quarta-feira, 26 de maio de 2010

Auditar o software hospitalar - SAPE


A solução é auditar e acabar com as modernices que só trouxeram encargos e perdas de tempo.

A significativa melhoria da qualidade dos enfermeiros, consequência da melhoria na escolaridade e do empenho de muitos que apostaram em dignificar a profissão com as suas vidas, é prejudicada pelo software que foi implementado para registo informático do seu Diário de Enfermagem (SAPE).
Este SAPE (Sistema de Apoio à Prática de Enfermagem) que foi concebido pelo Enfº Abel Paiva (Escola Superior de Enfermagem do Hosp. S. João - Porto), para a sua tese de Doutoramento e desenvolvido pelo Departamento de Informática do IGIF, sob o patrocínio da Dra. Cármen Pignatelli, não teve certificação dos órgãos representativos de enfermeiros ou médicos.
É uma "modernice" que os afasta dos doentes e dos médicos, com quem deviam partilhar informação.

Apoia-se na CIPE (Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem) que usa uma linguagem básica para, provavelmente, atingir países menos exigentes na qualidade dos seus enfermeiros.

O que a princípio era uma “vaidade” (registar informaticamente), transformou-se num pesadelo para quem se preocupa com a eficiência.
Os enfermeiros passaram a obrigar-se a preencher aquelas páginas de “fenómenos de enfermagem” que , por terem acesso difícil, informação dispersa e “formato rebuscado”, raramente são consultadas pelos médicos, o que diminui a eficiência do sistema.

A informação relativa ao doente internado deve ser concisa e facilmente partilhada pelos profissionais envolvidos, mas, enquanto os médicos disponibilizam a sua informação em papel na História e no Diário Clínico, os enfermeiros registam-na nas "suas" bases de dados, e nem os sinais vitais lhes disponibilizam em papel.
No sistema actual, para um médico saber se um seu doente teve febre, tem de dar os seguintes passos: 1- aceder a um computador disponível, 2- abrir o programa (SAM), 3- identificar-se com password, 4- escolher a área - Internamento, 5- identificar o serviço onde o doente está, 6- procurar o doente em causa, 7- abrir o item “Vigilâncias”, 8- procurar em temperatura.
Mas quem diz temperatura diz qualquer outro facto relevante que suspeite ter sido registado por um enfermeiro. É um desespero!

Eram muito mais eficientes as Notas de Enfermagem em papel, que estas montanhas de bits que diariamente enfiam nos PCs, atafulhando-os e lentificando todos os outros procedimentos importantes.

Atrevo-me a pensar que o CIPE/SAPE, é obra de quem tem os enfermeiros em fraca consideração, e que os toma por incapazes de descrever por palavras próprias os acontecimentos relevantes do seu turno, sem a muleta de grelhas que obrigam a respostas tipo “muito, pouco ou nada” para uma longa série de itens.

É possível identificar os problemas (diagnósticos de enfermagem), e fazer o registo da sua evolução em papel, e só usar o registo informático para uma eventual “Nota de Alta de Enfermagem”, se ela se tornar necessária.

Para cúmulo, as direcções dos enfermeiros para “apresentar serviço”, aumentaram ainda mais a carga de registos, tornando obrigatório o preenchimento de mais uns itens que definem o grau de dependência do doente “A TODOS OS DOENTES” e durante tempo ilimitado. Se é para estatística não se justifica (bastava uma amostra significativa), se é para gestão de recursos “na hora” … eu não acredito nessa capacidade.

Mas há sempre os deslumbrados que se preocupam mais com a forma que com a função e que julgam perder estatuto se voltarem ao papel, e outros tantos que assim se defendem da incapacidade de escrever um português “mínimo”. Mas esses são a minoria atrevida que tenta abafar quem sabe que registar não é o mesmo de executar com qualidade, e que é esta que urge promover.

Quem lucra no meio disto são as empresas de Informática que fizeram do SNS área de negócio, ao influenciarem os "políticos" das vantagens da "informatização", sem que se auditassem os programas antes da sua generalização.
Agora que se fala em contenção de gastos, é bom que estas patetices tenham fim, e se utilize a Informática para aquilo onde ela é realmente útil: Registo dos doentes, Gestão dos Meios Auxiliares de Diagnóstico, Farmácia e Notas de Alta e se acabe de vez com os "Diários informatizados".

8 comentários:

Anónimo disse...

