-“Sr. Alfredo! Você foi operado a alguma coisa? O que foi essa cicatriz aí no antebraço esquerdo?”, pergunto aos 111Kg de homem que estão na minha frente, na tentativa de esclarecer aquela anemia, que resiste aos exames auxiliares de diagnóstico.
- São coisas da guerra Sr. Dr.! Coisas do tempo em que a gente não sabe o que faz. Sabe, eu agora até penso que o cozinheiro nos punha droga na comida, para a gente correr atrás das balas. Estávamos todos loucos!”
E sem pensar o porquê da hesitação, insisti na curiosidade: –“Foi uma bala perdida?”
-“ Não. Dr.! Foi uma catanada que me fez perder a cabeça!”, e a custo, como a medir a minha capacidade, desbobina a história, com a franqueza de quem ultrapassou os remorsos para poder viver consigo próprio. –“Eu era fuzileiro em Angola. Tínhamos o acampamento junto à fronteira com o Zaire, paredes-meias com o dos pára-quedistas, com quem fazíamos frequentes operações “parafuso” – eles por cima e nós por baixo, varríamos tudo o que mexesse. Era assim a guerra! … Nesse dia, eu vinha de uma operação no mato. Encontrei um cabo à entrada do acampamento, disse-lhe que estava cheio de fome, e ele apontou-me para a cozinha para eu ir lá comer qualquer coisa. Vai daí, entrei naquele corredor onde estavam as panelas, e dei com umas postas de bacalhau num panelão a demolhar. Deitei a mão a uma, e o cozinheiro preto que lá estava, virou-se para mim com maus modos, a dizer para eu a pousar, que as postas estavam contadas! ... Está a ver, Dr.! ... Eu tinha autorização, ... e o gajo armado em fino, a dizer que eu não podia! Virei-lhe as costas e, enquanto a estava a espremer para lhe tirar a água, o preto vem de lá detrás com a catana e zás, no braço! … Oh, Dr.! ... Eu trazia a G3 a tiracolo, ainda carregada, com a coronha para cima. Foi só virá-la para ele, à altura da cintura, e disparar. Dei-lhe sete tiros! Caiu logo ali!”
-“E você não foi punido?”, pergunto, a pensar no preço de uma posta de bacalhau.
-“Não Dr.! O capitão quando soube, veio ter comigo para me descansar! ... Então o gajo veio à catanada!? ... Fizeste bem!”
- “Bem! Sr. Alfredo! Deixemos isso. Você vai ter que fazer mais exames ainda esta semana”.
- São coisas da guerra Sr. Dr.! Coisas do tempo em que a gente não sabe o que faz. Sabe, eu agora até penso que o cozinheiro nos punha droga na comida, para a gente correr atrás das balas. Estávamos todos loucos!”
E sem pensar o porquê da hesitação, insisti na curiosidade: –“Foi uma bala perdida?”
-“ Não. Dr.! Foi uma catanada que me fez perder a cabeça!”, e a custo, como a medir a minha capacidade, desbobina a história, com a franqueza de quem ultrapassou os remorsos para poder viver consigo próprio. –“Eu era fuzileiro em Angola. Tínhamos o acampamento junto à fronteira com o Zaire, paredes-meias com o dos pára-quedistas, com quem fazíamos frequentes operações “parafuso” – eles por cima e nós por baixo, varríamos tudo o que mexesse. Era assim a guerra! … Nesse dia, eu vinha de uma operação no mato. Encontrei um cabo à entrada do acampamento, disse-lhe que estava cheio de fome, e ele apontou-me para a cozinha para eu ir lá comer qualquer coisa. Vai daí, entrei naquele corredor onde estavam as panelas, e dei com umas postas de bacalhau num panelão a demolhar. Deitei a mão a uma, e o cozinheiro preto que lá estava, virou-se para mim com maus modos, a dizer para eu a pousar, que as postas estavam contadas! ... Está a ver, Dr.! ... Eu tinha autorização, ... e o gajo armado em fino, a dizer que eu não podia! Virei-lhe as costas e, enquanto a estava a espremer para lhe tirar a água, o preto vem de lá detrás com a catana e zás, no braço! … Oh, Dr.! ... Eu trazia a G3 a tiracolo, ainda carregada, com a coronha para cima. Foi só virá-la para ele, à altura da cintura, e disparar. Dei-lhe sete tiros! Caiu logo ali!”
-“E você não foi punido?”, pergunto, a pensar no preço de uma posta de bacalhau.
-“Não Dr.! O capitão quando soube, veio ter comigo para me descansar! ... Então o gajo veio à catanada!? ... Fizeste bem!”
- “Bem! Sr. Alfredo! Deixemos isso. Você vai ter que fazer mais exames ainda esta semana”.
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