terça-feira, 1 de janeiro de 2013

2013


Leio o livro “Joseph Anton” de Salman Rushdie, que relata o modo como viveu a ameaça que durante nove anos pairou sobre ele, quando, em 1989, o aiatola Khomeini declarou uma Fatwa, condenando-o à morte por ter escrito o livro “Versículos Satânicos”.

Na página 251:
Todos os heróis da antiguidade grega, Ulisses, Jasão e Eneias, haviam sido, mais tarde ou mais cedo, obrigados a manobrar os seus navios entre os dois monstros marinhos Cila e Caríbdes cientes de que cair nas garras de um ou outro os conduziria à destruição total. Disse a si próprio firmemente que, escrevesse o que escrevesse, precisava de passar entre os seus Cila e Caríbdes pessoais, os monstros do medo e da vingança. Se escrevesse coisas tímidas, amedrontadas, ou coisas iradas, vingativas, a sua arte seria deturpada para além de qualquer esperança de redenção. Tornar-se-ia uma criatura de fatwa e mais nada. Para sobreviver precisava de rejeitar a raiva e o terror, por mais difícil que essa rejeição fosse, e tentar continuar a ser o escritor que sempre procurara ser, continuar na via que definira como a sua. Fazer isso seria o sucesso. Fazer outra coisa seria um horrível falhanço. Isso sabia ele.
Esqueceu-se de que havia uma terceira armadilha: a de namorar a concordância, de querer, na sua fraqueza, ser amado. Estava demasiado cego para ver que se precipitava de cabeça nesse fosso; e foi essa armadilha que o engodou e quase o destruiu para sempre.


Mitologia: Cila e Caríbdes são escolhos perigosos localizados no Estreito de Messina, que separa a Itália da Sicília, ou seja, dois grandes perigos para a navegação, muito próximos um do outro. Cila é um rochedo e Caríbdis é um redemoinho, um sorvedouro.
Na mitologia grega Cila era um monstro marinho. Tinha sido uma bela ninfa que a feiticeira Circe, por ciúmes, transformara num monstro, enraizado numa rocha, que odiava e destruía tudo o que se aproximasse. Do seu corpo cresciam cabeças de serpentes e de cães ferozes.
Caríbdis, filha da Terra e de Poseidon, fora também uma ninfa. Por ser muito cruel, Zeus fulminou-a com um raio, transformou-a num monstro e lançou-a para o fundo do mar, onde três vezes por dia suga e regurgita a água do estreito, devorando tudo o que consegue.

Ultrapassar Cila e Caríbdis simboliza coragem e capacidade para resolver qualquer grande problema.


Na Odisseia, de Homero, Ulisses consegue retornar a Ítaca depois de passar Cila e Caríbdis.


Rejeitar a raiva e o terror, e tentar continuar a via que se definiu como sua, sem namorar a concordância, de querer ser amado.

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