O sol batia forte no átrio do recinto. Hipólito correu para
a entrada à procura do fresco da sala, onde ainda se não iniciara sessão da
tarde. No meio do palco, virado para o ecrã, que se estendia até ao topo do
edifício, Júpiter de consola na mão, jogava um videojogo. Ao seu lado, Alexey
Pajitnov, dava-lhe dicas para o ajudar a organizar as peças que caiam e se
encaixavam junto à base. Ao ver Hipólito aproximar-se, justificou-se:
- Estamos aqui a aproveitar o intervalo para testar o meu novo jogo! É como o
Tetris, mas agora tridimensional e virado para a economia! As peças representam
as “commodities”, isto é, as mercadorias, e o jogador tem de as encaixar nos
países que as importam, tendo em consideração as “tarifas” a que estão
sujeitas. Júpiter já acertou com algumas, mas como tudo está tremendamente
dinâmico, nem ele, que é um deus, consegue ser suficientemente rápido!
Júpiter cutucou-o, como a pedir nova ajuda e ele respondeu
prontamente:
- Cuidado com o Café da Colômbia que vai para os USA. Tem de rodar o mundo,
depressa, porque as tarifas aí subiram 25%. É melhor mandá-lo em direcção à
Europa. Falhou!, riu-se condescendente com Júpiter que suava ao ver descer o
Ferro do Brasil também em direcção aos USA.
- Rode o mundo outra vez!, gesticulou Pajitnov. – Mande-o para a China! Isso!
Isso! Boa!
Agora era o vinho Bordeaux que descia, seguido do Cobre do Chile. Júpiter fez tudo
para os encaixar na China, mas não foi a tempo e um grande “Game Over!” surgiu
no écran.
Júpiter recostou-se, rindo. - Este jogo é levado dos demónios! No princípio foi
fácil, quando desceram as terras raras. Há poucos a usá-las. Mas quando foi
preciso colocar o Ferro da Índia, do Brasil e da Rússia, começaram as
complicações. Oh Pajitnov, este jogo é impossível enquanto as taxas que todos
querem pôr sobre as mercadorias dos outros não estabilizarem. É que não dá
tempo para nos organizarmos!
Entretanto chegara gente e a sala compusera-se. Júpiter evaporou-se e, na mesa surgiram o Papa
Francisco, o Dalai Lama e o Aiatola Ali Khamenei. O tema da sessão era “Como
influenciar multidões com frases simples”. O Dalai Lama invocou os 89 anos e a
viagem para se limitar a repetir a dúzia de frases “espirituais” já conhecidas,
o Aiatola Ali Khamenei, mal se sentou, adormeceu e o Papa Francisco, às primeiras
palavras, ficou com falta de ar e a sessão teve de ser interrompida para o levar
para o hospital. O Dalai Lama fez questão em o acompanhar, e o Aiatola, que
estava espapaçado na cadeira, foi levado ao colo, por um segurança vestido com
uma burka, para um cadeirão ao fundo da sala.
O médico disse para consigo, enquanto folheava o programa: - É gente demasiado
velha para estas andanças, ainda por cima com sequelas graves de atentados.
Devem ter sido convocados só pelo prestígio! Até aos 80 anos, muitos ainda se
aguentam, mas depois é difícil encontrar quem ainda mantenha a energia
necessária para lutar por soluções adequadas aos novos tempos. Os que se
mantêm, arrastam-se no meio de sequazes temerosos que uma nova liderança os
retire do poder.
A sessão seguinte era sobre o “Secularismo” e Hipólito não a
queria perder. Enquanto aguardava, fechou o programa e os olhos para acabar a sesta que tinha
interrompido.
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