Alexandre Magno está prestes a tomar mais uma vez uma decisão de consequências incalculáveis. Contaram-lhe que existe uma mulher que consegue prever o futuro com rigor. Manda chamá-la para lhe ensinar a sua arte. Ela diz-lhe que é necessário acender uma grande fogueira e ler o futuro no fumo que dela se desprende, como num livro. Contudo, ela alerta o conquistador. Enquanto escrutar o fumo, não deverá em caso algum pensar no olho esquerdo de um crocodilo. Quando muito no olho direito, mas nunca no esquerdo. Então, Alexandre renuncia a conhecer o futuro. Porquê? Porque quando nos dizem para evitar pensar numa coisa, não conseguimos pensar senão nessa coisa. A interdição gera obrigação. É mesmo impossível não pensar nisso, nesse olho esquerdo do crocodilo. O olho da fera apossou-se da nossa memória, do nosso espírito.
A mnemotécnica é a arte de associar representações espaciais a objectos ou conceitos de modo a torná-los solidários. Foi por ter associado o olho esquerdo do crocodilo ao fumo que tinha que escrutar, que Alexandre Magno deixou de agir livremente.
in "A Obsessão do Fogo" de Umberto Eco e Jean-Claude Carrière
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