A portinha de entrada deu lugar a um grande vidro e surgiram móveis e objectos até então só identificáveis nos Cabeleireiros de Senhoras.
Por comodidade mantive-me fiel.
No dia do corte, como de hábito, pedi ao empregado “remasterizado”: “deixe pró comprido, mas não muito!”.
Às primeiras penteadelas (das novas) magoou-me. Ao ver o meu desagrado retrucou, com ar profissional, que a culpa era "do meu cabelo ser fraco". De seguida, sem pedir licença, arrancou-me um cabelo dos gordos e desapareceu no fundo do Salão.
Regressou sorridente com uma solução para o problema, depois de "ter observado o cabelo ao microscópio": Um champô para usar uma vez por semana, um tratamento de aplicação diária e não lavar a cabeça nos intervalos.
Talvez tenha declinado esta opção sem grande convicção pois, antes de reiniciar o corte, propôs-me como alternativa tonificante, uma massagem no couro cabeludo.
Quem não sabe o que é ser homem aos 19 anos que me atire a pedra, mas depois de ter visto dezenas de filmes de cowboys onde o artista leva a tal massagem enquanto fuma a cigarrilha e espreita pelo vidro o pó da rua, não resisti à experiência "in vivo" e meio a medo retorqui: Está bem!
Dois minutos depois estava com o cabelo envolvido numa massa que o homem puxava para cima, dando-me um ar de vassoura. De seguida levou-me para junto do vidro da frente onde uma campânula que eu mal vira na entrada me aguardava, informando-me de que teria de ficar ali 10 minutos.
Dez minutos/horas atrás do vidro do Salão, com o Café que então frequentava à frente e a rua logo ali. Pensei em morrer de vergonha e com voz sumida, pedi o JN por não me lembrar de nada maior que me escondesse. Mantive-me estático, braços elevados e mãos à altura das orelhas, a avaliar cada passo de quem passava, a contar os segundos em decrescendo e a vencer os músculos do pescoço que me tentavam trair.
Por fim tudo acabou e saí dali com o cabelo macio e arrumadinho no alto da cabeça. Mas não era assim que eu era e, meia hora depois estava dentro do banho a desfazer todo aquele bem que não era meu.
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