quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Uma Opinião "Pragmatista" a considerar.


Um primeiro passo, simples, mas por isso impossível.

Os partidos políticos em Portugal estão ainda divididos ideologicamente entre "extrema-esquerda", "esquerda", e "direita". O "centro", onde deveria residir o pragmatismo, está desocupado. Inexplicavelmente, a "extrema-direita" também não tem ninguém, … mas o país só ganha com isso.

Os vários partidos de extrema-esquerda e de esquerda, o PCP, os Verdes, o BE, para nomear só os que estão representados no Parlamento, estão separados pela proximidade e distinções sem diferenças, e estão permanentemente engalfinhados, lembrando o conflito entre a Judean People's Front, a People's Front of Judea e a Popular Front of Judea no filme Life of Brian dos Monty Python. Acreditam que o Estado é a solução para tudo e para todos, e são, numa avaliação generosa, utópicos e líricos, mas a historia ensina-nos que, no poder, se comportam como os partidos da extrema-direita. Os dirigentes criticam, com o desdém pseudo-intelectual de quem pensa ser possuidor da única verdade, todos os que acham que o Estado é por regra mau investidor e pior gestor. São apoiados por alguns poetas líricos, mas principalmente pelos invejosos que querem nivelar tudo por baixo e procuram usufruir sem esforço da riqueza produzida por outros. A esquerda já governou Portugal e ainda há memória do que aconteceu. Não vão nunca evoluir e estão estagnados naquele espaço cómodo de constante critica, que por vezes é até útil, exigindo regalias, a que chamam direitos, que seriam incapazes eles próprios de realizar, na certeza de que nunca mais vão ser chamados a governar. Não são fiáveis.

O PS, dizendo que é um partido de esquerda, que não é, tenta ocupar o centro, mas ao tentar ser tudo para todos, acaba por não ser nada para ninguém. Manteve-se no poder durante anos "comprando" os votos dos Portugueses com uma prosperidade virtual conseguida com dinheiro emprestado. É o principal responsável pelo buraco onde Portugal se encontra. Não fez acto de contrição e dá indícios de poder voltar ao mesmo. Não é fiável.

Os partidos de direita (PSD e CDS/PP) são apoiados por uma mistura de pequenos e médios empreendedores que não quer o Estado às costas e por oportunistas manhosos que exploram as imperfeições do Capitalismo sem ética e mal regulamentado. São também apoiados pelos que têm horror ao Socialismo, em qualquer das suas formas, e temem que o poder caia de novo nas mãos do "povo unido", e escolhem o mal menor. Em coligação governamental estão a atacar os sintomas da crise económica da forma mais fácil, descurando as causas, sem fazer a reforma do Estado, o que garante uma nova crise num futuro mais ou menos próximo. Não são fiáveis.

O PS, o PSD e o CDS/PP são colectivamente responsáveis pela relação incestuosa entre a política e a economia, que é responsável pela corrupção, que é uma das causas da actual situação de Portugal. Não se vislumbra qualquer vento de mudança. Não são de fiar. Com estes partidos Portugal não sai da cepa torta. É essencial que esta situação dê um salto qualitativo. Evolução e não revolução.

É urgente que surja um Partido Republicano, pragmático, para defender a res publica, tanto da Esquerda utópica e da invejosa, como da Direita ultra-liberal e da manhosa. É fundamental não cair da tentação de apoiar auto-proclamados messias, ou grupos de Salvação Nacional, de espírito "Abrilista", como o Livre, o Podemos e o Syriza, todos infectados do vírus esquerdista/populista. Estes indivíduos ou movimentos poderão até ter no início boas intenções, mas todos sabemos que lugar está já cheio de boas intenções.

A solução pragmática talvez passe por reciclar o que que já existe - uma fusão qualificada entre o PS e o PSD. Os membros mais conservadores e menos comprometidos do PS (que de Socialista, para além do nome, tem muito pouco), e os membros menos liberais e menos comprometidos do PSD (que de Social-Democrata já não tem nada) poderiam formar a base de um partido politico para ocupar o Centro. Este partido poderia apresentar aos Portugueses um programa de governo realístico e pragmático, sem estar acorrentado a ideologias, fazer finalmente a tal reforma do Estado, encorajando e regulamentando a actividade económica privada sem a asfixiar, promovendo a livre concorrência, investigando eficientemente as actividades ilegais e fazendo cumprir a lei com celeridade e rigor.

Um primeiro passo, essencial, para eliminar a partidocracia perniciosa que está na raiz de tudo, será rever a Constituição para permitir a eleição uninominal dos deputados para que estes respondam directamente aos cidadãos que os elegeram e não aos partidos que os nomearam.

Um partido com estas características acabaria por se impor num Parlamento realmente eleito pelo povo, forçando o PS, o PSD e o CDS/PP a evoluir sob pena de se tornarem irrelevantes.

Se os Portugueses quiserem, poderiam finalmente ter um país viável para entregar às próximas gerações.

Texto assinado por um "Anónimo"

7 comentários:

Anónimo disse...

