domingo, 17 de maio de 2009

"O Rastro do Jaguar",












de Murilo de Carvalho.

Romance que venceu o Prémio Leya em 2008, ficciona um índio Guarani europeizado (levado na infância para França) que, nos finais do século XIX, regressa ao Brasil para reconhecer sua terra e o seu povo.
O narrador é um jornalista seu amigo, nascido em Portugal e também criado em França. Acompanha-o, com a justificação de, como correspondente de guerra, fazer a cobertura da Guerra do Paraguai, que opôs o Paraguai ao Brasil, Uruguai e Argentina entre 1864 a 1870.

Nesta Guerra: o Brasil perdeu um terço dos 150 mil homens que enviou. A Argentina perdeu 18 mil dos quase 30 mil envolvidos e o Uruguai dos 5600 soldados que participaram cerca de 3100 morreram.
O Paraguai, perdeu cerca de 300 mil pessoas, entre civis e militares, mortos no decorrer dos combates e das epidemias que se alastraram durante a guerra e da fome. Calcula-se que a sua população à época não chegaria ao meio milhão de habitantes.
A derrota marcou uma reviravolta decisiva na história do Paraguai, que se tornou um dos países mais atrasados da América do Sul.

O que me ficou do livro, foi o modo como os interesses dos colonizadores envolveram as nações indígenas, principalmente a dos Guarani.
Do texto, sublinhei:
… Assim, o aprendizado de Pierre consistia, agora, na compreensão da linguagem dos profetas – ele, o profeta-guerreiro, um condutor. As lições de Ñezú tornaram-se, então, proféticas: ensinamentos que ia buscar às prédicas de outros tantos profetas que viveram noutros tempos e cuja sabedoria se tinha consolidado ao longo dos anos, transmitida de profeta a profeta, nas noites de iniciação. Eram todos homens da palavra; não acreditavam no escrito, não consideravam o escrito como reflexo da palavra – havia que interpretá-lo. E se cada um interpretasse o texto a seu modo, o tempo iria transformá-lo, trocar-lhe o sentido, mudar as imagens, até que um dia não estaria mais significando a palavra original. Portanto, cada profeta herdaria a essência dos pensamentos – a Boa Palavra – e a transmitiria com suas falas ao futuro. É claro que cada profeta buscaria, nos acontecimentos da sua vida, os factos que teria de interpretar à luz da sabedoria antiga; havia as regras, havia o caminho do pensamento. O profeta saberia compreender as transformações do mundo e assim poderia orientar o seu povo, os guerreiros. A sabedoria dos profetas, estava também a ser observada pelos velhos, guardiães – eles também – da Boa Palavra. E eles, os velhos, saberiam sempre se o profeta estava seguindo o trilho da verdade, o trilho dos antigos: não há futuro que não seja o reflexo do passado.

A árvore inclina-se sobre o lago e o seu reflexo não é a árvore: é como as palavras que reproduzem o pensamento.

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