Ainda me lembro dos teus 17 anos esmagados contra mim no corredor da enfermaria. Qualquer um falaria de assédio, pois só eu ouvia o que me dizias desesperada.
Tinhas então uma recidiva da tua Doença de Hodgkin e a memória do que tinhas passado nos ciclos do tratamento anterior, com náuseas e vómitos de uma intensidade tal, que agora os iniciavas dias antes da sua administração.
Outros tempos, em que os anti-eméticos eram pouco potentes e se exigia aos doentes passarem por aquele crivo, na esperança de uma cura.
Eras linda, decidida e capaz de mover montanhas mas, naquelas alturas, vacilavas entre o medo da morte e o medo do tratamento.
Tinhas então uma recidiva da tua Doença de Hodgkin e a memória do que tinhas passado nos ciclos do tratamento anterior, com náuseas e vómitos de uma intensidade tal, que agora os iniciavas dias antes da sua administração.
Outros tempos, em que os anti-eméticos eram pouco potentes e se exigia aos doentes passarem por aquele crivo, na esperança de uma cura.
Eras linda, decidida e capaz de mover montanhas mas, naquelas alturas, vacilavas entre o medo da morte e o medo do tratamento.
-“Alice Rosa! Hoje fazes tratamento!”, dizia-te depois de ver as análises. E, de imediato, o pânico dos efeitos laterais daquela Mustarda Nitrogenada (gás de guerra na 1ª Guerra Mundial e que agora te era injectado), avassalavam a tua cabeça.
-“Não! Hoje não! Que eu não estou preparada! Eu venho amanhã, e faço o tratamento. Mas hoje não! Eu prometo que amanhã me porto bem, mas hoje não!”, imploravas. E, perante a minha negativa, empurravas-me e agarravas-te como um náufrago, na expectativa de um acordo, a que eu me forçava a negar, por saber que os resultados dependiam também do cumprimento das datas.
-“Não Alice! Tem de ser hoje!”, respondia-te a contragosto, enquanto me tentava afastar para compor o quadro.
-“Hoje não!”, e voltavas ao ataque, inventando uma qualquer razão que na hora te vinha à mente, enquanto a tua mãe, perplexa e impotente, se deixava ficar à espera do desfecho daquele combate, onde eu esgrimia promessas de mais cuidados no controle sintomático.
Eram uns vinte minutos dramáticos que se repetiam a cada ciclo de quimioterapia, que me deixavam em ponto de lágrimas a ver-te chorar impotente de revolta.
Isto deve-se ter passado em 1982. Entraste em remissão completa e não tiveste mais recidivas da doença. Anos depois fui ao teu casamento dar-te um beijo enquanto fazia votos para que a quimioterapia não te tivesse esterilizado.
-“Não! Hoje não! Que eu não estou preparada! Eu venho amanhã, e faço o tratamento. Mas hoje não! Eu prometo que amanhã me porto bem, mas hoje não!”, imploravas. E, perante a minha negativa, empurravas-me e agarravas-te como um náufrago, na expectativa de um acordo, a que eu me forçava a negar, por saber que os resultados dependiam também do cumprimento das datas.
-“Não Alice! Tem de ser hoje!”, respondia-te a contragosto, enquanto me tentava afastar para compor o quadro.
-“Hoje não!”, e voltavas ao ataque, inventando uma qualquer razão que na hora te vinha à mente, enquanto a tua mãe, perplexa e impotente, se deixava ficar à espera do desfecho daquele combate, onde eu esgrimia promessas de mais cuidados no controle sintomático.
Eram uns vinte minutos dramáticos que se repetiam a cada ciclo de quimioterapia, que me deixavam em ponto de lágrimas a ver-te chorar impotente de revolta.
Isto deve-se ter passado em 1982. Entraste em remissão completa e não tiveste mais recidivas da doença. Anos depois fui ao teu casamento dar-te um beijo enquanto fazia votos para que a quimioterapia não te tivesse esterilizado.
Pensava-te agora longe de quem por força da vida te abandonou, mas o telefone trouxe-te de novo até mim.
Estavas feliz e tinhas um filho!
1 comentário:
Para alem, de um bom profissional de saude,que eu atesto, pelo menos na parte que me toca, esta- se a sair um bom contador de histórias... bonitas, por sinal!
AC
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