sábado, 12 de maio de 2012

Kapo

Há personagens da ficção que vamos integrando no nosso imaginário e que nos servem de referência. Os heróis de infância geralmente persistem na idade adulta, e alguns protótipos de “maus” também.

Quase sempre se acorre ao cinema para procurar aqueles com que mais nos identificamos: os Robin dos Bosques, o Super-Homem, o Lonely Ranger, ou mais recentemente o BatMan.

São eles que nos trazem a felicidade de ver o Mal vencido pelo Bem.

Mas quando pergunto por personagens “execráveis”, sinto haver maior dificuldade na sua identificação, como se a ficção os não tivesse criado. Depois de algum pensar lá saem a custo o Judas, o Hitler, o Saddam Houssein, o Kadaffi, e só depois o Darth Vader, da Guerra das Estrelas e o Joker do Batman, mas sem grande convicção.

Na minha família os execráveis têm outros nomes.
O meu avô odiava Joseph Fouchet, que Stephan Zweig tão bem descreveu no livro com o seu nome. O traidor perfeito, o protótipo do individuo desprovido de qualquer ideologia, cujo único bem-estar que lhe importa é o seu. Figura real da Revolução Francesa, que trabalhou na segurança da sombra, adaptando-se rapidamente às mudanças da História, que apoiou todas as facções vitoriosas, e cortou as cabeças dos seus anteriores amigos.
O meu pai odeia o Iago, do Otelo, de Shakespeare. Também ele um traidor, que lutou ao lado de Otelo, que o tornou seu conselheiro de confiança, e que o trai, enquanto aparenta dedicação.

E eu, que também abomino aqueles dois, depois de algum pensar, elejo o Kapo dos Campos de concentração Nazi.

O kapo era também um prisioneiro. Alguém sem escrúpulos, que surge para ocupar um lugar “a mando”, a troco de uns pequenos favores e de fidelidade. Alguém que assume uma liderança sem projecto, que para melhorar a sua condição, aceita agredir os seus antigos companheiros.

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