Sigo atentamente o blog e já tive vontade de participar comentando os post´s, mas acabava sempre por deixar passar.
No entanto, não posso deixar de comentar o assunto que aborda.
Concordo consigo quando refere que o SAPE não tem um acesso fácil, que nos "rouba" um tempo significativo dos cuidados directos ao doente.
Sou do tempo, dos registos manuais, e actualmente gasta-se mais tempo nos registos informáticos.
No entanto, penso que é importante existir um programa informático onde possamos efectuar os registos.
Agora, deveria ser menos "rebuscado" tanto para quem o utiliza como para outros profissionais que queiram consultar o mesmo.
E o diario clíncio preenchido pelo Sr. Dr.? Percebe-se o que lá está escrito? Raramente... Se o nosso programa é rebuscado, como classificar a caligrafia da maioria dos médicos?
Se calhar responde que não precisamos de consultar o que o médico escreve...mas penso que aí também está o que caracteriza o trabalho em equipa.
E as prescrições terapeuticas que muitas vezes não saõ imprimidas e colocadas no processo pós a sua actualização?
Devemos imprimir o registo dos sinais vitais, mas o medico não precisa de imprimir a prescrição da medicação?
Quantas vezes temos que aceder ao sistema para ver a prescrição da medicação actualizada? Também não é uma tarefa onde é dispendido tempo que poderia ser utiizado nos cuidados directos ao doente?
Deixo aqui estas questões no ar para reflectirmos... Se calhar é necessário de parte a parte uma maior colaboração para agilizar estas situações.

capitão disse...

Parece que estamos de acordo que o SAPE não tem acesso fácil e que "rouba" tempo significativo dos cuidados directos ao doente.
Percebo que é defensor/a do registo informático, alegando (principalmente) que este é legível.
Eu não sou contra a Informática na Saúde. O que afirmei é que os registos em papel só devem ser substituídos por um programa informático que 1 - não prejudique os doentes, 2 –não encareça significativamente os cuidados prestados pelos enfermeiros , 3 – não afaste os outros profissionais dos seus registos, pois a “Missão do Hospital” está “centrada no utente” e na “eficaz e eficiente gestão de recursos”.
Quanto aos médicos o assunto é outro.
Há registos onde é patente uma caligrafia claramente impeditiva de leitura. Muitas versões são possíveis, que vão da intencional, ao fruto de um ensino que se não preocupou em desenvolver essa técnica de comunicação entre humanos.
A “letra de médico” é, muitas vezes, o escudo da sua incompetência, permitindo-lhe dar o dito por não dito, quando as coisas correm mal, pelo que considero inaceitáveis textos ilegíveis ou dúbios.
Alguns acham-se “políticos” e escrevem sem dizer nada e sem se comprometerem com qualquer raciocínio, de modo a poderem fazer os “prognósticos no fim do jogo”. Fazem-no porque ... os deixam!
Concordo que é inaceitável a não impressão da folha de terapêutica!

Anónimo disse...

Concordo plenamente com o que diz no seu post, sou enfermeiro e sempre defendi o que agora escreve. Agora, tambem acho, que existe uma falha grande em relação ao que os médicos escrevem no registo informático (SAME)pois os enfermeiros não têm acesso. São profissõe que se complementam pelo que a informação deve ser partilhada a 100%. Para isso já existe o segredo profissional.

AQUARIUS disse...

Ora aqui está uma boa conversa! E era importante que aquilo que os interessados pensam sobre esta questão fosse levado em linha de conta e que não ficássemos eternamente reféns de decisões erradas ne claramente prejudiciais a todos. Já agora mais um ponto: e a enormidade de "registos informáticos" que são impressos repetidamente "por razões de segurança" e que constituem um verdadeiro crime ambiental? Pode ser que a "crise" venha ajudar a resolver muitas disfunções.

capitão disse...

Caro Anónimo das 17:12h

São muito poucos os médicos que escrevem em registo informático (SAM) sem disponibilizar em papel essa informação.
Durante um internamento, a informação deve estar disponível a toda a equipa de profissionais chamados a colaborar na solução.

capitão disse...

Ainda me lembro de quando se falou na Comunicação Social em que ia acabar com o papel no SU. Nunca ninguém mediu, passados estes anos, se houve redução ou aumento no seu consumo, mesmo sendo este o local onde a intensidade do programa informático é maior.
No Internamento o gasto de papel parece-me maior. Cada vez que se junta “uma vírgula” na folha de terapêutica, imprime-se uma folha, e há serviços que exigem as Notas de Enfermagem (SAPE) impressas.
Em Portugal, só se fazem contas quando se quer “chatear” alguém. As contas não são feitas em parceria com os profissionais, são atiradas para cima deles como uma culpa.
É que os "senhores de lá de cima" sentem-se técnica e moralmente superiores.

Anónimo disse...

Eu referia-me ao registos nos centros de saúde...Os médicos registam no SAM, mas os enfermeiros não têm acesso.

Assim como, por exemplo, os médicos dos centros de saúde, através do SAM, conseguem ter acesso aos registos médicos e de enfermagem dos seus doentes internados no cham

Já os enfermeiros, pelo SAPE, não conseguem ter esse acesso, nem aos registos médicos e muito menos aos de enfermagem...

capitão disse...

Caro anónimo:
Há uma Lei de Protecção de Dados, que tenta proteger os nossos dados pessoais e a saúde é um deles. O acesso a esses dados devia só ser disponibilizado à equipe de saúde DURANTE o Internamento ou na Consulta Hospitalar ou do Centro de Saúde, e mediante autorização prévia do doente.