- Então esse não era aquele que não estava suficientemente mal para estar internado, nem suficientemente bem para ter alta?
- Não! Este teve uma pneumonia que devia ter sido tratada no seu Hospital de residência mas, como lhe foi diagnosticado, na mesma altura, infecção HIV, ficou cá. Entretanto surgiram uma série de complicações que prolongaram o internamento por cerca de dois meses. Planeamos-lhe a alta. O Serviço Social confirmou que ele vivia com o irmão em Vila do Conde, numa situação já conhecida pelas “forças vivas” da cidade. Organizámos-lhe os medicamentos para lhe fosse fácil cumprir o tratamento, marcou-se consulta externa e chamou-se a ambulância para o pôr em casa. Só que os bombeiros recusaram deixá-lo lá, porque a casa “não tinha condições”, e trouxeram-no de novo para o hospital. Por sorte só veio ele, pois com este argumento podiam ter trazido também o irmão, que lá estava.
- E o homem não se manifestou?
- Nada! Deve ter ouvido as conversas e ficou à espera que lhe arranjassem uma solução melhor. O problema foi posto às instâncias superiores e depois de várias diligências, arranjaram-lhe um quarto numa Pensão aqui, onde o homem não conhecia ninguém. Esteve lá uma semana. Depois desapareceu. Alertaram a Polícia e foram encontrá-lo … no Algarve. Como lá chegou, não sei! Trouxeram-no de volta à … Pensão.
- Mas ele estava assim tão degradado?
- Quando chegou, na primeira vez, parecia um bicho, mas depois do banho e lhe terem cortado a barba e as unhas, era um tipo magro de olhos pequeninos, com ar modesto e agradecido. Andava pelos 50 anos.
- E depois? Aguentou-se?
- Não! Uns tempos depois apareceu morto! Não sei do que foi. São vidas terríveis as dos sem-abrigo. Todos os pertences num saco de plástico, os Albergues só para as noites, as refeições das ONG e aquelas cabeças a não ajudar.
- É bem certo "Deus ajuda, quem se ajuda" e mesmo a esses, ás vezes, ajuda mal!
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