Álvaro de Campos, a moderna crítica da Modernidade

O poema Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa, de Álvaro de Campos, um dos três mais famosos heterônimos de Fernando Pessoa.

Este poema e' uma crítica à modernidade capitalista periférica, suas implicações à subjetividade bem como aos desdobramentos estéticos.

Álvaro de Campos

Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa

Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
(Exceto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
Não sou parvo nem romancista russo, aplicado,
E romantismo, sim, mas devagar...).
Sinto uma simpatia por essa gente toda,
Sobretudo quando não merece simpatia.
Sim, eu sou também vadio e pedinte,
E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:
E' estar ao lado da escala social,
E' não ser adaptável às normas da vida,
'As normas reais ou sentimentais da vida -
Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
Não ser pobre a valer, operário explorado,
Não ser doente de uma doença incurável,
Não ser sedento da justiça, ou capitão de cavalaria,
Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
Que se fartam de letras porque tem razão para chorar lagrimas,
E se revoltam contra a vida social porque tem razão para isso supor.

Não: tudo menos ter razão!
Tudo menos importar-se com a humanidade!
Tudo menos ceder ao humanitarismo!
De que serve uma sensação se ha uma razão exterior a ela?

Sim, ser vadio e pedinte, como eu sou,
Não é ser vadio e pedinte, o que é corrente:
E' ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio,
E' ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem, e isso é que é ser pedinte.

Tudo o mais é estúpido como um Dostoiewski ou um Gorki.
Tudo o mais é ter fome ou não ter o que vestir.
E, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente
Que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece.

Sou vadio e pedinte a valer, isto é, no sentido translato,
E estou-me rebolando numa grande caridade por mim.

Coitado do Álvaro de Campos!
Tão isolado na vida! Tão deprimido nas sensações!
Coitado dele, enfiado na poltrona da sua melancolia!
Coitado dele, que com lagrimas (autenticas) nos olhos,
Deu hoje, num gesto largo, liberal e moscovita,
Tudo quanto tinha, na algibeira em que tinha olhos tristes por profissão

Coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa!
Coitado dele que tem tanta pena de si mesmo!

E, sim, coitado dele!
Mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam,
Que são pedintes e pedem,
Porque a alma humana é um abismo.

Eu é que sei. Coitado dele!
Que bom poder-me revoltar num comício dentro de minha alma!

Mas até nem parvo sou!
Nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais.
Não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.

Não me queiram converter a convicção: sou lúcido!

Já disse: sou lúcido.
Nada de estéticas com coração: sou lúcido.
Me-rd-a! Sou lúcido.

capitão disse...

Dez réis de esperança

Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos á boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.


Antônio Gedeão

Anónimo disse...

Receita para fazer um herói
Tome-se um homem,
Feito de nada, como nós,
E em tamanho natural.
Embeba-se-lhe a carne,
Lentamente,
Duma certeza aguda, irracional,
Intensa como o ódio ou como a fome.
Depois, perto do fim,
Agite-se um pendão
E toque-se um clarim.

Serve-se morto.

Reinaldo Ferreira

AQUARIUS disse...

Pois bem, o texto original totalmente inepto, trouxe-me a estas excelentes poesias. O universo é mesmo errático e belo ...

Anónimo disse...

Qualificou o texto de "totalmente inepto", o que está no seu direito, mas "esqueceu-se" de dizer porquê, o que me faz pensar que deve ser um poeta lírico de esquerda.

Anónimo disse...

"Poeta lírico de esquerda" como Fernando Pessoa, António Gedeão, está a ver amigo Aquarius.
O conceito está bem conseguido, pois o objetivo do insultador era juntar três ofensas numa designação - poeta (oh desgraçado!), lírico (oh ingénuo!), de esquerda (oh energúmeno!).
Claro que é uma maçada ainda haver esquerda e direita, o que interessava era concentrar tudo ao centro, o local equidistante ... e pragmático ...

Anónimo disse...

juntar três ofensas numa designação - poeta (oh desgraçado!), lírico (oh ingénuo!), de esquerda (oh energúmeno!).

Os comentadores deste blog parecem ser "poetas, líricos de esquerda", e este último parece ainda ter deficiência de auto estima. Sentiu-se ofendido por simpatia! Interpretar a minha qualificação "poeta, lírico de esquerda" como uma ofensa é muito revelador. Paternalista? Admito que sim.

E continuo sem saber por que razão considera o meu texto inepto.

Deficiência de auto estima parece ser epidémico em Portugal. Nada mais fácil do que "ofender" um Português. Em alguns casos basta classifica-lo de "poeta, lírico de esquerda", para que ouça "desgraçado!, ingénuo! e energúmeno!".

BTW, não há nada de errado em ser-se "poeta, lírico, de esquerda", desde que estes não atinjam massa crítica. São sempre preciso alguns para haver diversificação, e para nos entreter, senão a vida era uma chatice. BTW, é bem melhor ser "poeta, lírico, de esquerda", do que ser "invejoso de esquerda". Enquanto os primeiros são inofensivos, os últimos sāo perigosos.