terça-feira, 2 de setembro de 2008

Eu e o Serviço Nacional de Saúde


Não tenho mais qualidade que aquela que o meu limitado raio de acção me permite: dez anos de formação num Hospital Central, 24 num Hospital Distrital e 30 de prática de clínica privada.

Assisti à democratização dos cuidados de saúde (universais e gratuitos), ao apetrechamento quantitativo e qualitativo dos Hospitais periféricos, ao crescimento exponencial dos gastos em saúde e à adaptação de toda esta estrutura às novas exigências de gestão.

Vivi por dentro os dramas de não haver soluções para casos onde elas deviam estar presentes e assisti à disponibilização de cuidados dispendiosos a quem, pela minha lógica, os não devia ter recebido.
Testemunhei erros, desleixo, injustiças e oportunismos, mas vi muito mais evolução, vitórias, dedicação e desprendimento em todos os grupos profissionais.

Custa-me agora ouvir críticas que visam o desmantelamento SNS em favor de privados que se posicionam para esta grande área de negócio. Nos USA é já a 1ª.

É que eu também assisti às práticas dos privados. Aos seus erros e à necessidade que os obriga a um mínimo de ganho para sobreviver. A diagnosticar doença onde ela nunca esteve ou a empolar o mal, para justificar gestos rentáveis. E assisti à fraude, por se saber que a fiscalização era fraca ou ineficaz e testemunhei incompetência superior à do SNS.

Por isso, quando me dizem que os Privados vêm fazer melhor, inquieto-me, porque não é obrigatório que os Bancos forneçam melhor gestão e, se o Estado é mau Gestor, ele é ainda pior Fiscal.

Como me disse um cirurgião amigo, já falecido:
-“Sabes como se classificam as apendicites crónicas? “
-“Em remuneradas e não remuneradas.
-“As remuneradas, são para operar. As outras, tratam-se com gelo e anti-inflamatórios.”

2 comentários:

Anónimo disse...

A quem desejaria bom tempo o vendedor de guarda-chuvas? Lucrar com a doença subverte por vezes os actos médicos.

capitão disse...

Ao contrário da alimentação e de gastos com bens materiais, é possível gastar sempre mais em saúde, e a população tende a fazê-lo.
Vai-se ao médico "para ver se está tudo bem" na esperança de um sim e volta-se de novo meses depois para ouvir o mesmo.
Penso que receber por um acto necessário é do mais justo que há. Inventar ou empolar doença para ter proventos é uma indignidade inqualificável!