Terra de grandes barrigas,
Onde há tanta gente gorda,
Às sopas chamam açorda
E à açorda chamam-lhe migas;
Às razões chamam cantigas,
Milhaduras são gorjetas,
Maleitas dizem malêtas,
Em vez de encostas, chapadas,
Em vez de açoites, nalgadas
E as bolotas são boletas.
Terra mole é atasquêro,
Ir embora é abalar,
Deitar fora é aventar,
Fita de couro é apêro;
Vaso com planta é cravêro,
Carpinteiro é abegão,
A choupana é cabanão
E às hortas chamam hortejos
Os cestos são cabanejos
E ao trigo chama-se pão.
No resto de Portugal
Ninguém diz palavras tais;
As terras baixas são vais
Monte de feno é frascal
Vestir bem, parece mal
À aveia chamam cevada
Ao bofetão orelhada
Alcofa grande é gorpelha
Égua lazã é vermelha
Poldra Isabel é melada.
Quando um tipo está doente
Logo dizem que está morto.
A todo o vau chamam porto
Chamam gajo a toda a gente
Vestir safões é corrente
Por acaso é por adrego,
Ao saco chamam talego
E, até nas classes mais ricas
Ser janota é ser maricas
Ser beirão é ser galego.
Os porcos medem-se às varas,
O peixe vende-se aos quilos
E a gente pasma de ouvi-los
Usar maneiras tão raras;
Chamam relvas às searas
Às vezes, não sei porquê
E tratam por vomecê
Pessoas a quem venero;
“não quero” dizem “na quero”
“eu não sei” dizem “ê nã sê”!
Autor: J. De Vasconcelos e Sá
Assim já cantei um dia
Pois no Alentejo nasci
Ali amei e sofri
E ao meu povo eu entendia
Pastel de grão é azevia
Massa frita é brinhol
Piolho cata-se ao sol
À lenha chamam molheta
O zangado diz punheta
Sapateiro usa serol
A frigideira é sartém
Uma tigela plangana
Mulher de graça é magana
Falar mal é coisa vã
Cama de molas divã
E quem dança está balhando
Chover pouco é muginando
A gasosa é um pirulito
Qualquer cão é um canito
Chorar baixo é chomingar
Ao leite chamam-lhe lête
Um bacio é um penico
Um desmaio é um fanico
Um canteiro é alegrete
O soutien é um colete
Do pão duro faz-se migas
São saias quaisquer cantigas
Grão cozido é gravançada
Qualquer pessoa é coitada
E as amantes são amigas
Emprestar é repassar
Mentiroso é trapacêro
Amolador é um gaitêro
Ir à monda é escardar
Chatear é amolar
Do pobre diz-se infeliz
A igreja é uma matriz
Cafeteira é choclatêra
Coisa torta é pernêra
E é o povo que assim diz
Um barril é um porrão
E a garagem é cochêra
Chouriço preto é cacholêra
Preguiçoso é lazêrão
Homem do campo é ganhão
Chama-se fosso a um vale
Almofariz é um gral
Sopas frias é gaspacho
Viver bem é ter um tacho
E assim fala Portugal
Autora: Rosa Dias (poeta popular de Campo Maior).
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