discurso:

- Estamos nesta sala para tratar do futuro da Humanidade, que devemos entender como em risco de extinção. É nossa obrigação achar soluções para que tal não aconteça num futuro próximo, pelo que se torna necessário definir quais as crenças a implementar para que o Homem continue e acreditar em poderes sobre-humanos que o levem a fazer as coisas certas, mesmo que baseados em razões erradas.
A evolução tecnológica e a globalização, vieram para ficar. Já não há espaço para deuses eremitas ou que façam do sofrimento um “must”! Há que pôr a tónica em valores que não estimulem o conflito físico. Deuses que obriguem a comportamentos socializantes, sem deixarem de incentivar a valorização pessoal.
...

Hipólito cutucou o braço do Harari e segredou-lhe: - Conhece-o?

- Sim! Disseram-me que é meio irmão da Pandora e que foi construído, recentemente, pelo mesmo processo que ela. Reparou na mochila dele?! Queira Zeus que contenha os antídotos para os males que a caixa da irmã deixou neste mundo! Chamam-lhe Phoebe, o Radiante. Actualmente vive em Shanghai, mas não há garantia de que se mantenha ali indefinidamente, que ele é defensor da "Labor Mobility"

Entretanto aquele pequeno discurso tinha terminado e o palco foi invadido por várias figuras humanas, entre as quais estava o Gorbachev. Ajustaram-se os microfones e o presidente da mesa, que lhe pareceu indiano, apresentou o Henri Kissinger como primeiro palestrante, salientando que ele iria falar verdade e não dizer as coisas mais convenientes, como habitualmente fazia quando estava na política activa.
O estadista avançou até a um pequeno púlpito que se situava ligeira à esquerda do palco.
Hipólito pegou no lápis para anotar, no bloco, o pensamento político do país mais poderoso da actualidade:

O direito de dominar é um princípio primordial da política externa dos EUA encontrado em quase toda a parte, embora normalmente escondido por detrás de termos defensivos.

Os EUA são proprietários, de pleno direito, do mundo, e são, por definição, uma força ao serviço do bem.

"Seremos multilaterais quando pudermos, unilaterais quando a isso obrigados! (Bill Clinton)

Os EUA têm o direito de recorrer ao uso unilateral do poder militar para assegurar o livre acesso a mercados fulcrais, fontes de abastecimento de energia e recursos estratégicos.

Os arquitectos do poder dos EUA têm de criar uma força que possa ser sentida, mas nunca vista. O poder preserva a sua força quando mantido em segredo; uma vez exposto, começa a dissipar-se.

É necessário manter uma força militar de dimensão idêntica ao somatório do resto do mundo e bastante mais avançada quanto à sofisticação tecnológica!

As sociedades complacentes, autoindulgentes e brandas estão prestes a ser varridas juntamente com os detritos da história. Apenas as fortes, terão alguma possibilidade de sobrevivência.

Os EUA têm o exclusivo estatuto de imunidade ao sistema legal internacional e há legislação aprovada no Congresso que autoriza o presidente a fazer uso das forças armadas para “salvar” qualquer norte-americano de um eventual julgamento em Haia.

Houve quem acreditasse que por via do diálogo e da consolidação gradual de uma relação de confiança, seria criada uma irreversível dinâmica de paz que pudesse desembocar numa solução. O problema desta visão é que a questão não reside na confiança, mas no poder. O processo facilitador mascara essa realidade. No final, os resultados que podem ser alcançados por intermédio de um débil grupo de terceiros, não vai além do que o grupo forte permitirá.

Há muitos que estão convencidos de que os primeiros beneficiários do desenvolvimento dos recursos de um país devem ser as pessoas desse país, esquecendo-se dos “investidores”.


O orador terminou. Metade do público levantou-se para aplaudi-lo e um pequeno grupo pateou!
Hipólito virou-se para o Harari: – Tanta clareza até atordoa!
O historiador encolheu os ombros com ar de quem entende quem está decidido a manter o poder: - Se não forem estes, outros o farão! O problema são as opções, que os pressupostos são iguais!

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Lembranças do Olimpo (32)



A vida é como é, e, mesmo que tenhamos um forte “wishfull thinking”, a realidade irá, mais tarde ou mais cedo, bater-nos à porta, para nos tirar o sorriso de “dreamer!”
Necessitamos de uma esperança de felicidade no futuro, principalmente quando vivemos enleados em problemas que não dependem de factores que controlamos, e esquecemo-nos que muito dessa “felicidade” está dentro da nossa cabeça e que seria mais fácil se reduzíssemos aos desejos.

De qualquer modo, sendo eles muitos ou poucos, a felicidade está em superar os desafios que aceitamos, embora frequentes vezes sejamos levados desejar o que nada tem a ver connosco, para, no fim, sermos vítimas deles, que não é um nem dois que morre jovem ao volante de um bólide topo da gama, nem na viajem de sonho aos confins do mundo ou até, que casa com a mulher mais vistosa da terra, para o atormentar o resto da vida.

O ambiente que queremos construir obriga a responder a afirmações dentro do grupo, e o “grupo” não é tão “livre” nas escolhas como pode parecer aos menos atentos. Há uma montanha de pressões a orientar os seus desejos, desde a publicidade mais inócua, às mensagens veiculadas através das escolas e das instituições, que visam direcionar a “populaça”, para o que interessa às elites que condicionam as políticas dos governos. A “fabricação de necessidades” e a “engenharia do consentimento”, são as novas artes da Indústria das Relações Públicas, para moldar opiniões, atitudes e percepções, de modo a que os cidadãos se coloquem no lugar de “espectador não participante”, e  “a minoria inteligente se proteja do ruído da carneirada desnorteada e dos intrusos ignorantes e metediços”.

Eram estes pensamentos que estavam por detrás da aceitação de Hipólito, para ir a Massada. Aquela reunião soava-lhe a movimento com pretensões a tomar conta do futuro da maior parte da população do mundo. Tentara acertar-se com a História Contemporânea. Lera o Kissinger e o Chomsky, para ter a noção dos opostos e mais umas coisas dentro das políticas de saúde para o caso de alguém aproveitar a sua condição de médico de um país periférico com um Sistema Nacional de Saúde, para lhe fazer perguntas.

A complexidade da natureza humana sempre o surpreendera. Tivera um circulo de relacionamentos com quem tivera complacência, até se espantar com a trafulhice de que muitos eram capazes a troco de uns míseros euros ou por uma pequena vantagem. Tentava manter os amigos mais antigos e alguns jovens que ainda resistem àquelas tentações que resolvem dois problemas e criam dez!

A velha máxima de que o homem faz todo o mal que pode e todo o bem a que é obrigado, era uma das suas preferidas. Fazia o seu trabalho com a sensação de que podia alterar o estar de uma meia dúzia de pessoas, mas perdera qualquer veleidade de fazer filosofia sobre o que quer que fosse, para além disso.

Admirava a ousadia dos visionários que se dispunham a orientar as massas para amanhãs cantantes, ignorando as consequências a curto, médio e longo prazo das suas soluções, e mantinha a opção de defender a diversidade organizacional e não uma única via como o fazem os “grandes líderes”!

Lembrava o mal que a ignorância pode causar, e fazia analogias com as salamandras, um bichinho que até há bem poucos anos, não tinha qualquer importância para a Humanidade, mas que por se ter descoberto a sua capacidade em regenerar, na totalidade, os membros, estava a ser alvo de estudo para tentar entender como obter iguais resultados no homem.

Quanto fica por desvendar, no que desaparece?

Os radicalismos, mesmo que tenham a melhor das intenções, são exterminadores e limitam as opções ao conhecimento e esse, era o seu verdadeiro Deus.